Kelly Bailey: "Vivemos num país que não nos dá condições para estarmos em casa a cuidar dos nossos bebés"
O que é um ícone? “São aquelas pessoas que, quando morrem, há qualquer coisa que também morre com elas”, responde a atriz, e lembra-se de David Bowie,o homem que nunca deixou de mudar. Kelly Bailey, que há mais de 10 anos vemos nos ecrãs, também mudou, está mais crescida, já é mãe. Mas há coisas que permanecem, como aquela luz que vem de dentro e faz qualquer coisa a quem a recebe. Também é desse mistério reluzente que se fazem os ícones.
Kelly Bailey reflete sobre maternidade e a efemeridade dos ícones, como David Bowie
Foto: RICARDO SANTOS / MÁXIMA23 de dezembro de 2025 às 17:12 Maria Salgueiro
Tinha 16 anos quando apareceu pela primeira vez na televisão. Foi apresentar uma novela, o projeto
de estreia na TVI, a um programa da manhã. Num estalar de dedos,
tornou-se famosa, tinha páginas de fãs, era a nova cara bonita da estação, e ainda ontem estava só a estudar teatro. Demasiada exposição,
demasiado rápido, impulsionou mudanças profundas. Talvez seja por
isso que hoje é tão desligada das redes sociais. Aos 27 anos, Kelly Bailey
quer ter uma voz, mas não faz questão de aparecer. Adora a profissão e
reconhece que, quanto mais vive, melhor se torna um ator. E estendeu
a Bruna, personagem a que voltou na segunda temporada de Rabo de
Peixe, chegada este mês à Netflix, o seu espírito livre, que gosta de festas e não gosta de planos, mas também a sua luz – porque as pessoas
que interpreta, é inevitável, têm sempre um bocadinho dela. “Mas eu
sou mais responsável”, garante, a vida mudou da forma mais visceral
que existe. É mãe de Vicente, o filho que leva para todo o lado, não
havendo fronteiras para este amor. E diz, radiante, que nada é mais
bonito do que ver alguém observar o mundo pela primeira vez. Já lá
vão sete anos de namoro com Lourenço Ortigão, dois anos de coparentalidade com as mãos e os pés na Terra, que passaram tão rápido. Dizia David Bowie, um dos seus ícones, em Changes: “Time may change me, but I can't trace time."
Camisola em caxemira, Louis Vuitton.
Foto: RICARDO SANTOS / MÁXIMA
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Como descreves a tua relação com as tecnologias?
Ainda hoje o meu melhor amigo me enviou um vídeo de
uma rapariga a dizer: “Se pudesse ganhar um milhão de
euros por ligar para alguém que tivesse a certeza de que
não ia atender, quem seria?” Estou sempre a receber este
tipo de mensagens por estar desligada do telefone. Para
quem trabalha comigo, às vezes é chato. A nível profissional, isto não pode acontecer, temos de estar conectados e,
portanto, tenho de fazer o exercício contrário à maioria
das pessoas, que é obrigar-me a responder.
Sentes pressão dos teus amigos para estar mais presente
online?
Há um equilíbrio que tem de existir. Eles não têm de simplesmente aceitar que eu não respondo, porque não é fixe.
Se eu já era má a responder, desde que fui mãe ainda estou pior. Há pouco tempo, um amigo disse-me “obrigada
por não teres deixado de responder”, e aquilo fez-me pensar. Esta coisa de ser desligada é boa, mas não posso ser
desligada dessa maneira, porque o mundo mudou, temos
outras formas de comunicar. Tenho a minha carreira, a
minha vida profissional, família, e não tenho tanto tempo
para estar com os amigos. Às vezes, é através de uma mensagem que conseguimos estar ligados. Contudo, os amigos
que me conhecem bem já não me cobram isso, porque sabem que é uma característica minha. Sempre que precisaram de mim, eu estive lá fisicamente. Com as amizades
que tenho mais recentes, digo: “Olha, aviso já que é um
defeito meu, se for realmente importante, liga-me."
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Chapéu, saia em lã com pormenores em pele, botas em pele, meias em lã, carteira em pele, tudo Louis Vuitton.
Foto: RICARDO SANTOS / MÁXIMA
Achas que devia existir mais higiene tecnológica?
Temos de reaprender a usar a tecnologia com rotinas,
que é uma coisa que deixámos de ter e que antigamente
existia. Lembro-me de, com o telefone fixo, ter de pedir à minha mãe para ligar para uma amiga, e a partir de uma
certa hora não se ligava para casa. Isso já não existe. Hoje
em dia, com o WhatsApp e as mensagens, deixámos de ter
regras, deixou de haver esse cuidado, temos de estar disponíveis 24 horas por dia. Se não atendermos ou se não
respondermos, há essa cobrança. Isso também é preocupante, não é?
Cresceste num mundo com redes sociais no pico da adolescência. Já eras desligada nessa altura, ou foi sendo
uma tomada de consciência?
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Não era nada desligada, pelo contrário. Quando as redes
sociais apareceram, quis muito fazer parte. Comecei a
usar o Facebook para falar com os meus irmãos, o Oliver e
a Megan, que são ingleses e viviam em Inglaterra, e ainda se pagava roaming. A minha mãe não me deixava usar o Hi5
e o Facebook foi uma desculpa para falar com eles. Nessa
altura, nós não tínhamos a consciência que temos agora.
