
A simpatia pode ser tudo, natural ou artificial, é um óleo fantástico que mantém a máquina social em movimento, faz-nos viver melhor juntos. Já que somos cada vez mais, o que é uma péssima notícia, e cada vez mais diferentes, o que é uma boa notícia. A simpatia é cordial, agradável, polida, diplomática. Normalmente é também mais comum, ainda que não tanto como desejaríamos, mas digamos que é a primeira camada da empatia, e é por isso muito mais ágil, ainda que para alguns seja ainda um esforço, mas também muito menos sincera, porque é mais fácil de fingir.
Há pessoas que têm o dom natural para agradar, cresceram em famílias e escolas que o trabalharam, que o ensinaram ou que o exigiram. A simpatia é um ótimo cartão de visita: inócuo, mas gentil, mesmo quando só devolve silêncio. Um óleo social perfumado e civilizador. E é uma ótima forma de contornar ou suavizar problemas quando tudo o resto não funciona. A simpatia é um músculo treinado para saltar, a todo o momento em que seja solicitado, bonito quando espontâneo, um pouco perverso quando convém. A simpatia pode ser bastante artificial. Quando é devidamente treinada, a simpatia aponta para os alvos certos, nas doses certas, mistura-se até com o charme, a sedução, o enlevo. É uma ótima arma de manipulação quando bem manuseada, para depois se transformar em indiferença quando se consegue o que se quer. É tão boa a chegar como a sair.

O lado bom é que se nota a simpatia quando é funcional, um dia revela-se e torna-se evidente, mesmo para a grande massa dos desatentos. O lado mau é que pode ser tarde demais para percebermos que fomos usados. Gostava de não dizer isto, mas as mulheres aperfeiçoaram, ao longo dos séculos, por razões óbvias, este tipo de simpatia. Para passarem despercebidas, porque era isso que delas se esperavam, mas também para jogar ardilosamente, porque foi o que lhes restava. E é o que ainda lhes resta, na maioria do mundo. Por isso, só deixará de existir quando as miúdas perceberem que não haverá igualdade de género enquanto prevalecerem – em ambas as partes – os maus hábitos desnivelados do passado.
A empatia é outra coisa, é o degrau seguinte, é pôr-se nos sapatos, até na pele do outro, e sentir as suas hesitações e fragilidades, dores e alegrias. Existem algumas pessoas empáticas, que até não são particularmente simpáticas na acepção mais corrente, porque são reservadas ou tímidas, mas são as mais raras e as mais admiráveis. São, no entanto, muito menos reconhecidas e até amadas, mas quando são, a impressão que deixam é mais duradoura.
O trabalho da empatia é mais invisível, é também mais profundo, fundamental e fundador. Enquanto o simpático pode ser um bailarino social, o empático é um humanista, é o que sente através do outro, o que cuida, se necessário for. A sociedade valoriza a simpatia tanto como se esquece da empatia. A simpatia serve o status social, a empatia serve apenas a generosidade, a bondade, se quisermos, não devolve nada. Da mesma forma que parece admirar-se mais os espertos do que os inteligentes, os sonsos do que os desbocados, a empatia é muitas vezes tomada como coisa de bonzinho, e na ignorância generalizada do mundo, os bonzinhos ainda são vistos como tótós, os otários.

Assim, para a maioria, continua a valer mais ser simpático do que empático, é muito mais cómodo e dá muitíssimo menos trabalho. As pessoas adoram pessoas que concordam, que sorriem muito, mesmo que vazias, as que nunca levantam questões ou lançam debates. Vale mais socialmente um calado ou ausente, do que um diligente opinativo. Ninguém gosta de ser confrontado com a fragilidade, mesmo que não seja sua. O "vai ficar tudo bem" é o consolo possível num mundo à beira de um ataque de nervos. É mais desafiante debater porque chegámos aqui, até porque podemos ter de desafiar os nossos próprios umbigos.
Nos tempos submissos e politicamente corretos que vivemos, nunca foi tão postiça a simpatia. Até porque agora não se pode dizer nada sem que alguém diga que "depende" ou entre a matar numa simplificação qualquer. Eram mais desafiadoras as modelos dos anos 80 e 90, muitas delas fora da caixa, estranhas, do que são agora as celebridades-modelo do agrado. O artificialismo continua a valer, por muitas tendências terra-a-terra que se apregoem, por muitas buscas pela sustentabilidade ambiental e social, ou pelo despojamento nórdico, e a modernidade humanista que lhe subjaz e que se espelha na modernidade das sociedades escandinavas. O corta-mato do faz de conta será sempre o mais apetecível e o que menos compromete. Como escreveu Oscar Wilde: "A perfeita cortesia é também uma forma de indiferença".
E numa era que precisa de encontrar os seus heróis e as suas causas prioritárias e suavizar o pessimismo e cinismo desacreditados das novas gerações, a empatia é fundamental. Vejam-se as manifestações jovens pela emergência climática: sem movimentos de grupo, e sem um pouco de refilice, não se vai a lado nenhum. É aquela velha história da árvore, que é muito mais forte e saudável na floresta do que abandonada num qualquer ermo ventoso. A nova geração herdou um tempo que a faz perder o medo de dizer mesmo o que pensa. Até passou a ser cool ser do contra, o que é uma grande maravilha. Não nos podemos esquecer que a meia dúzia de malucos de hoje são os visionários de amanhã. E é sempre assim que o mundo muda e avança. Se nem sempre a sorte protege os audazes, porque a sociedade os condena, o tempo dá-lhes sempre razão. Os audazes são os empáticos, os que se põem na pele de todos.

O verniz social ou a arte milenar do faz de conta
A maior parte das pessoas esconde-se atrás dos cortinados, é tão português ficar atrás dos cortinados a espreitar para a vida dos outros sem que deixem vislumbrar a sua. É uma herança rural, da ditadura e da igreja, claro, tão sul da Europa. Mas se o pudor é bonito, a honestidade é sexy.