Que marcas deixa o cancro da mama? Duas mulheres, dois corpos, a mesma vontade de viver
Inês e Beatriz estão ambas na casa dos 30 e a lutar contra o cancro da mama. Aqui, partilham as histórias que os seus corpos contam, entre medos e conquistas, fragilidades e esperanças. Veja o ensaio fotográfico, a propósito do Dia Nacional de Prevenção do Cancro da Mama, 30 de outubro.

Inês Klinesmith, 32 anos, 31 quando foi diagnosticada.
Como desconfiaste que poderias ter cancro?
Foi por acaso ao passar a mão na mama depois do banho.
Quando foi o diagnóstico?

Os exames começaram em setembro, o diagnóstico chegou em outubro de 2020.

Qual foi a primeira coisa que pensaste/sentiste?
"Como é que vou cuidar das pessoas à minha volta!?"

Quanto tempo passou até à operação?
Um mês, fui operada a 5 de novembro de 2020.

Que tratatamentos fizeste?

Cirurgia (lumpectomia), radioterapia e hormonoterapia (iniciada em dezembro 2020 e que durará +/- 10 anos a menos que os efeitos secundários sejam insuportáveis).
O que foi mais dificil?
Não saber o que esperar, não saber quando poderia voltar a trabalhar, voltar à minha vida ativa, e não saber quais as consequências permanentes. Não poder ter ninguém presente nas consultas e exames de diagnóstico devido à pandemia - foi um bocado isolador.
E mais fácil?

Saber que lá fora tinha o apoio da minha família, namorada e amigos.
Qual era a expetativa vs a realidade que acabou por acontecer?
Expetativa: recuperação (mais) rápida que tudo (pós-operatório e radioterapia). Realidade: ainda não estou recuperada físicamente, ainda não consegui voltar à minha vida/atividade antes do cancro.
Qual era o teu maior medo?

Sempre foi - quando é que isto vai voltar? E se voltar o que é que acontece?

Como arranjas força todos os dias?
Viver é uma surpresa e luta constante para todos. Ainda assim, tenho vontade de acordar todos os dias e aproveitar ao máximo (seja trabalhando, nos meus hobbies ou a relaxar). Aprendi a relaxar, a descansar durante o processo da doença.

O que é mais difícil, hoje?
Fazer exercício, fazer planos. Voltar ao exercício porque me falta, e porque ainda não tenho a mobilidade que tinha no braço/ombro direito, fazer planos porque nunca sei se vou estar capaz e não quero cancelar e desapontar as pessoas.
Como foi a reação da tua parceira?
Difícil, talvez até mais do que a minha. Ficou revoltada e preocupada. Eu sempre encarei tudo com mais tranquilidade.

Como é voltar à intimidade sexual?
Devagarinho. São muitas dores físicas e complexos que se vão metendo no meio. Deixei de confiar no meu corpo e isso tem impacto na minha forma de estar.
O que é que ninguém te contou sobre a doença?
Acho que me contaram tudo o que necessitava de saber, mas cada caso é um caso e cada paciente também, logo a maneira como experienciamos a doença é inevitavelmente diferente e não há ninguém que nos possa preparar para todas as emoções pelas quais passamos.
Qual era a pergunta que gostavas que te fizessem?
Não sei, todas. Nenhuma pergunta me assusta.

Qual é a pergunta para a qual não tens resposta?
O cancro vai voltar?
Como se vence o medo?
Acho que não se vence, aprende-se a lidar com ele, a integrá-lo nas nossas vidas, no dia-a-dia.
Qual era a coisa que gostavas de dizer a uma mulher que descobrisse agora a doença?
É difícil, mas és mais forte do que pensas. Tens o meu apoio e ajuda.
Qual é o pensamento que manténs presente?
Que quero aproveitar a minha vida, continuar a experenciar o mundo e a espalhar empatia. A vida não é uma competição.

Beatriz Viegas, 34 anos.
Como desconfiaste que poderias ter cancro?
Senti um pequeno nódulo durante a apalpação que me levou a fazer exames complementares.
Qual foi o diagnóstico?
Carcinoma invasivo, grau 2 aka cancro de mama , sem tipo definido.
Qual foi a primeira coisa que pensaste/sentiste?
Como é que vou tratar isto com o país em pleno colapso (vivia-se a pandemia a 1000% na altura )
Quanto tempo passou até à operação?
No dia em que soube que era cancro, marquei logo a cirurgia e uma semana depois fui operada.

Que tratatamentos fizeste?
Cirurgia para retirar o tumor, quimioterapia 16 sessões, radioterapia 20 sessões e agora terei de fazer hormonoterapia durante 5 anos.
O que foi mais dificil?
A hormonoterapia. Os efeitos são mais persistentes. Na quimioterapia tens muita medicação para controle dos sintomas. Na hormonoterapia, tens de aprender a viver com eles.
E mais fácil?
A radioterapia.
Qual era a expetativa vs a realidade que acabou por acontecer?
Pensava que tudo seria horrível e que a vida iria ser muito complicada com um cancro, mas afinal até correu bem e tentei o meu melhor para minimizar os efeitos.

Qual era o teu maior medo?
Ficar dependente fisicamente de alguém.
Como arranjas forças todos os dias?
Tento manter a sanidade mental: agradeço, relativizo, tento manter a mente ocupada com coisas do bem e para o bem.
O que é mais difícil, hoje?
Exercício, a hormonoterapia deixa-me um bocado limitada nos movimentos. É um dos efeitos secundários.

Como foi a reação do teu parceiro?
Sempre presente. Fez de tudo para minimizar os efeitos dos tratamentos e sempre em prol da calma e não da ansiedade.
Como é voltar à intimidade sexual?
É um work in progress. Ha muitos efeitos secundários físicos e psicológicos por ultrapassar.
O que é que ninguém te contou sobre a doença?
Muitas coisas. Há pouca informação sobre como manter a qualidade de vida com um cancro. Áreas tais como alimentação, exercício, cosmética.

Qual era a pergunta que gostavas que te fizessem?
É possível ser feliz mesmo com cancro? Sim. O cancro não me define.
Como se vence o medo?
Equipa-se com armas do "bem": gratidão, calma, positivismo, esperança, amor.
Qual era a coisa que gostavas de dizer a uma mulher que descobrisse agora a sua doença?
Que primeiro que tudo ela é uma mulher e cancro não a define. Que não deve nunca perder a sua identidade por causa de um cancro.
Qual é o pensamento que manténs presente?
Que eu sou a mesma agora e sempre. Com uma dose de químicos no sangue, mas a mesma.
Fotografia: Inês Costa Monteiro
Maquilhagem: Catarina Serrano

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