É irresistível chamar-lhe cidade-museu(s), não fossem eles uma das grandes apostas da cidade andaluza. Mas Málaga também é História, gastronomia, praia, natureza, tradição, novidade. Tudo embrulhado numa leveza que se entranha na pele, como o Sol que, ali, brilha 300 dias por ano.
Foto: D.R27 de maio de 2022 às 07:00 Nádia Freitas
Descrever Málaga em meia dúzia de linhas será uma tarefa tão impossível como conhecê-la a fundo em pouco mais de 48 horas, mas é mais do que suficiente para sucumbir ao encanto andaluz. É como uma daquelas pessoas de quem gostamos logo, à vista desarmada. Uma cidade que não precisa de um compasso de espera nem pede um tempo de habituação, a uma hora e meia de voo (a partir de Lisboa), pronta para consumir, sem reservas ou moderação. Alegre e vibrante, tem setas a apontar em vários sentidos e resposta pronta para todas as questões.
Senão veja-se. Gosta de História? Málaga foi fundada pelos fenícios, ocupada por gregos, cartagineses e romanos, foi domínio árabe até ser conquistada pelos reis católicos, já no século XV. Essa mescla cultural traduz-se no património, com vários pontos a merecerem visita obrigatória, mas respira-se na atmosfera, onde as diferentes influências nunca se atropelam, só se complementam.
Foto: D.R
Gosta de arte? Aqui encontra mais de trinta museus, todos parte integrante de uma estratégia turística que transformou um destino indistinto em capital cultural.
Gosta de praia? Na Costa do Sol, além dos prometidos 300 dias soalheiros, estão garantidos 160 km de praia, a começar pela La Malagueta (a que fica mais perto do centro). Depois, são obrigatórias as paragens na icónica Marbella ou na bonita Nerja, nem que seja só para rever o postal nostálgico e perfeito (como tantas memórias de infância), eternizado na série televisiva Verão Azul, transmitida pela RTP em 1982.
Gosta de Natureza? Em tempos já considerado um dos mais perigosos caminhos do mundo, o Caminito del Rey, está hoje envolto em regras de segurança, mas nem por isso perdeu encanto natural. Pelo contrário, continua a ser uma das grandes atrações da região da Andaluzia.
E, claro, a pergunta que nem se faz, mas que sempre se impõe quando o destino é Espanha: gosta de comer? Além das tapas, do azeite e dos enchidos de porco ibérico, há marisco e muito bom peixe fresco confecionado de mil e uma formas. Fica fácil perder as horas e saborear o momento, seja num dos mais recentes e cosmopolitas restaurantes da capital, seja nos chiringuitos (barraquinhas) ao pé da praia ou numa das mesas colocadas no exterior do Mercado Central de Atarazanas. Construído no século XIX, é ponto de peregrinação de locais e turistas. Uns vão comprar fruta fresca e vegetais (impossível não mencionar a enorme variedade de tomates, entre eles os azuis), outros vão admirar um dos símbolos arquitetónicos da cidade: o arco da entrada principal, original do estaleiro do século XIV, ali edificado por ordem do Rei Mohammed V. E se todas as perguntas forem ao lado, podemos sempre exagerar nas comparações e questionar: é fã de Antonio Banderas?
Natural da cidade, onde tem casa, o ator é um orgulhoso malaguenho que não só investe (detém, entre outros projetos, o Teatro del Soho Caixabank – onde, entre 11 e 22 de maio, Andrea Pietra e Ricardo Darín protagonizam Escenas de la Vida Conyugal), como veste as roupagens locais, saindo em peregrinação na Semana Santa, misturando-se com os muitos homens (e algumas, poucas, mulheres) que carregam os tronos com os santos e santas que, durante o resto do ano, vivem encerrados nas igrejas e conventos da cidade.
