Foto: IMDB01 de junho de 2023 às 07:00 Cláudia Lucas Chéu
Como se sabe, este não é um tipo de literatura recentemente criado. Há, desde sempre, imenso material erótico-pornográfico na História da Literatura Universal. Em termos de popularidade começamos desde logo no século III, com o célebre guia indiano do sexo: Kama Sutra, de Vatsyayana. Contudo, talvez a explosão do mercado literário na área do erotismo/pornografia tenha surgido apenas no século XIX. As editoras de literatura erótico-pornográfica proliferaram em Londres, mas rapidamente se tornaram alvos a abater pela polícia e pelas organizações religiosas; apreendiam e destruíam as suas publicações. A verdade é que este tipo de literatura sobrevive, independente das épocas que, com maior ou menor veemência, vão censurando ou endeusando os diversos materiais literários. A maior parte dos textos permanece devido à inquestionável qualidade literária, que pouco ou nada tem que ver com os recentes fenómenos de best sellers, cujo erotismo serve apenas a experiência comercial e descartável. A lista que se segue centra-se em referências clássicas em que o erotismo e/ou a pornografia são tratados com densidade, conferindo-lhes a justa dimensão perene. Muitos mais livros poderiam estar contidos nesta lista, mas estes são seguramente textos em que o erotismo abarca, além do sexo, as grandes temáticas da condição humana.
1. História do Olho, de Georges Bataille (Quidnovi, 2015)
Admirado por grandes nomes da literatura, como Roland Barthes e Julio Cortázar, Bataille foi publicado originalmente em 1928, sob o pseudónimo de Lord Auch. É considerada a narrativa que inaugura a obra literária e filosófica do autor, e conjuga o erótico e o sagrado de forma ímpar no século XX.
A história centra-se na experiência erótica e progressivamente sádica de dois adolescentes — o narrador e a sua amiga Simone — numa atmosfera onírica e fantasmagórica. Um percurso que se inicia de um modo quase inocente, numa praia de França, e culmina em crime e perversão na ensolarada Andaluzia.
2. Trópico de Capricórnio, de Henry Miller (Editorial Presença, 2008)
Trópico de Câncer é, ao lado de Trópico de Capricórnio, um clássico da literatura erótica mundial. Com uma linguagem sexual explícita, chegou a ser banido dos Estados Unidos à época de sua publicação, em 1934, só voltando ao mercado na década de 1960. Trópico de Câncer é uma narrativa na primeira pessoa, mostrando as (des)aventuras de um escritor norte-americano desconhecido, através da sua errância por Paris, não poupando o leitor aos pormenores sexuais e à escatologia. Convivem no estilo ousado de Miller termos eruditos, mas também coloquialismos, metáforas arrojadas, expressões poéticas e cruezas narrativas extremas.
3. História d'O, de Anne Desclos (Editora Asa, 2012)
Pauline Réage foi o pseudónimo usado por Anne Desclos, jornalista e escritora francesa, para assinar a autoria desta obra. História d’O, publicado originalmente em 1954, causou grande controvérsia e especulação em relação à verdadeira identidade da autora. Na sua génese, esteve o desafio lançado pelo editor Jean Paulhan, que afirmou não acreditar na capacidade de uma mulher para escrever um romance erótico. Anne Desclos admitiu a sua autoria apenas quarenta anos após a publicação. O sadomasoquismo é o tema recorrente nesta narrativa de Desclos. O é uma mulher independente, que se torna escrava sexual do seu amante e de outros homens, descobrindo o prazer pela submissão e castigos físicos. História d’O foi adaptado para o cinema em 1975 por Just Jaeckin.
4. Os Cento e Vinte Dias de Sodoma, de Marquês de Sade (Antígona, 2002)
Há quem se apaixone pela literatura de Sade e quem o considere absolutamente repulsivo por trazer à tona tabus ainda pouco discutidos na sociedade, como o sadismo – termo inspirado no sobrenome do autor. Em Cento e Vinte Dias de Sodoma, Sade narra a história de quatro homens que decidem experimentar orgias sexuais trancados num castelo. Violência e humor negro permeiam a obra, escrita enquanto o autor estava preso na Bastilha.
5. Delta de Vénus, de Anais Nin (Bico de Pena, 2006)
Segundo a autora, escreveu a sua obra erótica, acima de tudo, para se divertir, instigada por um cliente que pretendia que deixasse a poesia de lado. Anais afirmou que o tal cliente «julgava que o meu estilo era mais ou menos copiado das obras sobre o assunto escritas por homens. Pareceu-me, por isso, durante muito tempo, que comprometera a minha verdadeira feminilidade com esses textos. E assim pu-los de lado. Ao relê-los, muitos anos mais tarde, dou-me conta de que a minha própria voz não foi completamente abafada.» A autora afirmou também, acerca destes textos, que representavam o esforço de uma mulher para entrar num domínio exclusivo dos homens. Delta de Vénus é um livro de contos onde são descritas relações de carácter sexual: orgias e triângulos amorosos, prostitutas a satisfazerem as mais diversas fantasias de clientes.
“Partilhar o corpo, o espaço, o tempo, os sentidos, os odores, os fluídos, as respirações. Dispenso.” Todos os sábados, a Máxima publica um conto sobre o amor no século XXI, a partir de um caso real.