Harry e Meghan: repitam sete vezes NÃO

Aqui ficam sete NÃOS que condicionam a vida de Meghan e Harry. Preferíamos que não fosse assim. Mas é com isto que eles têm de contar. E nós também.

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15 de março de 2021 às 17:31 Helena Matos

Esta NÃO foi uma entrevista única. Esta é SIM a primeira de uma longa série de entrevistas. A não ser que algo de muito inesperado aconteça, Harry e Meghan vão protagonizar várias outras entrevistas, cada uma delas com declarações mais detalhadas sobre a família real. Porquê? Porque Harry e Meghan não têm muito mais para dizer. Ou mais precisamente eles acham que sim e querem falar sobre saúde mental, ecologia e o clima. Mas não só há quem o faça muito melhor do que eles como, e esse é que é ponto central da questão, não são esses os assuntos que levam as pessoas a interessar-se por aquilo que eles dizem.

Ou falam da família real, dizendo bem ou mal, ou perdem audiências. Harry e Meghan não interessam por si, mas sim pela sua pertença à família real britânica. Sejamos realistas: o que levou milhões de pessoas a seguir a entrevista que os duques de Sussex deram a Oprah não foi o interesse por aquilo que eles pensam sobre o mundo mas sim o que eles poderiam revelar sobre o que se passa nos bastidores da Firma. Podem ser receitas de scones ou acusações de racismo, o que interessa é que mantenham viva aquele tensão do "já contei muito mas ainda tenho o mais interessante para contar".

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Ao abandonarem a família real, e simultaneamente optarem por se manter no meio mediático, Harry e Meghan armaram a si mesmos uma feroz armadilha: tornaram-se absolutamente dependentes de tudo aquilo de que declararam querer libertar-se. Seja da família real, seja do mundo das notícias, seja do julgamento dos outros.

NÃO, as galinhas não são o animal indicado para termos ao lado quando se fazem confidências. Mais a mais quando se estão a usar brincos que valem milhares, se essas confidências versarem um improvável casamento secreto celebrado pelo arcebispo de Cantuária e se se aproveitar a visita à capoeira instalada numa propriedade milionária para defender o regresso ao básico. As declarações de Meghan a Oprah, dentro da capoeira oferecida a Archie, sobre o casamento que ela e Harry teriam celebrado dias antes da cerimónia oficial pareciam um daqueles quebra-cabeças que nos pedem para identificar os erros. Nada batia certo.

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Carlos NÃO esperava isto. E não o merecia, sobretudo não o merecia por parte de Harry. As imagens falam. E neste caso podem escolher-se duas. Uma é óbvia e recente: data de 19 de Maio de 2018 e regista o momento em que Carlos acompanha Meghan até ao altar onde Harry a aguarda. Meghan foi uma das mais belas noivas da família real (muito melhor que a versão suspiro de Diana e a institucional de Kate), a cerimónia foi comovente e o momento em que a noiva avançava firme e sorridente ao lado do futuro sogro impressionou pela ternura cúmplice que emanava dos dois.

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A outra imagem consta no cartão de Natal que o príncipe Carlos enviou no Natal de 1998. (Convém recordar que várias famílias reais e não só têm o hábito de fazer cartões com fotografias suas). Na fotografia que ilustra o cartão que o príncipe de Gales enviou naquele ano vê-se Carlos sentado numa cadeira. Os seus braços envolvem Harry que está sentado ao seu colo. Atrás, encostado na cadeira está William. Os rapazes já perderam a mãe – Diana morrera há ano e meio. Com a idade que têm – William tem 16 e Harry 14 – viram a vida privada (e é mesmo privada de que falamos) dos seus pais ser contada, detalhada, ridicularizada e analisada nos jornais, rádios, televisões. Para agravar tudo isto que já não era pouco, os boatos sobre a possibilidade de o amante de Diana, James Hewitt, ser o pai de Harry não paravam. (Alguém deveria explicar a Meghan que a pergunta que de facto se fez não apenas em privado na família real mas um pouco por todo o mundo, foi sobre o tom de pele muito branca e o cabelo ruivo de Harry que lembravam mais Hewitt que Carlos. É claro que havia ruivos na família de Diana e que o próprio Hewitt desmentiu este boato, mas durante anos ele prosperou.) Talvez por tudo isto Carlos assumiu uma atitude especialmente protectora em relação a este filho que, segundo Diana, ele tinha desejado muito que fosse uma rapariga. 

