A que cheira o PIPY de Cristina Ferreira?
A apresentadora acaba de lançar um produto que a própria chama de "provocatório": uma bruma íntima. O nome diz tudo. É o primeiro lançamento do seu novo negócio, #eusouGIRA – uma plataforma de e para mulheres. É possível que seja vantajoso, mas será lícito? A Máxima opina.
Se Gwyneth Paltrow pode criar um império chamado Goop baseado em produtos femininos que não fazem falta a ninguém e que não têm validação científica, por que não também Cristina Ferreira? A pergunta é vagamente retórica, mas tem uma razão de ser: a apresentadora acaba de lançar o seu novo projeto, #eusouGIRA – que não tem nada a ver com bicicletas –, cujo primeiro produto a sair para o mercado é uma bruma íntima chamada PIPY. (Escusa de olhar para o calendário que ainda falta muito para o Dia das Mentiras). Cristina Ferreira abandonou o mundo das publicações – a sua revista Cristina não voltará aos escaparates –, e anda há meses a preparar o lançamento deste novo negócio. Para já, tem este produto, que a própria admite ser uma provocação e, nos próximos dias, começarão a ser lançados episódios de podcast, com conversas que a apresentadora terá com outras mulheres, sobre temas femininos.


No site da nova marca, pode ler-se a seguinte descrição do PIPY: "Desenvolvido com uma fórmula com pH equilibrado compatível com a zona íntima externa que respeita o equilíbrio natural da pele. Contém ácido lático que favorece a hidratação da pele junto da zona íntima. Bruma testada dermatologicamente e ginecologicamente, oferece uma sensação de frescura imediata." Quanto ao modo de aplicação, pode ler-se o seguinte: "Aplicar diretamente na zona íntima externa, mantendo uma distância segura. Usar diariamente, especialmente após o banho ou sempre que precisar de uma sensação extra de frescura." E é também possível ver a lista completa de ingredientes, o que é particularmente importante já que a quantidade de um determinado ingrediente numa formulação é tão ou mais relevante quanto o ingrediente em si – mais sobre isto daqui a pouco.
Com o lançamento da bruma íntima PIPY, veio para a boca de cena o usual coro da tragédia grega condenar a apresentadora por explorar as fragilidades das mulheres e que os órgãos genitais são limpos e não precisam de nada para cheirar bem. Esta jornalista, porém, não faz parte da equipa que considera que a região vulvar deve ser lavada apenas com água – e tendo sido bafejada com uma mucosa particularmente reativa e temperamental, já experimentou toda a sorte de produtos e técnicas de limpeza, incluindo "água com água" e acredita que um produto lavante delicado é essencial –, mas uma coisa é um gel ou óleo de limpeza, outra coisa muito diferente é um produto específico para perfumar ou desodorizar a zona genital. Este último, não só não faz falta como pode ser prejudicial. A flora genital é extremamente sensível e produtos que contêm perfumes ou fragrâncias tendem a causar inflamação ou desequilíbrios do pH que podem dar origem a candidíase e promover infeções urinárias, pelo que devem ser evitados.





Posto isto, será o caso que Cristina Ferreira tem uma responsabilidade social acima da média, com uma exigência ética tal que a deva impedir de lançar produtos desnecessários ou duvidosos ou, como a própria diz, "provocatórios"? Mais importante ainda, não serão as mulheres capazes de decidir se determinado produto faz falta nas suas rotinas de higiene pessoal? Vai tudo a correr comprar 30ml de bruma íntima PIPY, a 29,90 euros o frasco, porque a Cristina diz? Em princípio, não.
Ainda a propósito de ingredientes, posto de uma forma simples, num qualquer produto de beleza ou alimentar, os ingredientes aparecem na lista por ordem decrescente de percentagem em que foram usados na formulação – ou seja, as maiores percentagens surgem primeiro, e as menores, no fim. No caso do PIPY, o terceiro ingrediente – os mais relevantes são sempre os primeiros cinco – é perfume, e isso, pelas razões já referidas, é preocupante. Num produto lavante para pele sensível e que tem como prioridade a saúde da flora vaginal, o perfume também pode aparecer, mas quase sempre nas últimas posições da lista de ingredientes. Além disso, os produtos lavantes são prontamente enxaguados e removidos com água, por oposição a uma bruma, que fica na pele.
Já agora, porque aqui na Máxima temos por hábito experimentar todo o tipo de produtos – deixamos-lhe três sugestões de produtos lavantes que respeitarão a sua flora vaginal, perfeitos para mulheres com sintomas vulvo-vaginais de sensibilidade, inflamação, irritação e desequilíbrio do pH: Hydra Oil Higiene Íntima da Cumlaude Lab, Lactacyd Pharma Suavizante e Eucerin Intim Protect. Se, ainda assim, há um cheiro que a incomoda, o melhor é mesmo falar com a sua ginecologista em vez de tentar mascará-lo.

Não obstante, também não é isso que Cristina Ferreira sugere que se faça com a bruma. Num vídeo que postou no Instagram, a apresentadora explicou para que serve o PIPY, dando resposta a algumas dúvidas que foram surgindo nas redes sociais. Diz o seguinte: "Há quem use todos os dias, mas sabem o que é que eu acho graça? É usar assim quando precisamos de um extrazinho de confiança. É que só o vaporizar dá-nos logo assim um élan. Imagine, toma o seu banhinho, vaporiza, o seu namorado ou marido já sabe que está a usar o Pipy…"
Esta explicação faz lembrar uma anedota antiga sobre um casal de velhotes alentejanos que moram paredes meias. Ele perdeu a mulher, ela perdeu o marido. Fruto da solidão, a senhora começa a achar o vizinho atraente. Todos os dias mete conversa com ele, de forma cada vez mais ostensiva. Ele nunca percebe nada. Já exasperada, um dia, estando os dois a observar o gado no pasto, a senhora pergunta: "Ó vizinho, como é que o carneiro sabe que a ovelha está interessada?" Ao que o senhor responde: "Ah, vizinha, o carneiro vai lá pelo cheiro". "Ah, estou a ver…", returque a senhora, fazendo nova pergunta: "Então e o boi, como é que sabe que a vaca está interessada?" O velhote volta à mesma resposta: "É igual, vai lá pelo cheiro." À medida que a conversa avança, a velhota vai-se aproximando cada vez mais do velhote e, já com a voz a tremer, faz uma terceira pergunta: "Então e o bode, como é que o bode sabe que a cabra está interessada?" A resposta é sempre a mesma: "Ah, vizinha, isso é sempre igual, vai tudo lá pelo cheiro." Frustrada, a senhora atira: "O vizinho anda muito constipado, não é verdade?"
Portanto, na prática, o PIPY pretende ser um sinalizador de disposição – o que não deixa de ser uma ideia engraçada –, em cujo caso esta jornalista sugere que a bruma seja borrifada na lingerie ou na barriga e não diretamente na mucosa. Mas cada uma sabe de si. Ou, como diria Rute Remédios, famosa personagem de Herman José: "As opiniões são como as vaginas: cada um tem a sua e quem quiser dá-la, dá-la." Perfumada, ou não.