Foto: D.R
Profundamente religiosa, Málaga tem na sua catedral um expoente dessa fé. Templo do renascimento andaluz, foi construída sobre a Mesquita-Aljama, sendo hoje chamada La Manquita por permanecer inacabada. Recentemente, a população foi sondada, no sentido de se perceber qual seria a vontade dominante: se apostar no financiamento de uma nova obra, se deixá-la assim, perfeita na sua imperfeição. Ganhou a segunda hipótese, porventura por ser a que melhor representa esta cidade que, durante décadas, foi ponto de passagem, ignorada entre os encantos de Granada e a monumentalidade de Sevilha, depois capaz de se reinventar, fazendo das fragilidades os seus trunfos. Málaga terá defeitos, como a sua catedral, por isso mesmo é única.
Caminhar pelo centro histórico de Málaga é descobrir igrejas e muitos museus, mas também lojas, das mais genuínas às turísticas, com espaço para as grandes cadeias internacionais e deliciosas descobertas, como a gelataria Dimas Mira e Hijos que, inaugurada em 1890, é considerada a mais antiga de Málaga. Na Plaza de la Merced, que na época muçulmana era zona de mercado, encontramos a Casa Natal Picasso (museocasanatalpicasso.malaga.eu), local onde o pintor viveu em criança e em que é possível ficar a conhecer um pouco mais da sua história familiar, mas também observar fotografias antigas ou peças de época, como a toalha de linho bordada pela sua mãe, Maria Picasso. O Teatro Romano, descoberto em 1951, e a fortaleza árabe Alcazaba (alcazabamalaga.com), a mais bem preservada de Espanha, são dois dos locais mais visitados na cidade. A zona do porto, construído no século XVII, e reinventada há cerca de dez anos, também faz parte do itinerário da cidade, com um passeio marítimo animado por lojas e restaurantes, como o Gutierrez Puerto (gutierrezmalaga.es).
Destino turístico por excelência, a Costa do Sol sempre foi procurada pelas suas praias mediterrânicas. Mas, ao contrário de cidades como Sevilha ou Granada, Málaga era repetidamente ignorada. Não havia monumentos suficientes que justificassem uma visita ou uma identidade diferenciada a ponto de motivar um desvio. Em 2002 tudo começa a mudar: as autoridades malaguenhas sentem que precisam de inverter esse quadro e reinventar a cidade, alinhavando uma estratégia turística que reposiciona Málaga. O centro histórico fecha-se ao trânsito, com boa parte duas ruas a tornar-se, progressivamente, pedonal. No ano seguinte, inaugura o Museu Picasso, graças ao diálogo com a nora e o neto do pintor, natural da cidade, e que tinha deixado instruções bem claras sobre o local onde o museu deveria ser instalado.
O Palacio de Buenavista, do século XVI, exemplo da arquitetura andaluza, no centro histórico, acabou por ser o escolhido para albergar uma coleção alargada que reflete quase oito décadas de trabalho, atravessadas por diferentes fases e múltiplas técnicas (museopicassomalaga.org). Pioneiro e emblemático, o museu Picasso é incontornável, mas o top 5 museológico de Málaga não fica completo sem as visitas ao Centre Pompidou Málaga (centrepompidou-malaga.eu) onde acaba de inaugurar a exposição Um Tiempo Proprio, Liberarse de las Ataduras de lo Cotidiano (patente até 15 de Outubro) e que foi o primeiro a abrir portas fora de França. Nesse mesmo ano de 2015, inaugura também a sucursal do Museu Russo de São Peterburgo (coleccionmuseoruso.es), com exposições renovadas anualmente. A mais recente, encerrada em Abril, tinha curiosamente como tema Guerra Y Paz em El Arte Ruso, permanecendo por definir o próximo capítulo deste espaço. Obrigatórios, ainda, o Museu CarmenThyssen Malaga, dedicado à arte espanhola (carmenthyssenmalaga.org) e o Museu do Automóvel e da Moda (museoautomovilmalaga.com), sendo este o projeto de vida do português João Magalhães que, em Málaga, numa antiga fábrica de tabaco, encontrou espaço (e apoio) para concretizar o seu sonho.
