Bird nesting, a nova tática para salvaguardar as crianças do divórcio dos pais

Tem um nome inspirado na nidificação dos pássaros, em que as crias ficam sossegadas no ninho, e os pais andam para trás e para a frente para cuidar delas. A diferença essencial é que, neste caso, à noite, não dormem todos quentinhos no mesmo ninho.

Foto: Pexels
01 de abril de 2024 às 18:19 Madalena Haderer

O divórcio é capaz de ser o pior desafio que a idade adulta tem para oferecer. Mau quando não há filhos, pior quando há. Para além da culpa, ressentimento, raiva, medo e incerteza que cada membro do casal sente, é preciso gerir os mesmos sentimentos nas crianças e, acima de tudo, garantir que a transição é o mais suave possível para elas. Toda a gente conhece a cada vez mais estafada fórmula do fim-de-semana sim, fim-de-semana não, com quarta-feira de bónus, que dava muito pouco tempo aos pais para estarem com os filhos. Depois, começou a surgir o modelo 50-50, com uma semana passada em casa de cada progenitor – alguns até faziam questão de alugar ou comprar casa na mesma zona da residência da família, para que as crianças pudessem fazer a pé o percurso entre a escola, a casa da mãe e a casa do pai. Ganhou-se em equilíbrio de tempo e de despesas, mas perdeu-se no eterno problema dos itens "perdidos em combate": trabalhos de casa para entregar na semana da mãe que ficaram esquecidos na casa do pai, ou vice-versa, e quem diz trabalhos de casa diz aparelhos dos dentes ou camisola que se rapinou a uma irmã sem o seu consentimento. Para além disso, por muito que a distância seja curta, é chato passar a vida a puxar um trolley. E é ainda mais chato querer um livro ou um brinquedo e perceber que ficou na outra casa.

Até aqui, nada de novo. O que é novo é a tendência do bird nesting. À medida que cada vez mais famílias se vêem perante um divórcio e a necessidade de manterem as crianças tão felizes e tranquilas quanto possível, é natural que vão surgindo formas diferentes de gerir a situação. Na prática, o bird nesting significa que as crianças ficam sossegadas na casa de família, o ambiente que melhor conhecem e onde sempre viveram, e são os pais que andam para trás e para a frente, de mala às costas, revezando-se em estadias semanais. E embora seja difícil encontrar estatísticas sobre esta tendência de co-parentalidade, uma vez que, regra geral, os arranjos informais ficam entre quatro paredes, de acordo com a revista britânica Good Housekeeping, é algo que está a aumentar: um estudo recente diz que 11% dos casais divorciados ou separados no Reino Unido vivem dessa forma ou, pelo menos, tentam.

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Na prática, o primeiro problema que se coloca é financeiro. Afinal de contas, é preciso manter três casas: a de família, e outras duas para cada um dos ex-cônjuges. Mas, se o dinheiro for curto, nada impede que se seja criativo. Pode-se sempre voltar para casa dos pais, dividir casa com amigos, alugar um quarto ou – solução a que, de acordo com a revista britânica, alguns casais estão a recorrer – alugar um apartamento para os dois, onde se vão revezando: quando um está em casa com os filhos, o outro está no apartamento e vice-versa.

Acima de tudo, dada a proximidade inevitável deste tipo de vivência, é imperativo que o casal se dê bem e que haja uma base forte de amizade, respeito e boa comunicação. Se vão estar aos gritos diante dos filhos a cada "render da guarda", faz mais mal do que bem e deixa de valer a pena. É preciso ter cuidado também com as tendências passivo-agressivas: como deixar a casa suja e desarrumada para a outra pessoa, criticar o outro progenitor ou fazer grandes alterações na casa ou na rotina dos filhos sem consultar o outro.

Uma outra sugestão para quem esteja a pensar experimentar este estilo de vida é tentar organizar a casa de forma que cada progenitor tenha um quarto só para si. A partilha da cama de casal, ainda que à vez, pode causar desconforto ou desgaste emocional. Caso não seja possível arranjar dois espaços, o ex-quarto de casal deve passar a ser tratado com um quarto de hotel: sem fotografias nem objetos pessoais e, claro, deixando roupa lavada na cama, antes de sair.

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À partida, o bird nesting vai ser sempre um arranjo temporário, afinal, as crianças, principais beneficiários do plano, crescem e vão à sua vida, como os passarinhos. Não obstante, poderá ser posto em prática durante um período ainda mais limitado, numa fase inicial de transição ou durante o período em que se tenta vender a casa da família. Para que tudo corra bem é imperativo que os elementos do casal tenham uma conversa séria sobre os direitos e deveres de cada um, regras, divisão das despesas, e tudo o mais que possa causar um conflito e, de preferência, pôr tudo por escrito, para que fique claro, desde o início, o que é que cada um pode esperar.

Por norma, este plano torna-se mais desafiante quando um dos elementos do ex-casal – ou ambos – arranjam um novo parceiro. Este pode visitar a casa da família? Pode ser apresentado aos filhos como namorado e/ou namorada? Pode passar lá a noite? Eis o tipo de conversa que não é fácil ter no início de uma separação, o que torna improvável que este assunto seja abordado quando se estão a estabelecer as novas regras de convivência. Pode ser uma boa ideia organizar umas sessões de terapia – um espaço seguro e livre de julgamentos para introduzir novas variáveis ou possíveis alterações ao plano inicial.

Como em quase tudo na vida, é uma situação em que se vai inventando e improvisando à medida que se avança, sem nunca esquecer que o objetivo é que as crianças sejam felizes e, para isso, é preciso que os pais vão trabalhando na sua própria felicidade, por muito difícil que isso possa parecer ao início.

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