Crónica Dating em Lisboa

O melhor do teletrabalho é dar para incluir sexo na agenda

Your Place or Mine (2023).
Your Place or Mine (2023). Foto: Netflix
22 de fevereiro de 2023 Maria Pestana

Nada como ter um homem à procura de um preservativo perdido (sim, dentro da vagina) para entender as maravilhas do sexo casual. "É esta coisinha que sinto aqui?", perguntou, com um ar cirúrgico. "Sim…", respondi de pernas abertas enquanto tentava conter uma enorme gargalhada. "Ah, espera aí… Vou ter de meter mais um dedo", foi a gota de água para nos desmancharmos a rir. Já deitados, lado a lado, depois de me pedir um minuto para recuperar o fôlego - ou seja, a tesão -, aproveitou o pretexto para me perguntar o que gostava na cama. Afinal, era a primeira vez que fazíamos sexo. "Bom, o básico, gosto que me lambam os mamilos, que me beijem as coxas antes de me fazerem sexo oral e gosto que me f***** por trás, com uma almofada debaixo da cintura, para me poder tocar, mas os mamilos são um bom ponto de partida", expliquei. "Ya, eu também gosto!". "Do quê?", perguntei. "Que me lambam os mamilos… podias lamber agora", pediu com a maior das tranquilidades. Levantei a sobrancelha, segurei o riso mais uma vez e avancei, mas chegada ao mamilo não aguentei. Pousei a cabeça no peito dele e desatei a rir. "Oh, Maria, por amor de Deus, és impossível. O que é que tem?", perguntou, a rir. "Não tem nada! Eu consigo!", declarei, convicta, e depois de várias tentativas falhadas devido a ataques de riso dei por mim, numa banal tarde de segunda-feira, em que estava em teletrabalho, a lamber os mamilos a um tipo.  

Conheci o Salvador numa daquelas situações de diz-que-disse. Enquanto navegava no Instagram deparei-me com uma fotografia de família de uma conhecida do trabalho e reparei que tinha um irmão giríssimo. Num dia ao almoço comentei com uma amiga, essa amiga comenta com ela, que comenta com o irmão, e fez-se o arranjinho, que só demorou coisa de um ano e meio, dois anos, para acontecer. Aliás, o Salvador, para não levantar suspeitas e parecer despercebido, demorou uns três meses a adicionar-me no Instagram. Eu adicionei de volta, por simpatia, e fiz de conta que não pensei mais no assunto. O primeiro contacto surgiu de forma casual, ele publicou uma história de um pôr-do-sol na linha de Cascais, eu dei "gosto" por conhecer bem o sítio e ele aproveitou para iniciar conversa. Passados uns dias, explicou-me que se ia mudar para Madrid no final do ano, para acabar o MBA, e que não fazia sentido conhecer-me porque queria ir livre. "Tu és daquelas miúdas que quer um namorado e eu não posso ser isso agora, daqui a dois meses vou-me embora e depois é uma dor de cabeça", explicou. Gostei da frontalidade, embora o tenha achado um pouco ingénuo. E se eu quisesse apenas sexo? "Mas não queres, eu sei que não queres". O assunto ficou por ali. Ele tinha razão e não neguei.

