Kate Winslet: “Mare of Easttown é um sonho para qualquer atriz de meia-idade”

Neste aguardado regresso às séries HBO, Winslet é uma detective à beira de uma crise pessoal e com um crime estranho por resolver. Um papel “como nenhum outro que já fiz,” diz, nesta entrevista exclusiva.

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19 de abril de 2021 às 20:17 Máxima

Uma pequena cidade dos Estados Unidos e um elenco de personagens a lidar com a tragédia – pessoal e coletiva –  após o desaparecimento de uma jovem da terra. Mare of Easttown, já disponível na HBO, é mais uma oportunidade para Kate Winslet mostrar que é uma das melhores atrizes da sua geração, mas também um estudo detalhado sobre a classe média norte-americana, a dinâmica das pequenas localidades e a fatalidade que é viver no passado e no arrependimento. Conversa com a atriz, de 45 anos, que em 2020 vimos em Ammonite (ainda sem data de estreia em Portugal) e que em breve veremos como Lee Miller, a modelo e fotógrafa norte-americana que se tornou correspondente de guerra.

Foto: D.R.
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  Como surgiu o papel em Mare of Easttown?

Na verdade, foi uma altura bizarra. Estávamos em setembro de 2018, estava a filmar no Reino Unido e no espaço de um mês enviaram-me o guião para Ammonite e os episódios um e dois de Mare of Easttown. Acabei por aceitar estes dois grandes e incríveis trabalhos. Estava muito, muito entusiasmada por trabalhar novamente com a HBO - tinha feito o Mildred Pierce com eles e tive uma experiência realmente espantosa. Li o guião e honestamente achei um sonho para qualquer atriz de meia-idade. Na verdade, odeio essa expressão, mas agora tenho 45 anos. Já não tenho 20. E quando li Mare of Easttown, soube o quão sortuda era por me ter sido pedido para ler [um argumento] que poderia ter sido oferecido a uma atriz americana, por exemplo. A escrita era absolutamente real e maravilhosa e... Senti-me eu própria a dizer aquelas palavras. Isso é sempre um verdadeiro indicador para mim: leio sempre excertos em voz alta quando estou a ler um guião e vou brincando - digo ao meu filho ou filha, "vem cá ler rapidamente esta cena comigo". E depois tenho aquela sensação de "Ooh, isto pode ser bom. Isto pode ser bom". Com Mare of Easttown tive imediatamente essa sensação. Por isso, inicialmente senti-me lisonjeada por ter recebido a proposta, mas também fui conquistada pelos desafios que esta me traria.

Que desafios foram esses?

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Esta é uma série filmada no Delaware, fora da Filadélfia, na Pensilvânia. É passada num país diferente do meu e é uma personagem totalmente diferente para mim ou de qualquer coisa que eu já tenha feito antes. Eu nunca tinha sequer estado no condado de Delaware antes de fazer este projeto. Há um dialeto muito específico que as pessoas têm de Delco, e esse foi outro fator importante para mim - tipo, oh meu Deus, tenho mais uma vez de aprender outro sotaque americano, completamente diferente! Adoro fazer sotaques, mas este é particularmente complicado.

Foto: D.R.

Quem é Mare Sheehan?

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É a personagem que tem sido o pilar da comunidade por muitos anos. É uma sargento detetive - uma boa sargento detetive – que segue o caso de uma rapariga que desapareceu um ano antes, Katie Bailey, com vinte e poucos anos. Katie era filha de outra mulher local, que é uma velha amiga de Mare. Toda a gente conhece toda a gente em Easttown, por isso todos os olhos têm estado em Mare, para encontrar Katie - e ela ainda não o conseguiu. Eles não sabem se ela está viva ou morta, ou o que lhe aconteceu. Eles não fazem ideia. Além disso, aos 16 anos de idade, Mare foi responsável por fazer um lançamento vencedor num campeonato nacional de basquetebol feminino. É um símbolo, uma tentativa de fama para a cidade. E todos os anos há uma cerimónia por volta da altura em que se deu este grande acontecimento, há 25 anos. Mare é mantida num pedestal em diante da cidade e todos a saúdam como uma grande heroína, mas ela não se sente nada disso. Metade do tempo, ela só se quer desaparecer, mas tem de continuar.