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A adolescência de Harry revelou um príncipe Carlos sensato e capaz de tomar decisões difíceis: quando Harry tinha 16 anos, Carlos foi confrontado com o facto de o seu filho mais novo consumir drogas regularmente e beber em excesso. Como o próprio Harry explicaria mais tarde, o pai levou-o a procurar ajuda profissional. Mas não só. O staff real foi instruído por Carlos para não ocultar os factos.

Por tudo isto, quando a 19 de Maio de 2018 atravessou parte da igreja do castelo de Windsor ao lado de Meghan, cujo pai por razões várias e nenhuma delas bonita de contar não estava presente nesta cerimónia, Carlos tinha o ar de quem estava satisfeito não apenas com o momento que estava a viver mas também porque Harry parecia ter encontrado a felicidade. Ou seja ele tinha feito um bom trabalho enquanto pai.

Não é portanto difícil de entender que um dos momentos mais duros da entrevista dos duques de Sussex a Oprah aconteceu quando Harry falou sobre o pai e o acusou de não se interessar por ele. Carlos terá ficado particularmente magoado com estas declarações. Os ingleses também não gostaram do que ouviram e as sondagens à popularidade de Harry entretanto feitas mostram-no.

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O problema NÃO foi o vestido da menina das alianças mas sim a cozinheira gorda escocesa. Meghan foi sem dúvida uma das noivas mais elegantes da família real britânica. E enquanto duquesa de Sussex conseguiu dar um ar de sofisticação e naturalidade ao guarda-roupa real. Mas, há sempre um mas nestas histórias de mulheres de uma mesma família sobretudo se forem cunhadas, Kate não se assemelha a nenhuma cozinheira gorda escocesa. A que título vem aqui a cozinheira gorda escocesa pedindo desde já desculpas às cozinheiras, às gordas e às escocesas? Quando Eduardo VIII abdicou porque não conseguia viver sem Wallis Simpson, o seu irmão tornou-se rei e a sua cunhada, Isabel Bowes-Lyon, rainha. Ao lado de Wallis Simpson, a elegantérrima duquesa de Windsor, Isabel Bowes-Lyon, a mãe da atual rainha Isabel, assemelhava-se invariavelmente a uma cozinheira gorda escocesa (as coisas depois mudaram mas isso agora não é para aqui chamado). Ora a sofisticada Meghan encontrou pela frente uma cunhada, Kate, que não só não se deixou ofuscar, como tinha ideias próprias sobre a matéria, como se percebe na célebre discussão sobre os vestidos das meninas das alianças que ambas terão protagonizado. Para mais, havia um pormenor incontornável: Kate é que vai ser a futura rainha. E, por mais que isso irritasse Meghan, protocolarmente falando a estrela é Meghan.

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Se Kate em vez de ser elegante e vestir-se bem se assemelhasse a uma cozinheira gorda escocesa talvez Meghan e Harry ainda estivessem em Frogmore House, a casa onde os ingleses acreditaram que os Sussex iam ser felizes e que, valha a verdade, era incomensuravelmente mais bonita e acolhedora que a mansão de Montecito onde os duques se instalaram nos EUA.

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Não, a história NÃO se repete. As pessoas é que tendem a cometer sempre os mesmos erros. Harry cresceu numa família de mulheres muito fortes: a sua avó é a rainha. A sua mãe passou de jovem ingénua à mulher que emanava poder e sensualidade diante das câmaras. A sua tia Ana é a jovem que respondeu ao raptor armado que a mandava sair do carro "Não me parece muito provável que isso aconteça" e a mulher que se manteve impassível quando a imprensa revelou as cartas de amor que trocava com um homem que não era o seu marido (veio a ser mas só depois de Ana se divorciar). A sua madrasta Camilla Parker Bowles enfrentou uma das maiores campanhas de ódio e desprezo do Reino Unido… À excepção de William que criou uma imagem de casal com Kate, os homens da família real britânica tendem a ser suplantados pelas suas mulheres. Basta olhar para as imagens do príncipe Eduardo com Sophie Rhys-Jones, Ana com Timothy Laurence ou as pretéritas de Carlos com Diana e André com Sara para o perceber. Harry não é excepção só que Harry não parece saber qual é o mundo em que quer desempenhar o papel de marido de Meghan. Há momentos desta entrevista em que parece um adolescente perorando sobre a enfadonha vida dos adultos ou o recém-convertido a uma qualquer seita: "Eu estava preso, mas não sabia que estava preso", "Preso dentro do sistema, como o resto da minha família está. O meu pai e meu irmão estão presos. Eles não se podem ir embora e eu tenho uma grande compaixão por eles."

