Histórias de amor moderno. “O meu namorado ganha menos do que eu e isso está a separar-nos”
“A gestão do orçamento partilhado matou qualquer réstia de sex-appeal.” Todos os sábados, a Máxima publica um testemunho de como é o amor no séc. XXI.

Começou com pequenos gestos, daqueles que se acumulam todos os dias até se tornarem impossíveis de ignorar. Eu e o meu namorado tínhamos acabado de mudar-nos para um apartamento num prédio a precisar de obras no centro da cidade, um achado portas vizinhas com a gentrificação, encontrado graças a amigos, como acontece com todas as casas com rendas abaixo de 800 euros.
Vivíamos bem. Pelo menos para um jovem casal a chegar aos 30, sem filhos nem grandes responsabilidades. Cada um com um ordenado capaz de pagar as contas e uns copos aos amigos – jantar fora à sexta-feira na tasca do bairro era o melhor bálsamo para semanas de trabalho intensas e com níveis de stress difíceis de gerir. Ele tratava da fatura da água, eu encarregava-me da próxima conta do supermercado, dividíamos a renda de casa e as nossas mães enchiam-nos o frigorífico com comida a mais sempre que podiam. Um equilíbrio natural que nenhum de nós suspeitou ver abalado.
As coisas mudaram numa quarta-feira à noite quando cheguei a casa com notícias de uma oferta de trabalho irrecusável, com direito a um aumento de quase três zeros e funções de chefia que implicavam mais horas de trabalho, mas também um novo reconhecimento. Os olhos do meu namorado mudaram à menção do valor que me tinham proposto, desdobrou-se em avisos de que "poderia ser demasiada responsabilidade e que eu não estava preparada" ou que "os bons ordenados pagos às mulheres quase sempre significavam sacrifícios noutras áreas da vida". Chamei-lhe repetidas vezes à atenção para a injustiça dos seus comentários. Ele não me ouviu, mas acabou por aceder a que eu aceitasse o trabalho – na verdade a minha decisão estava tomada, apenas esperava que o meu namorado estivesse tão entusiasmado quanto eu.
Os meses sucederam-se e as discussões também. A divisão das despesas passou a ser feita ao cêntimo com a ajuda de uma aplicação tão útil para evitar desequilíbrios no orçamento partilhado como para matar qualquer réstia de sex-appeal. Como se o nosso namoro estivesse reduzido aos 23,50 euros a mais que o meu namorado gastara em ração para o cão em março e a história de fevereiro se resumisse ao pack de poupança de papel higiénico que elevou o meu saldo a cinco euros positivos.

Sempre que eu tentava oferecer-lhe um jantar especial, ele insistia em pagar a parte dele, coisa que antes não acontecia, ou quando tentava marcar um fim de semana fora, torcia o nariz como se uns dias no Alentejo fossem tão caros como uma viagem a Nova Iorque. Recusava quase todos os meus presentes e criticava o meu novo guarda-roupa, agora renovado e com peças de melhor qualidade e design. O meu sucesso assustava-o de uma forma que não se replicava nas conversas com os seus amigos homens, a quem nunca elogiou ou, sequer mencionou, o meu novo emprego. Sempre que me atrasava a chegar a algum lado por causa de trabalho, passava os primeiros minutos a ignorar-me, amuado como uma criança, mesmo que estivéssemos acompanhados.
Um ano depois, estou tão feliz nas minhas novas funções como infeliz na minha relação de quase meia década. A aventura e a cumplicidade perderam-se, o meu namorado fechou-se em números e folhas de Excel para lidar com a inflação, ignorando o facto do meu ordenado dar perfeitamente para equilibrar as despesas fixas e ainda sobrar dinheiro para sair e ir de férias. Como se aceitar dinheiro de uma mulher o tornasse menos masculino. E, assim, passei eu a vê-lo com outros olhos: um homem com medo do futuro.

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