Construído entre 1903 e 1905 no desfiladeiro de Gaitanes, o Caminito del Rey começou por ser "apenas" um trilho, esculpido na rocha para permitir as movimentações dos trabalhadores envolvidos na construção da barragem de El Chorro. Em 1921, é visitado pelo Rei Afonso XIII, sendo a partir desse momento (mais formal que especial), que conquista a designação pela qual passa a ser conhecido. Mas, hoje, o trilho, mais do que um caminho num cenário natural arrebatador, é uma das grandes atrações da Andaluzia. Basta levantar a cabeça para perceber o porquê. Depois de um período de declínio, marcado pela deterioração do caminho, mas também pelas mortes de turistas que visitavam o local, o percurso esteve encerrado, reinaugurando em 2015. A expetativa era tal que a Lonely Planet o incluiu numa lista de destinos obrigatórios para esse ano. Ainda o é em 2022. Entre história, natureza, fauna, flora, muito oxigénio e algumas vertigens, é um passeio inesquecível (muito seguro e bem mais tranquilo do que que as imagens podem sugerir). Indispensável é fazer a reserva em caminitodelrey.info, onde também é possível encontrar todas as informações sobre horários, preços e acessos.
Foto: D.R
COMER & BEBER
Passear em Málaga é descobrir uma tentação gastronómica em cada esquina. Além dos famosos boquerones, as mesas enchem-se de queijos, croquetas, ensaladas, empanadas, tortillas e os mais diversos peixes, quase sempre fritos ou panados. A ter de escolher uma única paragem (e correndo o risco de passar ao lado de grandes experiências), é quase consensual eleger El Pimpi como referência gastronómica, mas também cultural, porque é palco de recitais e espetáculos de flamenco (elpimpi.com). Fundado em 1971, esta bodega continua fiel à tradição e gastronomia locais e, apesar de constar em todos os roteiros turísticos, continua a merecer a presença de locais (o que, convenhamos, é sempre um bom sinal!).
Foto: D.R
Para almoçar ou tapear, o restaurante Los Mellizos é outra aposta segura, com destaque para as paellas e para o pescaito frito (losmellizos.net). Para um copo de vinho (com umas tapas a acompanhar), a Antigua Casa de Guardia, fundada em 1840 na Alameda Principal, é uma das paragens obrigatórias e um dos lugares mais genuínos da cidade, com as contas ainda a serem feitas como antigamente, marcadas a giz no balcão (antiguacasadeguardia.com).
PUB
Foto: D.R
ONDE FICAR
São muitas as possibilidades de alojamento, para diferentes orçamentos e perfis de viajante, com a oferta a acompanhar a curiosidade. Depois do início da pandemia já inauguraram cinco hotéis: um deles pertence ao grupo Only You e está instalado num dos mais icónicos edifícios da cidade, La Equitativa, bem perto da zona portuária e da importante artéria Marqués de Larios. É aí, no sétimo piso, que descobrimos o restaurante Lola. Com vista para o porto e para a cidade, presta homenagem à cozinha tradicional, sempre com base em produtos locais e da época, mas com aquela atraente pitada de modernidade (onlyyouhotels.com/en/hotels/only-you-hotel-malaga/). Para dormir com todo o conforto, destacamos o AC Hotel Malaga Palacio. Inaugurado na década de 1960, é um dos mais emblemáticos: pela localização privilegiada, pela história, pela qualidade do serviço, mas também pelo terraço a partir de onde se tem uma vista privilegiada (e abrangente) da cidade. Diárias a partir de €138. (marriott.pt/hotels/travel/agpmg-ac-hotel-malaga-palacio).
Foto: D.R
COMO IR
A TAP tem voos diários para Málaga com tarifas a partir dos €77 (só ida). www.flytap.com