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Deus veste Primark

"Eu estava à bancada da cozinha a tirar um café na máquina do anúncio do George Clooney — esse Deus para muitas pessoas, mas não para mim — e senti a presença d’Ele nas minhas costas."

Foto: Akiane Kramarik a pintar "Prince of Peace" aos 8 anos. @akianeart
30 de dezembro de 2021 às 11:11 Cláudia Lucas Chéu

Se o Diabo e alguns Papas vestem Prada, Deus veste Primark (ou alguma marca equivalente). Não digo que Deus vai nu, porque isso é coisa de rei mundano e Ele — como os anjos — não tem nudez física para mostrar ao mundo. Imagino que, caso Ele exista, Deus vai nu por dentro. Aquele que nem precisa de artigo definido para ser nomeado, veste qualquer trapinho e pronto. Vaidade e esbanjamento são coisas que não lhe assistem.

Há tempos sonhei com Deus, foi a primeira vez que me aconteceu. Sou agnóstica e custa entender o significado deste sonho. Eu estava à bancada da cozinha a tirar um café na máquina do anúncio do George Clooney — esse Deus para muitas pessoas, mas não para mim — e senti a presença d’Ele nas minhas costas. Tive uma sensação incrível de espanto e de medo. E a certeza absoluta de que era Ele, mesmo sem o ver. Contudo, não fui capaz de me virar. Não tive coragem. Senti medo de Deus. Será que isto aconteceu porque apenas li o primeiro capítulo da Bíblia, a Génese?

Nesse capítulo do livro dos livros ficamos logo elucidados: Deus pune os que Lhe desobedecem. Deus atemoriza. Mas não foi este tipo de medo que senti no meu sonho. Eu não lhe desobedeci, não havia nada para ser punida, simplesmente não me virei para o ver. O meu medo foi o de confirmar a Sua existência, tive receio de ter a certeza. Quão bizarra pode ser a nossa cabeça durante os sonhos? Acordei arrependida. Tão arrependida por não me ter virado no sonho.

Podia ter visto o rosto de Deus em vez de ter ficado a observar esse acto quotidiano do café a cair na chávena. Podia ter confirmado se o Deus dos nossos tempos veste Primark — como suponho que possa ser — ou alguma indumentária de linho ecológica que respeite o planeta e os trabalhadores que a fazem. Estou certa de que Deus nunca vestiria algo de luxo. Vou ter de esperar por um próximo sonho com Ele para ver. Prometi a mesma que me virarei para o conhecer. 

*A cronista escreve de acordo com o Acordo Ortográfico de 1990. 

Há tempos sonhei com Deus, foi a primeira vez que me aconteceu. Sou agnóstica e custa entender o significado deste sonho. Eu estava à bancada da cozinha a tirar um café na máquina do anúncio do George Clooney — esse Deus para muitas pessoas, mas não para mim — e senti a presença d’Ele nas minhas costas. Tive uma sensação incrível de espanto e de medo. E a certeza absoluta de que era Ele, mesmo sem o ver. Contudo, não fui capaz de me virar. Não tive coragem. Senti medo de Deus. Será que isto aconteceu porque apenas li o primeiro capítulo da Bíblia, a Génese?

Nesse capítulo do livro dos livros ficamos logo elucidados: Deus pune os que Lhe desobedecem. Deus atemoriza. Mas não foi este tipo de medo que senti no meu sonho. Eu não lhe desobedeci, não havia nada para ser punida, simplesmente não me virei para o ver. O meu medo foi o de confirmar a Sua existência, tive receio de ter a certeza. Quão bizarra pode ser a nossa cabeça durante os sonhos? Acordei arrependida. Tão arrependida por não me ter virado no sonho.

Podia ter visto o rosto de Deus em vez de ter ficado a observar esse acto quotidiano do café a cair na chávena. Podia ter confirmado se o Deus dos nossos tempos veste Primark — como suponho que possa ser — ou alguma indumentária de linho ecológica que respeite o planeta e os trabalhadores que a fazem. Estou certa de que Deus nunca vestiria algo de luxo. Vou ter de esperar por um próximo sonho com Ele para ver. Prometi a mesma que me virarei para o conhecer. 

*A cronista escreve de acordo com o Acordo Ortográfico de 1990. 

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