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O meu primeiro date do Tinder levou-me ao Ramiro e aprendi que nem tudo o que reluz é ouro

Foto: IMDB
03 de novembro de 2022 às 07:00 Maria Pestana

Volvidos os primeiros dias que confirmam a aprovação e o interesse de ambos, combinámos conhecer-nos. "Sei que é cedo, mas já estou praticamente despachado. Posso ir buscar-te? Bebemos um copo antes". Meia hora depois descia as escadas a correr, parava diante da terrível porta verde da entrada do prédio, desejava que não me batesse à saída, ajeitava o cabelo e dava um último suspiro. Tinha-me enfrascado em Chanel Mademoiselle porque, coincidência das coincidências, era o seu perfume preferido e sentia-me confiante. Dois dias antes tínhamos dado match no Tinder, falado freneticamente sobre todas as questões fundamentais do amor no século XXI (e na Era de quem não tem tempo a perder, vá-se lá saber porquê) e tudo consenti. "Fazes sexo no primeiro encontro?", "Que tipo de lingerie usas?", "Depilas-te toda?". Somente quando me pediu uma nude respondi: "O que seria!", mas acabei por lhe enviar uma selfie tirada depois do banho, apenas com um roupão turco vestido. Ambos concordámos que era um ato de verdadeira coragem, não só estava despida por baixo como tinha o rosto lavado de qualquer maquilhagem. 

Assim que abri a porta soltou um "Olá, jeitosa!", com um tom nasalado que confirmava as minhas suspeitas. Estava perante um rapaz educado - e, possivelmente, bem na vida - e pareceu-me tudo bem. Era o meu primeiro encontro do Tinder e nem queria acreditar que me tinha saído a sorte grande logo à primeira. Entrei, dei-lhe um beijo na bochecha e olhei-o de soslaio para parecer misteriosa. "Ainda é um bocado cedo, mas já tenho fome. Não sei se estás a pensar no mesmo que eu?". Eu não estava a pensar em nada, não conseguia, ainda estava fixada nos olhos verdes e no sorriso que me atormentava há alguns dias. "Podíamos ir ao Ramiro, petiscávamos algo. O que achas?". "Parece-me bem", respondi casualmente, disfarçando o entusiasmo, quando por dentro batia palmas. A verdade é que nunca antes tinha estado no Ramiro.

À chegada percebi rapidamente que era habitual da casa - entre a rapidez com que nos sentámos e a forma como tratava os empregados por "amigo" não existiram dúvidas. Já sentada revirei os olhos e questionei quantos mais "amigos" aguentaria até o lanche ajantarado terminar. Posso adiantar que foram muitos, mas o álcool aligeirou quase todos. Não fui esquisita, deixei-o pedir: presunto, gambas, amêijoas e um bom vinho para começar. A conversa foi-se desenrolando e, em meia hora, percebi que estava perante o parente pobre - mas zero pobre -, de uma das famílias mais ricas da capital. Enquanto me contava os parentescos, que começaram com um "eu não costumo contar isto, mas percebi que trabalhaste para fulano tal", entornou um copo de vinho sobre a mesa que me molhou, pedindo desculpas de imediato, ligeiramente nervoso. À segunda, respondi: "já percebi que me queres despir, mas não precisas de desperdiçar mais vinho, por favor". Rimos. A química era óbvia.

No fim do jantar alguém põe sobre a mesa uma pequena coluna e uma música romântica parola começa a tocar. "Vocês fazem um casal tão bonito", disse a nossa vizinha de mesa, claramente alcoolizada. "Não pude parar de reparar em vocês! Nota-se mesmo que estão apaixonados". "Quanto é que lhe pagaste para dizer isto?", perguntei descaradamente. Todos rimos, mas se estávamos interessados antes, agora a parada tinha subido e queríamos ir embora rapidamente. Ele pede a conta e o empregado chega. Depois, puxa pelo casaco e diz que deve ter deixado a carteira no carro, congelei por uns segundos. "Sacana de um raio!" pensei, mas de imediato pergunta se pode pagar com MBway. "Pode, sim, senhor!", e eu que sou zero adepta de tecnologias e aplicações, naquele dia, agradecia pela segunda vez.

Quando chegámos ao carro comentei que ainda tinha as calças todas encharcadas de vinho, dando-lhe pretexto para que me tocasse, como fez de bom grado. Ficámos à porta de minha casa enrolados um no outro durante um bom par de horas, interrompidos ora pela amiga que queria tirar o carro e não conseguia, ora pela recolha do lixo, ora pelos senhores que lavavam a rua. "Mas que porra se passa nesta rua hoje? É a gaja que não consegue tirar o carro, são os tipos do lixo, agora vêm lavar a rua também? F*da-se!", barafustava em tom de brincadeira. Combinámos que não subiria nesse dia, mas que regressaria no dia seguinte. "Amanhã, subo, ai se subo! Agora, pira-te que não te aguento mais". Não me recordo de alguma vez ter subido as escadas até ao terceiro andar com um ar tão triunfante. Tinha acabado de ter o date perfeito, com o primeiro tipo que sacara no Tinder! Ora, se alguma entidade divina existia, estava ali a prova.

As 24 horas seguintes, menos até, foram um desassossego total. Queria-o tanto quanto ele me queria a mim. Não me recordo de ter feito nada de útil nesse dia, muito menos trabalhar. Quando bateram as 19h00 já estava sentada na sala há pelo menos uma hora, à espera ansiosamente. Abri a porta com euforia, fui carregada ao colo até ao quarto, deitada na cama e bom… passado algum tempo, quando claramente nada se passava, eis que ele lança inesperadamente a questão: "Sabias que os homens podem ter disfunção erétil em qualquer idade?".

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