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"A gravidez e o nascimento de um filho não são momentos doces e cor de rosa como mostra o Instagram"

Nesta rubrica, as mães desafiadas pela Máxima falam sem filtros sobre a maternidade. A apresentadora Ana Marques, mãe de gémeas, Francisca e Laura, 11 anos, conta a experiência agridoce da gravidez e desvenda os desafios dos primeiros tempos.

03 de fevereiro de 2021 às 07:00 Rita Silva Avelar

Qual foi a sua reação quando soube que estava grávida da primeira vez, de gémeas? Quem foi a primeira pessoa a quem contou, e quais foram as reações mais inesperadas?

Acho que pressenti que estava grávida num dia de Natal, em que acordei muitíssimo maldisposta. Já tínhamos tomado a decisão de ter filhos, mas não quis auto pressionar-me vigiando sintomas a toda a hora. A ansiedade é o pior inimigo quando se quer muito engravidar. 

Nessa manhã de dia 25 de dezembro estava de tal modo enjoada que mal conseguia pôr-me de pé. A minha mãe achou que era uma crise de vesícula, dado a minha habitual incontinência para abusar das iguarias natalícias. Lembro-me de dizer: "comes sonhos, como se o mundo fosse acabar!"...Quando fiz o teste, brinquei... e ainda disse: ‘na volta são gémeos’. Visto que os últimos bebés a nascer na família tinham sido gêmeas. E lá estavam dois embriões na primeira ecografia. Manda a prudência que se deixe passar algumas semanas até fazer da gravidez notícia, mas pelo facto de a minha avó ainda ser viva decidi contar imediatamente a todos os avós. A reação foi de absoluta felicidade, obviamente.

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Como correu a experiência da gravidez? Prós e contras, vale tudo…

Bom, a minha experiência é atípica. Foi uma gravidez muito vigiada e sempre um bocadinho tensa. Nas gravidezes gemelares há sempre um risco (mínimo, mas existe) de até às 14 semanas de se perder um dos bebés. A minha idade também não contava a favor.  Tinha 37 anos e peso abaixo da média. Engravidei com 45kg e sempre tive alguma dificuldade em ganhar peso ao longo da gestação. 

No segundo trimestre alguns dos riscos foram-se atenuando, mas perto das 29 semanas aparecem os primeiros sinais de pré-eclampsia. Eram apenas sinais exteriores porque as análises ainda não revelavam valores. Estava assintomática. Apenas as pernas muitíssimo inchadas, a cara ligeiramente mais bochechuda. Mais tarde comecei a ver umas luzinhas na visão periférica do olho. Como se fossem uns pirilampos. Longe de imaginar que isso seria um marcador da doença que se começava a instalar. Fui internada às 31 semanas na Maternidade Alfredo da Costa. De onde saí seis semanas depois com as minhas filhas nos braços e com muitas peças emocionais para colar. Acho que só quando publiquei o livro "As Minhas Gémeas", onde conto a experiência do internamento, é que consegui arrumar psicologicamente essa fase da minha/nossa vida.

Sobretudo, porque recebi centenas de emails e mensagens de mulheres, como eu, para quem a gravidez e o nascimento de um filho não foram momentos doces e cor de rosa como nos mostra o Instagram.

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Quando as suas filhas nasceram, quais foram os seus primeiros pensamentos? Foi daquelas sensações avassaladoras?

Quando às 34 semanas entrei na sala de partos, tinha uma pré-eclampsia muito descompensada e [sentia] uma ambivalência enorme. Por um lado, estava ansiosa por ver os rostos das minhas filhas e tê-las nos braços, por outro, o desejo de que as levassem rapidamente para um local onde os médicos usassem toda a ciência para as salvar, se assim fosse necessário. É estranho uma mãe desejar que nos levem os filhos no primeiro sopro de vida, não é? Isso deixa marcas.

Lembra-se de quais foram as recomendações mais "enervantes" dos amigos e da família? 

Não me lembro de recomendações muito enervantes, mas lembro-me de uma muito engraçada. Quando foi notícia a minha gravidez, a Margarida Pinto Correia escreveu-me um longo e-mail (uma espécie de bula de sobrevivência às primeiras semanas) com uma série de dicas muito engraçadas.

A que recordo, e agora, também eu, aconselho, é a das couves nas mamas. Ao que parece, para evitar mastites, uma das possibilidades é colocar folhas de couve nas maminhas, por baixo do sutiã. Segundo a Margarida: 'ficas a cheirar um bocadinho a sopa mas evita o encaroçamento do peito porque produz calor que liberta os canais do leite’. Na realidade, não amamentei tempo suficiente para experimentar a técnica.

Quando é que as suas filhas a tiram do sério?

Quando percebo que têm um nível de argumentação que desafia a minha inteligência (mas, aqui entre nós, me deixa cheia de orgulho).

O que faz quando as suas filhas não estão a ver, mas que lhes diz para não fazer?

Passo mais tempo do que devia a ver séries na Netflix e depois insisto que deviam ler mais livros.

Qual foi a maior asneira do pai? Aquele dia em que estava despistado e…

Quando voltamos para casa, depois do meu longo internamento o pai foi o grande suporte. Foi pai e mãe em muitos momentos. Claro que fizemos ambos muitas asneiras. 

Foto: Instagram @anamarquesoficial

Quais são os maiores desafios da maternidade, a par de ser mulher e da profissão?

Não há desafios profissionais, ou como mulher que se comparem ao desafio de ser mãe e, sobretudo, de educar. É uma pergunta constante e crónica na nossa cabeça: será que estou a fazer bem?

É importante ter momentos só para si? De que forma é que consegue fazê-lo?

É fundamental. Sem complexos. Acontece muitas vezes dizer-lhes: não me leves a mal, mas preciso mesmo de estar um bocadinho sozinha.

O que é que continua a ser tabu na maternidade, no ser-se mãe?

Acreditar que por nos termos emancipado como mulheres, a gravidez é qualquer coisa que acrescentamos à vida que já temos. Gravidez não é doença, claro que não. Mas há-que saber ouvir o ritmo novo do nosso corpo e aceitar que pode ser preciso parar, abrandar. Não deixamos de ser profissionais competentes por isso. Não deixamos de ser mulheres fortes porque a gestação nos leva, às vezes, para territórios mais frágeis. Foi a Natureza que nos ofereceu este milagre. Respeitemo-lo.

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