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Teresa Guilherme: “Houve uma senhora que me disse: 'Olhe, um vibrador não lava a louça'”

A apresentadora está de volta aos palcos com o espetáculo de humor "As Vaginas e Eu – Tudo o Que Ficou por Dizer". Conversámos com ela sobre este seu desejo de quebrar tabus e preconceitos, transformando as conversas sobre sexualidade feminina numa coisa normal, descontraída e hilariante.

Foto: DR
17 de janeiro de 2025 às 20:58 Madalena Haderer

Se não vive debaixo de uma pedra, é provável que já tenha visto que Teresa Guilherme está de regresso aos palcos com a peça: As Vaginas e Eu – Tudo o Que Ficou Por Dizer, uma espécie de sequela da sua participação nos famosos Monólogos da Vagina. O que é que pode esperar de uma peça com este nome? Para já, esqueça a duração de 70 minutos. Teresa anda pela plateia a fazer perguntas que, frequentemente, se transformam em conversas, reminiscências e discussões. Não é preciso muito para que passem duas horas. Mas duas horas passadas a rir à gargalhada. Haverá momentos em que dará por si a gritar uma palavra de jargão, de quatro letrinhas apenas, que é sinónimo de vagina – e não, não é essa que está a pensar. E, no fim, acabará a cantar um hino de empoderamento vaginal. 

Pelo meio, Teresa Guilherme vai contando pequenos episódios deliciosos, como aquele, passado em Toronto, em que a avisaram que as pessoas não eram muito expansivas e, portanto, para ir com calma. Qual não foi o seu espanto quando, ao perguntar "Qual é o odor da vagina?", alguém grita "Bacalhau!" – uma ocorrência comum – e uma senhora levanta-se do seu lugar e vem para a frente do palco cantar a música Bacalhau à Portuguesa, de Quim Barreiros, que acompanhou com uma pequena coreografia – que Teresa Guilherme emula, para nosso gáudio. Vale a pena perguntar como teria corrido o espectáculo se os habitantes de Toronto fossem expansivos.

A atriz e apresentadora recorda também um dia em que uma espectadora, aproveitando o microfone que se aproximava, anunciou, de forma acalorada, que o marido não queria estar ali, mas que ela o tinha obrigado a ir porque: "Isto é formação!" E é mesmo. O objetivo de Teresa Guilherme é ajudar a quebrar tabus e preconceitos relacionados com a sexualidade feminina e é muito animador ver a plateia cheia de casais e de famílias – pais, filhos, avós… Filas inteiras de parentes. E ninguém faria isto tão bem quanto Teresa, que tem uma capacidade natural para pôr as pessoas a dizer coisas que normalmente não diriam. 

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Acredite ou não, foi exatamente isso que aconteceu a esta jornalista, não durante o espectáculo, mas na casa da apresentadora, onde esta recebeu a Máxima para uma conversa intimista. Ao vivo, no aconchego da sua casa, Teresa Guilherme é uma pessoa mais reservada, mais séria, talvez até um pouco fechada. Não obstante, esta jornalista, que nem é muito dada a confidências, deu por si a contar detalhes da sua vida privada e a ouvir conselhos. É possível que boa parte das pessoas com 40 e poucos anos, que viram as primeiras edições do Big Brother, tenham um desejo secreto de se confessar à apresentadora. E é provável que seja uma ocorrência comum, na vida de Teresa Guilherme – é que ela põe mesmo as pessoas à vontade, e tem um interesse genuíno em ouvi-las.

Posto isto, não perca esta oportunidade e veja-a no palco do Teatro Armado Cortez, em Lisboa, onde Teresa chora a rir, encostada ao palco, com as coisas alucinadas que as pessoas dizem – exemplo: um senhor que acha que as vaginas devem cheirar (e saber, subentende-se) a frango assado. A peça estará ali em exibição até dia 2 de fevereiro, às sextas e sábados às 21 horas, e aos domingos às 18h30. Depois, haverá uma digressão nacional com espectáculos já marcados em Braga, Nazaré, Coimbra, Santa Maria da Feira, Lavra, Azeitão, Vila Franca de Xira, Albufeira, Madeira e novos locais a anunciar em breve. Os bilhetes estão à venda em Ticketline.pt e nos locais habituais.

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Por que razão decidiu escrever esta peça? O que é que ficou por dizer?