Um ano depois voltou às investidas. Regressado a Lisboa, aproveitou o início do verão para se voltar a fazer notar. Um gosto aqui, um coração acolá, umas labaredas pelo meio até que, por fim, me enviou uma mensagem. Falámos umas quantas vezes, combinámos ir beber um copo, mas à última cancelou com a desculpa de um imprevisto qualquer. A situação foi-se arrastando, sempre com desencontros de agenda ou com acontecimentos inesperados a adiar o nosso encontro. Já farta da situação, uma noite preparava-me para encomendar jantar quando decidi fazer-lhe o convite. "Vou mandar vir jantar. Mando vir para um ou para dois?". Minutos depois estava sentado no meu sofá a contar-me finalmente tudo sobre a sua vida. Lidava com questões de ansiedade e tinha tido uma infância complexa que o marcara muito. Cresceu lá fora, sem pouso durante alguns anos, devido ao trabalho do pai. Quando tinha 16 anos, os pais divorciaram de forma feia, depois de uma traição por parte do pai e a mãe entrou numa depressão profunda, ficando um ano de cama. "Nesse ano, eu era puto e o meu pai dava-me imenso dinheiro, levava os meus amigos lá para casa, fumávamos, bebíamos, perdi-me um bocado", explicou. Ouvi tudo atentamente e sem fazer grandes comentários, até que, completamente ingénua e desbocada, afirmei: "Bem, que grande egoísta, a tua mãe". Ele ergueu os olhos na minha direção surpreendido. "Desculpa, acredito que ela tenha feito o melhor que pôde, obviamente, mas tu precisavas dela e ela demitiu-se do papel de mãe durante um ano". "Sim, mas ela estava triste, é natural", disse. Eu, não satisfeita, continuei: "Sim, mas passado um ano ela acorda para a vida, apaixona-se outra vez e volta a ficar bem e tu ficaste no lodo. O problema das mulheres ricas é este, podem dar-se a estes luxos. Achas que a minha mãe poderia ficar um ano de cama só porque o meu pai a traiu? Não. Ela teria de se levantar, ir trabalhar todos os dias para meter comida na mesa e lidar com a depressão na mesma". "Nunca tinha pensado nisso dessa perspetiva", concluiu, e eu nada mais acrescentei, mas rapidamente aprendi que não se devem tecer comentários destes sobre possíveis futuras sogras sobre pena de nunca o chegarem a ser.

Nessa noite, saiu de minha casa sem que nenhum envolvimento tivesse acontecido e, enquanto subia a rua para apanhar o Uber, enviou-me uma mensagem a dizer que, efetivamente, se sentia muito atraído por mim, mas que não se imaginava a ter um relacionamento comigo. Supus que não, igualmente, dada a minha completa frontalidade. Expliquei que não havia qualquer questão, que podíamos ser só amigos e despedimo-nos cordialmente. Uns dias mais tarde, enquanto aproveitava a minha hora de almoço para despachar uns afazeres no Chiado recebi uma mensagem do Salvador: "Maria, quero fazer-te uma proposta, acho que vais dizer que não, mas pronto. Não me vejo a ter uma relação contigo, mas se quiseres algo casual estou disponível". Debatemos alguns temas, nomeadamente por que raio não se imaginava a ter uma relação comigo – algo que nunca conseguiu realmente explicar, ficando-se sempre pelo: "Porque é algo que eu percebo logo quando conheço uma miúda" -, e apontou que nem tinha grandes expectativas em relação ao sexo comigo porque, na sua ótica, eu era demasiado bonita para ser boa na cama – Whaaat? Desconhecia que isto fosse um tema no universo masculino, mas fiquei tentada em provar o contrário. Perguntei-lhe o que fazia naquele momento. "Estou em casa", respondeu. "Ok, tens 30 minutos para chegar a minha casa, estou com pouco trabalho, bora f****", afirmei para meu espanto e do Salvador, que perguntou várias vezes se falava a sério. Quando finalmente percebeu que sim, indagou se tinha algum requisito especial ao nível da depilação. "Não, somos adultos, deixa os pelos", descansei-o, mas à chegada confessou-me que se tinha aparado um bocadinho na mesma.

O Salvador animou os meus dias de teletrabalho durante algumas semanas. Geralmente aparecia depois de lhe enviar alguma mensagem a pedir para requisitar os seus serviços. Como bom prestador dava-se ao esforço de cumprir com o acordo, mesmo quando não tinha muito tempo. "Tenho um voo às 15h00, e ainda tenho de ir ao ginásio. Tenho menos de uma hora", e em menos de uma hora esforçava-se bastante para me deixar satisfeita. Um dia, disse-me que não conseguia aparecer e percebi que tínhamos chegado ao prazo de validade da sua disponibilidade. "Conheci uma miúda e estou a sério com ela", acabou por confessar. "Ok, desejo-vos felicidades", mas na verdade chorei de desgosto, porque se comprometia com outra e não comigo. Porém, rapidamente voltei a ter notícias do Salvador que, em menos de dois meses, queria retomar o nosso acordo. Agradeci a preferência, mas respondi que desta vez teria de negar. "Compreendo, queremos coisas diferentes", retorquiu. "Não acho que queiramos coisas diferentes, acho que queremos exatamente o mesmo, tu é que não estás pronto para o admitir". Nunca me respondeu e, como quem cala consente, acreditei estar certa na minha análise. De facto, o sexo não tem nada de complicado, as pessoas é que o são.  

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