A Tupperware, famosa marca norte-americana de vasilhames herméticos acaba de abrir falência. A CEO da empresa, Laurie Ann Goldman, disse que a situação financeira da empresa foi gravemente afetada nos últimos anos por um ambiente macroeconómico difícil. É o tipo de declaração que se espera de uma CEO, mas a verdade é outra. E eu tenho duas à escolha. Uma conjuntural, digamos assim, porque faz parecer que eu percebo alguma coisa de economia, e outra que foi a machadada final.
O primeiro grande golpe no tupperware – uma espécie de baú de onde saem os restos do jantar de domingo – foi o fim do estigma do divórcio. O pessoal mais novo talvez não se lembre, mas havia uma coisa chamada a Festa do Tupperware que era, basicamente, encontros para mães de família da classe média, aborrecidas com a vida. Era mais ou menos igual aos que agora se fazem para vender Bimbys e trocar receitas, mas com mais vinho. E que tem isto a ver com o divórcio? Tudo. As mulheres só participavam nestas festas da vasilha plástica para se verem livres dos maridos durante um serão. E depois agradecidas pela pausa e já bem regadas, acabavam por ficar com o catálogo inteiro.
O que faz agora uma mulher que está farta do marido? Compra um conjunto de manteigueira, açucareiro, caixa de pão, bomboneira, jarro para capilé e forma de bavaroise em PVC, ou pede o divórcio? Pede o divórcio, naturalmente. Quanto mais não seja porque sai mais barato que o deluxe set da Tupperware. E tem mais uso.
Isto, não há dúvida, foi o começo do fim. Mas eu sei bem a quem devemos agradecer pelo golpe de misericórdia: à cantora Rosinha, com sua mania de andar por aí a alardear que o melhor sítio para levar comida é no pacote. Ganha a Inapa com a venda de papel, mas perde a Tupperware e perdemos todos esse grande ícone da cultura popular.
Ou talvez não percamos, afinal, consta que a empresa pediu ordem ao tribunal para procurar um comprador enquanto continua a funcionar, mais ou menos dentro da normalidade, durante este processo de falência. Um procedimento que em Portugal se chama Plano Especial de Recuperação de Empresas – um recurso cuja sigla, não certamente por acaso, é PERE. Que é como quem diz: "Dívidas? Sim, sim, ‘pere lá que a gente já paga…"
Certo é que as acções da Tupperware caíram 50% na Bolsa de Valores de Nova Iorque até a sua transacção ter sido suspensa. Na prática, os accionistas levaram uma tampa – o que não é necessariamente mau, tendo em conta que o flagelo do tupperware sem tampa é apenas suplantado pelo da peúga desirmanada. Aliás, se fizessem uns saldos com as tampas todas que têm em stock, o mais provável era o site crashar e a empresa sair da bancarrota em três minutos e meio.
Há, no meio disto tudo, uma preocupação bastante séria e próxima do nosso coração: os 200 postos de trabalho da fábrica portuguesa da Tupperware, em Constância, que agora estão em perigo. O que é que podemos fazer? Simples, comprometer-nos a comprar tupperwares e a ampliar o seu uso. Deixo algumas ideias…
Precisa de lavar uma pecinha de lingerie? Faça uma barrela dentro de um tupperware que assim não há salpicos – é uma espécie de mini máquina de lavar portátil. E a propósito de lavagens, não tem bidé em casa? Eu própria, que não vivo sem o meu, passei uma temporada na Alemanha sem acesso a esse apetrecho sanitário essencial – salvou-me um tupperware que enchia com água e sabonete delicado para fazer um chap chap, sempre que necessário. E já que estou numa de confissões, se não tem dinheiro para comprar um robot de cozinha, fique sabendo que uma tia minha, quando queria fazer massa quebrada para a quiche, metia os ingredientes num tupperware e chacoalhava vigorosamente – ao fim de poucos minutos, tirava a tampa e, como que por milagre, ali estava, diante dos nosso olhos, uma perfeitíssima e bem formada bola de massa.
E uma grande bola de massa é tudo o que a Tupperware precisa para sair desta trapalhada. Quem nunca?
A autora escreve segundo as regras do Antigo Acordo.