Susana Esteban, um clube democrático e vinhos excepcionais
O novo clube de vinhos a que queremos pertencer chama-se Alegrete 1375, tem vagas limitadas mas não elitistas, e promete experiências únicas no mundo vinícola.

Susana Esteban dispensa apresentações. Com inúmeros projetos vinícolas em Portugal e com a distinção de ter sido a primeira mulher enóloga a receber o prémio "Enólogo do Ano" em 2011, são às dezenas os vinhos que já fez sair no mercado sempre com selos de excelência. Vinda da Galiza, e na altura apostada em explorar as vinhas velhas do Douro - ao serviço da Quinta do Côtto e da Quinta do Crasto -, nos últimos anos tem vindo a dedicar-se ao Alentejo, mais precisamente à Serra de São Mamede, onde produz o Alegrete, razão do nosso encontro no Zumzum Gastrobar, da chef Marlene Vieira. Desde 2020 que Susana matutava nesta ideia: criar um clube reservado, mas que não fosse elitista, para dar a um estrito número de pessoas a oportunidade de provar as suas criações mais exclusivas, pensando, a partir daí, uma série de experiências a que o consumidor de vinhos não está habituado a aceder. Mas já lá vamos.
Junto com António Menano, com quem tem uma sociedade, criou dois Alegretes, um tinto e um branco, vindos de uma aldeia com o mesmo nome na Serra de São Mamede e ao lado de Marvão, e com logo criado por Rita Rivotti (que recriou uma ilustração numerária a partir das cepas das vinhas velhas). As garrafas são numeradas de 1 a 1375, e este primeiro lançamento é apenas a ponta do iceberg, ou melhor, um amuse bouche para o que virá em termos de vinhos especiais, daqui para a frente. "É uma vinha que produz 1000 mil litros de branco e 1000 litros de tinto. O que originou as 1375 garrafas - com tão poucas garrafas pensámos que seria melhor pensar no consumidor final." Assim surgem estes Alegretes de 2020, a partir de um hectare único, numa zona da Serra que estava abandonada.

No dia em que chegamos ao Zumzum para um almoço com a enóloga está um dia chuvoso, e as montras envidraçadas do restaurante fazem-nos sentir aconchego e entusiasmo. Deitamos um olho à rua enquanto nos sentamos ao balcão para provar um dos champanhes de Susana Esteban e provar uma das ostras de Marlene. Uma combinação perfeita: aliás, se nos pedissem uma descrição daquilo que seria um início de almoço perfeito, esta estaria no top 3. Quando chegamos, Susana está a contar como é que ao fim de tantos anos ainda tem de disfarçar as ordens que dá nas herdades. "Eu dou as ordens ao meu braço direito, e ele passa-as aos homens, seja durante a apanha ou durante o processo de fermentação em adega." Fala, obviamente, do machismo ainda instalado no mundo dos vinhos, e lemos-lhe no olhar que não dá a mínima importância ao caso. "No fim, sou sempre eu que mando, a palavra é minha", e ri-se, encolhendo os ombros. Pouco mundo, conta-nos, ao longo destes anos, nesse domínio.


Sentamo-nos para conhecer os vinhos, sempre em pairings com os deliciosos pratos da chef Marlene, sejam tarteletes ou arrozes. O branco, que chega à mesa primeiro, é uma agradável surpresa: equilibrado, espirituoso, bebe-se perfeitamente a acompanhar uma panóplia de pratos - ou sozinho. Embora não seja possível precisar as castas existentes, estima-se que nos brancos existam Arinto, Roupeiro, Viozinho ou Fernão Pires.
Na vez de provar os tintos, e embora esperássemos um alentejano puro, Susana Esteban surpreende-nos com um perfil diferente, muito rico e perfumado, que possivelmente resulta da combinação de algumas destas castas: Trincadeira, Rufete, Grand Noir, Alicante Bouschet e Aragonez. "Estiveram 3 anos em barricas que comprei em segunda mão, uma raridade, que dá aos vinhos um toque não muito acentuado a madeira, não os vinca demasiadamente", conta. São vinhos que tanto têm potencial de guarda como são para beber agora. "Acho um desperdício esperar-se demasiado para abrir os vinhos, a vida é para aproveitar agora", acredita.


Quando lhe perguntamos que particularidades tem a Serra, fala-nos da vinha de sequeiro e em altitude (cerca de 700 metros), da mineralidade e de estarmos num terroir munido de granito e xisto. "A ideia é apostar num nicho, a ideia da numeração é para passar a ideia de exclusividade."
Os vinhos em prova são vendidos em caixas de madeira de duas garrafas (cada uma a custar €60), e cada membro do clube terá de comprar seis garrafas de cada (12 no total, no valor de €720). É possível tornar-se membro até 15 de novembro, sendo que só existem 200 vagas. Susana acredita que a verdadeira magia acontece na vinha, e não em garrafa, e está apostada em recuperar as vinhas velhas com o maior dos rigores. Olhos postos no futuro, portanto. Entretanto, já foram vinificadas as colheitas de 2021 e 2022, que hão-de ser lançadas a seu tempo, e que Susana Esteban tem em mente ir mostrando aos membros do clube com idas à herdade, para provar o vinho nas suas mais diversas fases. Um pequeno mimo que é um dos muitos que a enóloga está a preparar para os bon vivants que se juntarem a ele.
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Marlene Vieira. A chef das mil e uma reinvenções, que nunca esquece a tradição
Identitário e intimista, o novo restaurante da chef portuense - Marlene, vizinho do Zunzum, em Santa Apolónia - proporciona uma cadência lógica ao paladar, como uma peça de teatro à mesa. Para assistir de camarote só tem de vir com ‘abertura à experiência’, conta à Máxima.