Fiz os Monólogos da Vagina durante quatro anos, uma peça ótima, feita por três atrizes, cada uma com o seu monólogo. E num desses monólogos eu ia à plateia trocar impressões com o público. E achei que não ia ser capaz. Dizia: "Ah, vou-me distrair com as pessoas, vou-me perder no texto." Mas experimentei – também não tive alternativa –  e descobri que conseguia fazer. E que me entretinha bastante com as pessoas porque elas tinham muitos palpites para dar, muitas ideias, faziam muitas perguntas, tudo coisas a que eu não podia dar andamento naquele momento, e respondia só por alto. A determinada altura, comecei a pensar que devia tomar nota das ideias do público para um dia desenvolver. E foi o que fiz. No final de cada atuação, anotava as ideias mais engraçadas, mais surpreendentes, mais sérias, que levassem a outras questões. Ficaram ali muitas histórias por contar, muitas perguntas por responder. Portanto, quando os Monólogos acabaram, com aquele elenco, comecei a pensar que poderia fazer uma compilação das perguntas das pessoas e foi assim que acabei a escrever esta peça, com o Miguel Dias, que também é o encenador. Na verdade, é uma peça, mas onde eu estou a fazer de mim, claramente. Quem está ali é a Teresa, não há dúvida. 

Estive na estreia e a plateia era muito heterogénea. Não era só mulheres.

Não, há muitos casais, muitas famílias, este ano há muitas famílias. É muito engraçado ver. Ao longo das décadas que eu tenho vivido, isto tem evoluído muito. Era impensável, há uns anos, e nem é preciso ir muito atrás, imaginar uma família a assistir a um monólogo onde se fala de sexualidade feminina, das vaginas, em que estivesse lá o pai e a mãe, e a mãe dele, portanto a sogra, e uma filha ou um filho. E estão todos seguidos. E eu pergunto: "Então isto é o quê? É família?", e eles: "Somos todos família até ali. Somos seis." Portanto, pessoas de todas as idades. É uma peça muito transversal. As pessoas divertem-se imenso. E uma coisa que acontece, que me agrada muito, é que as pessoas entram um bocadinho tímidas, mas no fim estão aos gritos "VAGINAS UNIDAS JAMAIS SERÃO VENCIDAS". E saem dali levezinhas. Há uma libertação que eu sinto nas pessoas. Saem dali desbloqueadas, era essa a minha intenção e tem corrido melhor do que eu esperava. Controlar aquela conversa toda – porque as pessoas são muito faladoras – não é difícil, mas é cansativo. Tenho de improvisar em cima daquilo que as pessoas dizem e eu não faço a menor ideia do que é que as pessoas me vão dizer. Mas é muito divertido.

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E nota diferenças entre o que os homens e as mulheres dizem? 

Sim, há grandes diferenças. O ideal são casais. Gosto muito de casais. Porque os casais contrariam-se ou apoiam-se ou o que for. Mas sentem-se apoiados um pelo outro e são mais expressivos. É engraçado. E os homens têm sempre opinião. Nunca se chega ao pé de um homem que diz: "Ah, não, não tenho nada para dizer…" Nunca. Dizem sempre alguma coisa.

Na estreia estava um casal com uma filha adolescente. A senhora dizia que tinha o vibrador escondido, para a filha não dar com ele, e o senhor dizia que ficava sempre contente quando a mulher lhe dizia para o ir buscar porque era sinal que ia haver festa para ele também. 

Pois, é uma ajuda. É um amigo, não é? E os homens muitas vezes contam ali que oferecem brinquedos às mulheres, nos aniversários, nos natais, que eu acho extraordinário, nos natais, à frente da família toda. E, portanto, assumem a sua vida sexual como uma coisa natural, que é. E isso é ótimo. E quando o dizem publicamente, é mais uma camada de tabu que cai e isso é muito bom.

Há uns anos, os homens sentiam-se ameaçados com os brinquedos sexuais. 

Achavam que eram uma espécie de substituto. Uma acusação de que eles não eram suficientes. Portanto, as mulheres usavam os brinquedos na mesma, mas às escondidas. E, pronto, daí é que nascem os tabus e os preconceitos, não é? Ou isso ou eram coisas que só mulheres sozinhas é que usavam. Coisas de mulheres encalhadas. Hoje em dia, já não é assim. É só mais uma coisa que lhes pode dar prazer. Não é nem a única coisa, nem substitui um homem. 

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Durante a peça, a Teresa diz exatamente isso: o marido é uma coisa e o brinquedo é outra.

