Alexandra Moura: “Aprendemos a dar a volta e a trabalhar de uma outra forma”
Será que a pandemia mudou a forma como compramos? E que impacto teve este ano na Moda nacional? A criadora portuguesa Alexandra Moura desenha hipóteses para o que aí vem.
Logo nos primeiros minutos da entrevista telefónica com Constança Entrudo, a jovem designer admite que precisa de "um bocadinho mais de tempo" para perceber as consequências reais do que foi este ano. No fundo, alteraram-se planos e redefiniu-se a estratégia. "Agora já nos adaptámos, chegámos ao final do ano e já estamos a pensar dentro desta nova normalidade como é que vamos continuar (...), a pandemia já se instaurou, e por isso já temos um plano feito há uns meses para os próximos dois anos, com alterações daquilo que tínhamos feito em janeiro", explica.
As vendas foram afetadas, "como em todo o sítio", justifica, assegurando que "houve depois uma expansão muito grande do online e sentimos que tudo o que publicamos e tudo o que foi colocado cá fora teve um impacto muito maior do que algum dia teve. Portanto, dentro do mau teve essa parte mais positiva". Mas pensar para o universo digital é diferente e levanta novos desafios. "O meu trabalho parte muito do material, é uma coisa muito física, que precisa de ser visto e muitas vezes sentido para ser valorizado, e por isso foi muito desafiante", garante.
Entrudo não tem dúvida que este ano veio dar um novo ritmo às mudanças na indústria. "Vai mudar tudo e já se vê. Acho que esta pandemia só acelerou um processo que já estava a acontecer. Já estávamos a caminhar para o online e de repente somos obrigados a virar-nos para o online em dois meses, já estávamos a caminhar para o sustentável e de repente temos mesmo de caminhar para lá. (...) Mesmo as grandes marcas estão a mudar as suas estratégias, estão a produzir menos e com os pre-orders e tudo isso", diz. No que diz respeito à sua marca, não vê grandes diferenças: "sempre fiz quantidades pequenas e os tecidos são todos feitos para o molde, por isso tentamos fazer zero waste. A pandemia nesse aspeto não mudou nada." Mas, para a criadora, o panorama geral já dá sinais positivos: "As pessoas estão a comprar local, as empresas estão a produzir menos, estamos a ver marcas como a Dior a fazer pre-order, que era uma coisa que nunca tínhamos visto antes, portanto claro que afetou, como em todas as crises há sempre uma mudança da nossa consciência. (...) No meio de tanta tristeza que isto tenha trazido, existe também alguma coisa boa de facto".
Sobre a corrida às lojas de fast fashion na época festiva, a designer de Lisboa afasta-se do radicalismo: "É preciso ver que as pessoas correm porque as coisas abriram numa altura em que se aproxima o Natal, estamos no meio de uma crise enorme. Eu sou bastante compreensiva quando alguém não pode comprar uma peça [minha] e compra na Zara. Tenho visto nas redes sociais designers mais pequenos a puxar isto para o nosso lado, a dizer ‘comprem novos designers, comprem local, etc.’, mas depois os nossos preços não são acessíveis e nós estamos numa crise. Portanto acho compreensível que as pessoas comprem aquilo que podem comprar. Não podemos ser radicais. Eu, como designer, digo ‘comprem se gostam e se podem’. Mas acho que as pessoas estão a mudar e fico feliz".