Foto: D.R.

De que trata a história, tanto em termos de enredo como de tema?

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Bem, trata-se de um assassinato numa pequena cidade, e há um momento de suspense no final de cada hora. Fiquei agarrada episódio após episódio - aquela coisa maravilhosa que é suposto sentirmos quando assistimos a um drama sobre um homicídio, e eles estão a tentar encontrar o assassino... O "quem-foi" de toda a série é absolutamente convincente. Achei que esta era uma história muito inteligente dentro deste género. Só que não se trata apenas de uma história de crime. Na verdade, fala mais sobre sentido de comunidade, misericórdia, compaixão e tristeza; e como as pessoas reais vivem e lidam com situações reais, e como essas situações reais nem sempre são felizes. Podem ser muito desafiantes. A dinâmica familiar pode-se alterar e mudar com base em algo que pode ter acontecido no passado ou algo que está a acontecer no presente.

A Mare é uma ex-atleta e polícia. Como é que se preparou fisicamente para o papel?

Sabia que ia ser um enorme desafio. Foi uma filmagem enorme. Estávamos com 124 dias de gravações e a covid parou-nos mesmo a meio. Interpretei esta personagem durante bem mais de um ano, com mais cinco meses de preparação. Tive de me manter em muito boa forma. Não porque tínhamos necessariamente de ver um corpo em forma ou algo do género, mas apenas porque tive de correr muito nas filmagens. Tive de enfrentar, lutar, desafiar e prender pessoas, levando homens enormes e adultos para o chão. Além disso, por causa da duração das filmagens, tive de me portar constantemente como um atleta em treino para alguma coisa. Isso não significa que estivesse realmente a treinar fisicamente, mas fiz muitos passeios longos de bicicleta, tentei pedalar 20 km por dia ou coisa parecida. Quero dizer, nada de importante, na verdade não demora assim tanto tempo! Mas, eu tinha simplesmente de estar saudável e manter-me assim. Queria mostrar que ela já tinha sido forte na sua juventude, mas que agora as coisas não eram necessariamente assim. Não queria fazê-la parecer sobrehumana aos 40 e poucos anos de idade. A maioria das mulheres não o é - fazemos o que podemos no meio do malabarismo de tudo o resto. Por isso eu também queria mostrar isso em relação a esta geração. Para mim, era importante manter-me bem de forma a conseguir ultrapassar a rodagem porque o trabalho era exigente.

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Foto: D.R.

Que pesquisa fez?

Passei muito tempo com o verdadeiro departamento de polícia de Easttown e o município de Marple, pois estão mesmo ao lado um do outro. Houve um conjunto de sargentos detetives e polícias que me ajudaram muito, especialmente uma em particular, chamada Christine Blaylor. Ela é como um foguete, uma pequenina, extraordinária e feroz, sargento detetive. Ela tinha uma vida, não exatamente como a de Mare, mas semelhante, no sentido em que tinha tido uma criança muito nova e não tinha grandes perspetivas e precisava de fazer alguma coisa para se valorizar a si mesma e ter algum propósito na vida. Tinha esbarrado com um amigo num centro comercial quando, aos 22 anos de idade, empurrava o seu filho pequeno num carrinho de bebé e este amigo tinha acabado de se formar na Academia de Polícia. Ela pensou: "ah, podia fazer isto. Estou em forma. Sou forte. Sim, o meu filho tem quase três anos - dá-lhe mais um ano e sim, vou dar uma oportunidade a isto". E assim o fez - e foi uma das duas únicas mulheres que se formaram na sua turma de 55 pessoas. É sargento detetive até hoje, e tem quase a mesma idade que eu. Ela foi simplesmente incrível; apoiou-me muito. Sempre que tínhamos o que eu chamaria de cenas de polícia ou detetive, que exigissem um trabalho de detetive detalhado e como deve ser, ou se eu estivesse a usar uma arma ou algo assim, ela estava sempre presente. Ela dizia, "Sim é isso – é real. É assim que se faz". E isso era tudo o que eu precisava de ouvir.

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Foto: D.R.
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