Sim, porque as pessoas dizem-me muitas vezes: "Ah, quem tiver um brinquedo não precisa de ter marido. Os maridos dão muito trabalho." Também me lembro de uma senhora que me disse assim: "Olhe, mas um vibrador não lava a louça, não é?" E eu pensei, olha como veio aqui um pensamento tão antigo. Uma coisa tão antiga, que veio aqui misturada numa coisa tão moderna.

A determinada altura, a Teresa também fez umas perguntas a um casal mais velhote. E um deles respondeu: "Ah, nós já não fazemos nada disso, já passámos da validade. E a Teresa respondeu: "Não me diga isso. Não me diga isso, que eu não quero ouvir isso."

Sim. Detesto mesmo ouvir isso, porque as pessoas desistem, não é? A dada altura, homens e mulheres, desistem. E isso faz mal, porque é uma coisa muito pouco saudável, desistir do sexo. E depois, em cima disso, desistem do amor, do carinho, da atenção, dos mimos. E isso não está certo. É uma perda muito grande que as pessoas se impõem, porque não é a sociedade que impõe. Cada um é que decide: "Já não vale a pena. Não, não, [a vagina] já está muda." Muitas vezes aparecem senhoras viúvas que dizem: "O meu marido morreu há não sei quantos anos e não, não… a partir daí, nada…" É como um dia dizer assim: "Agora tenho 50 anos e já não me rio mais. Vou deixar de rir. Vou deixar de sorrir. Já não tenho idade para essas coisas." É a mesma coisa. Exatamente a mesma coisa. E depois torna-se um hábito e é muito prejudicial. 

Vou dar um exemplo. Eu e umas amigas juntámos-nos e oferecemos a outra nossa amiga um sugador [um brinquedo sexual com efeito de sucção do clitóris] no aniversário dela. Foi uma grande risota. Ela não é nada conservadora, mas como é mais velha, não é? Enfim, na verdade, ela tem exatamente a mesma idade que eu [69 anos]. No dia seguinte, telefonou a cada uma de nós a dizer "Olhem, é maravilhoso! Vocês têm que ter um!" Depois foi à ginecologista, à consulta de rotina, e contou-lhe e a ginecologista disse que ela fazia muito bem, que é uma coisa muito saudável, que todas as mulheres deviam usar para não deixar aquela função desaparecer. Porque o prazer está lá na mesma. Os homens nisso são mais insistentes. Fazem o que podem, mas vão fazendo, não é? As mulheres fecham mesmo uma loja. 

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A identidade deles parece estar mais ligada à sexualidade. 

Talvez porque os homens podem procriar sempre e as mulheres não. Portanto, a menopausa não é uma fase fácil de ultrapassar, nem de viver. O antes, o durante, e o depois. Deixa marcas. Se as mulheres forem na conversa do "pronto, agora já não é para ter crianças, já não vale a pena", é um problema, porque as hormonas já não chamam, não é? Quando uma coisa não tem nada a ver com a outra. Caso contrário, só se teria sexo para ter filhos, e não é esse o caso. 

Nos últimos anos tem-se falado mais de menopausa. Há mais informação. As pessoas estão mais interessadas em saber coisas. A narrativa parece estar a mudar.

Sim, de repente percebeu-se que as mulheres passam mesmo um mau bocado. Acho que os médicos, não estou a dizer que são todos, obviamente, mas, como é uma fase natural da vida, não ligam nenhuma. Não é uma doença. Não ligam nenhuma. E deviam ligar. Porque não é uma doença, mas traz muita perturbação física, psicológica e mental, até. E deveria ser ajudado, ou pelo menos deveria ser encarado, por quem pode ajudar, de uma forma séria. Lembro-me de andar à procura de o que é que eu posso tomar, o que é que ajuda. E ouvia: "Ah, não, isso depois passa…" E não é um período fácil. E eu tive uma menopausa santa. Mas, mesmo assim, psicologicamente, não. 

A questão é que a menopausa não está só relacionada com a sexualidade. O decréscimo hormonal interfere com os ossos, o coração, a memória, a visão, a pele, o cabelo…

Ou seja, interfere com a pessoa inteira. O próprio cérebro deve dar ordens, não é? Porque é isso que o cérebro faz, dá ordens. "Pronto, se agora não é para procriar, então arruma isso aí a um canto." Mas os homens não recebem essa mensagem. Poderão receber uma mensagem de menos vitalidade, mas é uma mensagem física, nós mulheres recebemos outra mensagem que é do "está quietinha e desiste".

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E para os homens arranjou-se logo um comprimido milagroso. Já as mulheres que queiram fazer terapia de substituição hormonal, por vezes, têm dificuldade em ser ouvidas e levadas a sério pelos médicos.