Harry é um marido apaixonado, um pai enlevado mas também um homem muito frágil no que a si mesmo respeita. Nesta entrevista a Oprah ele repetiu algo que já tinha expressado antes: receia que Meghan repita o destino trágico da sua mãe. Como invariavelmente acontece com as personagens das tragédias, Harry vive obcecado com fantasmas, procura enganar o destino e não percebe o essencial: o que tanto teme que aconteça já está a acontecer, só que a vítima é ele.

Harry é neste momento alguém isolado da sua família, que deixou o seu país, que, após o seu casamento com Meghan, viu pedirem a demissão do seu staff e assessores, que estavam a seu lado há anos e o tinham ajudado a ultrapassar junto da opinião pública episódios como os da festa em que compareceu disfarçado de nazi. Após a entrevista a Oprah, Harry pode ter começado a perder o apoio e o carinho de quem sempre tivera um fraquinho por ele, de quem lhe perdoara as bebedeiras e as inconveniências, de quem contemplara embevecido o Harry militar: o povo inglês.  

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A família real tem de estar preparada para ajudar Harry. Tenha ele ou não Meghan a seu lado.

Não, os mortos NÃO falam e neste caso isso talvez seja uma bênção para Meghan. Na verdade não se trata de mortos mas sim de uma morta, Diana. "Não podia ter deixado a família real se não tivesse a herança da minha mãe" – declarou Harry num momento de constrangedora sinceridade pois, para a maior parte dos mortais, a decisão de voltar ao básico, como os duques de Sussex pretendem, não costuma ser acompanhada de uma conta bancária de milhões de libras.

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Harry transmite a convicção de que a sua mãe de alguma forma intuiu o percurso que ele ia fazer, a consequente necessidade de protecção que ele ia ter no futuro e que por assim dizer Diana estaria do seu lado neste momento. Aqui entramos no domínio da pura especulação mas creio que Harry está profundamente enganado: a sua mãe estaria do seu lado, isso é indiscutível, mas é muito duvidoso que a sua mãe achasse que Harry devia estar ao lado de Meghan. E muito menos que este a devia ter acompanhado no bater com a porta à família real e subsequente regresso aos EUA. Recordo que Diana separou-se de Carlos mas nunca separou os filhos da família real e muito menos os separou do papel que se esperava viessem a desempenhar na monarquia britânica. Pelo contrário, preparou-os para isso. 

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Não sei se Diana teria força suficiente para impedir o filho de dar este passo. Mas estou convicta que as galinhas de Montecito teriam muito que contar se Diana fosse viva e por estes dias passasse pela mansão de Montecito onde Harry vive com Meghan. Então é que Oprah não ia parar de repetir "what!"

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Não, Harry e Meghan NÃO são os novos duques de Windsor. Durante anos os duques de Windsor arrastavam-se de festa em festa com um ar que oscilava entre a sofisticação e a decadência. Havia é certo umas fotografias inconvenientes dos duques na Alemanha de Hitler e uns relatórios dos serviços secretos britânicos confirmando as pouco recomendáveis simpatias políticas do duque (sim, e também o passado sexualmente atribulado da duquesa). Mas o tempo e os bons ofícios de serviços de informações vários fizeram esquecer essas imagens. Tiveram também os duques de Windsor o bom senso de falar pouco e sobretudo a inteligência de não questionar a família real enquanto instituição. No fim, os diversos protagonistas desta história não se perdoaram tudo mas compreenderam-se em algumas coisas.

Já Harry e Meghan optaram por uma estratégia de confrontação com a família real, mais a mais num tempo em que tudo fica registado, é reproduzido e ampliado. Donde três coisas podem acontecer e todas são más: ou Harry e Meghan entram num processo de estrelas decadentes, vulgarizando-se em declarações sucessivas. Ou imitam a princesa Margarida e fazem de Montecito a sua ilha Mustique onde, longe dos fotógrafos, se afogam em lágrimas, festas e no que tiverem à mão. Ou produzem declarações tão contundentes que afetam directamente alguns membros da família real e o apoio dos britânicos à monarquia. Claro que existe outra hipótese: sararem feridas e celebrarem pelo menos institucionalmente os laços de família. Mas não parece que isso esteja para acontecer.

Helena Matos escreve segundo o antigo Acordo Ortográfico

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