Sem catwalks nem passadeiras vermelhas, a Moda ficou sem bússola que a oriente. Valem-nos séries de televisão como Gambito de Dama, Emily in Paris ou Bridgerton que enchem de glamour o inverno do nosso confinamento.
Foto: IMDb22 de janeiro de 2021 às 16:57 Maria João Martins
Elizabeth Harmon, a esfíngica protagonista da série da Netflix,Gambito de Dama,triunfa num feudo tradicionalmente masculino - o xadrez - sem jamais abdicar da sua feminilidade. Para acentuar essa determinação, a figurinista Gabriele Binder dotou a personagem (interpretada por Anya Taylor Joy) de um guarda-roupa em que não faltam citações dos grandes nomes da Moda das décadas de 50 e 60 como Courrèges, Pierre Cardin ou Dior, sem esquecer a influência exercida por ícones do estilo como as atrizes Audrey Hepburn ou Jean Seberg.
Por mais espectacular que seja o guarda-roupa desta rainha do xadrez que conquistou o coração dos espetadores de streaming, Gambito de Damanão é, todavia, exceção. Antes disso, já outras séries passadas em épocas distintas tinham inspirado as escolhas de estilo, desdeEmily in Paris(com o guarda-roupa a cargo da mítica figurinista deOSexo e a CidadeeO Diabo Veste de Prada,Patricia Field) aKilling Eve, passando porMad Men, Gossip Girl, Euphoriaou até mesmo a uma série de época (ambientada na Inglaterra do princípio do século XIX), o mais recente campeão de audiências da Netflix,Bridgerton.
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Sem semanas da Moda ou red carpets dignas desse nome, os nossos espíritos confinados, sedentos de glamour, alimentam-se dos outfits destas e outras personagens e seguem no Instagram os perfis das figurinistas das séries de maior sucesso. Nas últimas semanas, o da responsável do guarda-roupa deBridgerton,Ellen Mirojnick, aumentou exponencialmente o número de seguidores, que não queriam perder pitada sobre as mais de 7000 peças criadas para a série. Mas, como a própria revelou numa entrevista à Vogue Espanha, sob aquela aparente leveza estava um orçamento astronómico e uma equipa de guarda-roupa composta por 238 profissionais.
Na verdade, embora possa influenciar as escolhas dos espetadores, a roupa que vemos no pequeno e no grande écran não partilha os mesmos objetivos que a Moda. É outra coisa, como diz à Máxima a figurinista portuguesa Patrícia Dória. Com um currículum em que se destacam filmes comoVariaçõesou séries de televisão comoTrês MulheresouA Espia,Patrícia concilia a investigação sobre a época e a necessidade de caraterizar psicologicamente uma personagem. "A série Três Mulheres foi um desafio enorme porque estavamos a retratar três pessoas que realmente existiram (Vera Lagoa, Natália Correia e Snu Abecassis) e que marcaram profundamente a sociedade portuguesa." Um desafio que se revelaria empolgante porque, ao longo do processo de investigação, houve surpresas muito curiosas: "Lembro-me, por exemplo, que os anéis usados pela Maria João Bastos, que interpretava a Vera Lagoa, tinham sido emprestados pelo afilhado desta. Ou seja, tinham pertencido à própria Vera Lagoa, como, aliás, algumas peças de roupa. O mesmo aconteceu com um poncho peruano que pertencera à Snu Abecassis e que estava na posse da sua antiga secretária, Virgínia. A Vitória Guerra pôde usá-lo na série."
Cada projeto tem as suas especificidades e desafios: "Com A Espia - conta ainda Patrícia Dória - foi mais simples porque era tudo ficcional e aí o meu trabalho foi recriar a silhueta da época, vendo muitos filmes da década de 40, nomeadamente de espionagem."
Cada projeto tem as suas particularidades. Patrícia, que gosta de respigar aqui e ali durante a investigação, também faz peças de raiz (como aconteceu no filme Variações, ambientado sobretudo na década de 80). O seu objetivo nunca é fazer Moda, embora admita que ela própria se sente frequentemente influenciada pelo trabalho: "Lembro-me de ter andado um tempo a vestir-me muito à anos 70. Foi numa época em que andei a trabalhar nas primeiras temporadas da série Conta-me como Foi."
O fenómeno em si não é novo. Em plena Segunda Guerra Mundial, com as grandes casas de Moda europeias a fecharem portas, coube ao Cinema ditar tendências. Os penteados e o guarda-roupa usados pelas grandes estrelas eram copiados pelas espetadoras e suas modistas com os materiais que tinham à mão (e que não eram muitos uma vez que o racionamento, imposto pela Economia de Guerra, também chegava aos têxteis). Nessa época, o mimetismo era tal que a atriz Veronica Lake, popularizada pela longa cabeleira loura, teve de pedir às suas fãs, sobretudo às que trabalhavam em fábricas, que prendessem o cabelo, já que não era seguro manusear máquinas com ele solto.
Penteados à parte, ao longo das décadas, não foram poucas as modas que saltaram diretamente das salas de cinema para a rua, a começar pelas sabrinas, inspiradas no calçado usado por Audrey Hepburn no filme do mesmo nome, ou pelas calças curtas ditas à La Mangano (por terem sido usadas pela atriz italiana Silvana Mangano no filme Anna, de 1951).
Este tipo de mimetismo passou, como não podia deixar de ser, para o pequeno écran. No Portugal dos anos 70 e 80, as telenovelas brasileiras abriram um país ainda muito fechado sobre si mesmo a um mundo novo de vivências, também de Moda. Telenovelas comoDancin’ DaysouÁgua Viva ditaram tendências e mudanças de hábitos nomeadamente entre as adolescentes e as mulheres jovens, como demonstram a popularidade entre nós das sandálias de salto com soquetes coloridos e brilhantes usadas por Sónia Braga (em Dancin’ Days) ou do brinco em forma de raio com que Glória Pires aparece em boa parte dos capítulos deÁgua Viva.
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Mas se, desta relação apaixonada da Moda com a Televisão, muitos outros exemplos poderiam ser dados (desde as caneleiras em lã deFameaos tailleurs empoderados de Dinastia), o auge chegaria no final da década de 90 com a série O Sexo e a Cidade. Patricia Field não só criaria quatro estilos completamente distintos para outras tantas apaixonadas por Moda (da mais conservadora Charlotte à arrojada Samantha) como influenciou de forma determinante o nosso conhecimento sobre esse mundo. Para além da imorredoura paixão de Carrie Bradshaw (Sarah Jessica Parker) pelos sapatos assinados por Manolo Blahnik, ficámos a conhecer muito melhor as criações de criadores e marcas como Alexander McQueen, Jimmy Choo, Versace, Dior, John Galliano ou Prada. Como dizia Patricia Field numa entrevista, de 2018, à Vogue britânica, tamanho sucesso foi completamente inesperado: "Quando tudo isto rebentou, os criadores e as marcas insistiam para colocar as suas peças na série. Tínhamos de lhes explicar que estávamos ali para contar uma história e não para vender roupa." Com a HBO a anunciar o regresso da série aos écrans (ainda que sem a personagem de Samantha já que a sua intérprete, Kim Catrall se incompatibilizou com Sarah Jessica Parker), os holofotes voltam a incidir sobre os muito invejáveis closets de Carrie, Miranda e Charlotte. Os anos passam mas é bem provável que as três amigas continuem a ser as mulheres mais bem vestidas de Manhattan.
Durante décadas, o closet mais cobiçado da televisão não estava ao alcance de todas nós. O Vestiaire Collective é um site de peças vintage que está a recuperar algumas das mesmas referências de estilo.
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