Mas é em todo o mundo assim, é em todo o mundo. Agora, vá lá, falando mais, talvez eles tenham chegado à conclusão que isto é um mercado. E se chegarem à conclusão que é um mercado e que há dinheiro para ganhar, então... 

Não é triste isso? 

É muito triste. Claro. Mas não é uma coisa que tenha evoluído muito. Evoluiu um bocadinho, mas há que procurar. Porque os efeitos, tratando antes de acontecer... Porque na verdade já está a acontecer, quando a pessoa começa a pensar nisso, já está a acontecer. Eu, talvez por ser tão picuinha e andar sempre à procura em todas as áreas, só fiz menopausa aos 57 anos. É uma grande sorte. Porque dá saúde, não é? Quanto mais tarde, melhor. Mas não depende de nós. Depende é do acompanhamento, para o corpo e a cabeça não se desequilibrarem. Lembro-me, perfeitamente, de haver dias em que pensava: "Não sei quem é esta mulher, não sei quem sou eu." Porque é isso que acontece. Temos uma nova personalidade, durante um tempo, pode ser três anos, pode ser quatro anos, não é durante três dias, nem três meses. E o que resta, no fim dessa volta toda, não é a mesma coisa que estava lá no início. Lembro-me que, nessa fase, dizia muitas vezes: "Isto é uma espécie de adolescência." E é. Só que não é respeitada. Porque os adolescentes... Também passam mal, coitados. Também com crises de identidade. É a mesma coisa. Exatamente a mesma coisa. Só que quando acaba, deixa lá um adulto. E a menopausa, quando acaba, deixa lá uma pessoa que, se se deixar levar muito por aquilo, fica incapaz de reagir.

Voltando à peça, a Teresa tem uma capacidade incrível para pôr as pessoas à vontade, e isso faz toda a diferença.

Acho que tenho essa capacidade, sim. Nem sabia que tinha. Mas as pessoas também já me conhecem. Algumas desde que nasceram, portanto ao fim de cinco minutos acham que eu sou da família. E já se confessam. E percebem que eu não vou ali brincar com elas. Ou seja, uma vez um senhor mandou-me uma mensagem no Instagram a dizer que tinha gostado da maneira carinhosa e cuidadosa como eu tratava as pessoas. Sem as humilhar. Sem dizer alguma coisa que as fizesse sentir menos à vontade. Que as pessoas se sentiam aconchegadas. Dissessem elas o que dissessem, estavam à vontade. Não havia ali julgamentos. E é verdade. Para além disso, eu estou a perguntar e quero mesmo ouvir a resposta. Quero mesmo que elas respondam. Por mim, porque é bom para a peça. Mas também por elas porque, quando não respondem, depois vão para casa contrariadas com elas próprias: "Por que é que eu não disse? Por que é que eu não falei?" Também há aqueles a quem eu não faço perguntas e ficam frustrados com isso. Apanho muitos a dizer: "Olhe, esta pergunta que me está a fazer, já lhe respondo. Mas primeiro vou responder à outra que fez há bocado porque fiquei aqui com uma coisa engasgada." 

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De início, as pessoas estão muito acanhadas, mas depois alguém diz que a vagina deve saber a frango assado e, pronto, começam a descontrair e a dizer o que lhes vai na alma.

O senhor do frango assado é que foi o primeiro... O grande... Sei lá. Foi o que me deu a certeza de que aquilo funcionava. Até aquele homem me dar aquela resposta, eu não sabia se ia funcionar. 

E já que estamos a falar nisso, qual foi a coisa mais surpreendente ou mais caricata que já lhe disseram? 

Ah, não. Isso é impossível. É impossível. Acontece todos os dias. Anteontem, uma senhora disse-me que não comprava brinquedos porque uma amiga brasileira lhe tinha dito que o melhor brinquedo que há é a escova de dentes elétrica. Ficou toda a gente embasbacada. Eu só lhe perguntei: "Mas tem duas, não é?" Porque é um mistério, não é? Como é que ela usa? E não dá para perguntar. As pessoas começaram a dizer coisas: "Ah, deve ser porque tem bigodes… Mas como é que usa?..." As pessoas realmente interessadas em saber. Ela queria falar e eu não deixava. Também não posso deixar expandirem-se muito, não é? Porque não pode ficar vulgar. Isso, nem pensar.

Mas os bigodes da escova não arranham?

Sei lá... Eu também pensei assim: "Bem, quando chegar a casa e olhar para a minha escova, vou ver uma coisa diferente." Mesmo só de olhar para ela, a imaginação faz o resto, não é? Portanto, todos os dias alguém diz alguma coisa estranha. Esta situação passou-se com uma rapariga nova. E ela tinha uma coisa muito engraçada – era muito séria. Estava a dizer aquilo com toda a seriedade. Nunca sorriu. Toda a gente a fazer perguntas e ela ia respondendo como se estivesse a fazer uma palestra. Portanto, ela saiu dali com a sua convicção e, às tantas, abriu horizontes sobre as escovas de dentes elétricas, que é uma coisa que agora muita gente tem. E foram todos para casa olhar para aquilo com outros olhos.

Não acha que as mulheres se preocupam muito mais com o sabor e o odor da vagina do que os homens? 

Acho é que têm opiniões muito diferentes. O que para nós pode ser uma coisa má, para eles pode ser uma coisa positiva e excitante, até. É como a celulite. Nós: "Ah, meu Deus, tenho um bocadinho de celulite" e os homens acham a celulite engraçada. Quantas vezes isso acontece? "Ah, não, não, porque eu estou muito gordinha." E eles: "Ah, estás é magra, podias estar um bocadinho mais gordinha..." Portanto, a perspetiva que nós temos em relação aos cheiros e aos sabores, ao que é excitante ou não é, ou o que resulta ou não resulta para o parceiro, pode não estar alinhada com a opinião do parceiro. Continua a haver muita falta de diálogo nas relações. 

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As mulheres têm períodos, têm menopausa, têm uma uretra mais curta que a dos homens com maior propensão para infeções urinárias. Não acha que nos calhou a fava da existência humana?

Acho que temos uma coisa que compensa todas essas: orgasmos múltiplos. Temos orgasmos múltiplos e os homens não têm. Para nós é siga e para eles, não. Têm que ficar à espera. Eles são muito mais dependentes da sua própria reação física aos estímulos. Por isso é que se preocupam mais com isso do que nós. Nós, o que temos é que saber pedir, dizer, apontar, indicar e pronto. Não é ficar à espera. Isso é que eu acho que ainda acontece muito. As mulheres ficarem à espera que os maridos, os namorados, descubram o que é que lhes dá para prazer. Às vezes, acertam porque gostam das mesmas coisas. Outras vezes, o próprio não faz qualquer coisa porque acha que ela não gosta, e vice-versa, e cria-se um mal-entendido que nunca mais tem fim, e não se dão prazer um ao outro exatamente por não conversarem.

É o mesmo que servir um jantar ou uma refeição qualquer, todos os dias, sem nunca perguntar o que a outra pessoa gosta de comer. Todos os dias: "Ah, vou fazer-lhe a minha massinha" e a outra pessoa não gosta nada de massa, prefere arroz. E o outro até gostava mais de fazer arroz, mas faz-lhe a massa porque acha que ela gosta de massa, e cria-se um mal-entendido. É a mesma coisa. 

Se calhar era bom que as mulheres encontrassem a sua voz noutras dimensões da vida. Tendo em conta o estado do mundo, será que isto não funcionava tudo muito melhor se fosse gerido por mulheres? 

Não sei, acho que deve ser gerido pelo conjunto, por algum motivo há homens e mulheres. Não se entenderem, para se chegar à conclusão certa, é que é mau. O que é quase inexplicável – e é muito mais por inércia nossa do que por os homens fazerem força para isso –, é haver o clube dos homens que mandam em tudo. Seja onde for, numa empresa, num país, no mundo, são sempre homens. E aí, a ausência da opinião e do bom senso feminino faz uma falta doida porque olha o trabalho de treta que eles têm feito. Portanto, sim, as mulheres não fariam pior trabalho, seguramente. 

As pessoas ainda têm mais resistência em eleger uma mulher do que em eleger um homem, é verdade, mas não numa empresa. O que há também é uma falta de vontade das mulheres para assumirem cargos de liderança. Há vontade, mas depois, chegando lá, as mulheres têm que se dividir por tanta coisa que depois a liderança exige uma entrega tão grande e um apoio, não é? Ter uma retaguarda de pessoas que a apoiem para se poder dedicar a um trabalho ou ao que for. E às vezes isso não existe. Portanto, mulheres líderes, não é que não existam, claro que existem, até dentro de si próprias, que nunca exercem, porque elas acabam para liderar as suas próprias casas no mundo, só que as grandes decisões ficam na mão dos homens e vê-se o lindo serviço que têm feito.

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