Hoje temos jovens para quem, se calhar, até é mais cool
não ter redes sociais, jovens que já nem publicam porque
não se identificam. Mas quando estava no pico da adolescência, usei e abusei. E teve impacto, naquela idade em
que somos miúdas e há aquela coisa na escola de quem
é mais popular e menos popular. As redes sociais vieram
puxar mais por isso.
Além disso, comecei a trabalhar com 16 anos num projeto da TVI, numa altura em que a televisão ainda era vista
com bastante intensidade. Lembro-me da primeira vez
em que fui a um programa fazer a apresentação da novela
e os meus seguidores aumentaram assim [estala os dedos]. Foi tudo muito rápido. Quando dei por mim, estava a fazer
uma novela, a estudar teatro, e, de repente, tinha páginas de fãs. Não houve tempo para pensar em nada. Com 18
anos, já estava a viver muitas coisas para uma miúda daquela idade. A grande vantagem é que estive sempre muito
bem rodeada, tive sorte com os colegas que tive, inclusive
o Lourenço, que hoje é meu namorado, mas na altura era
só amigo, e que já tinha mais experiência do que eu por
causa dos Morangos com Açúcar. Passou por muitas coisas
e também me aconselhou.
Saia em popelina de algodão e botas em pele, Louis Vuitton.
Foto: RICARDO SANTOS / MÁXIMA
De que forma é que essa exposição te moldou?
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Fez-me ser aquilo que sou hoje. Esta minha vontade de me
desconectar, de não me deslumbrar pelos likes, de querer
procurar mais verdade em mim, vem do crescimento que
tive. Foi o meu caminho e tudo isso teve impacto nas escolhas que tomo hoje. Gosto de dizer que foi a minha fase
de laboratório.
Tu e o Lourenço já falaram sobre este tema em relação ao
vosso filho? Já é uma preocupação que têm? Discute-se muito o facto de os tablets e outros ecrãs serem uma ferramenta usada pelos pais para entreter os filhos.
A meu ver, é uma falsa ajuda, porque mais tarde paga-se
a fatura. O meu filho nunca viu televisão, não a ligamos
em casa, nunca viu desenhos animados, não sabe o que é
um iPad, ele nem sabe que eu faço televisão. E não é que
ele não vá ver, estou desejosa de lhe mostrar filmes, de ir
ao cinema com ele, há desenhos animados incríveis que
quero ver com ele, mas vai haver tempo para isso. As tecnologias vão fazer parte da vida dele, aliás, nem eu tenho
o objetivo de as retirar. Mas acho que um bebé com 2 anos
tem muitas outras coisas mais importantes para ver primeiro. Faço tudo com ele. Já esteve comigo no Brasil, no México, Bali, Funchal, Paris, San Sebastián. É maravilhoso
ver um ser humano a observar o mundo pela primeira vez.
Um ecrã é uma coisa altamente estimulante para um cérebro que se está a desenvolver. Se há coisa que me dói no
coração é ver os meninos com os iPads à frente, nem estão
a ver o que estão a comer, ou está a mãe a dar-lhes à boca
e eles estão a olhar para o telefone.
É incrível esta fase que estou a viver com ele e se calhar
daqui a uns tempos vou ter opiniões diferentes, mas este
início de vida tem corrido bem. Temos uma criança muito feliz, segura. Aquilo que quero passar ao meu filho é
confiança. Tou muito atenta à parte emocional porque sou
uma pessoa altamente sensível.
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Kelly Bailey
Foto: RICARDO SANTOS / MÁXIMA
Quando gravaste a primeira temporada de Rabo de Peixe, ainda não tinhas sido mãe. Como comparas essa primeira experiência à segunda?
Estava grávida de oito meses quando soube que ia haver as
segunda e terceira temporadas e, quando fiz as contas, percebi que o Vicente ia ter 8 meses no meu regresso às gravações. O tempo ajudou muito. As coisas foram planeadas com
tempo. Pus sempre a hipótese de o levar para os Açores, mas
não foi preciso. Gravava um ou dois dias, no máximo, e tinha
um intervalo de uma semana sem gravar. Então, o Vicente ficava cá com a minha mãe e com o Lourenço. Para mim, também foi uma experiência a que tive de me adaptar.
Sentiste alguma espécie de choque por sair da bolha da
maternidade?
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Voltei a trabalhar muito rapidamente. No primeiro projeto
que fiz, o Vicente tinha 3 ou 4 meses. Regressar ao trabalho
é uma questão que não é assim tão falada. Fala-se muito
do parto, mas voltar ao trabalho, para uma mãe... É muito
comum haver um bocado esta busca por quem é que eu
sou agora. Onde é que eu me encaixo. Porque agora, de
repente, estou a descobrir-me enquanto mãe. Mas existe
uma Kelly que já existia e que quer trabalhar.
Vestido em lã com detalhe em pele e botas em pele, Louis Vuitton.
Foto: RICARDO SANTOS / MÁXIMA
Tiveste medo de perder oportunidades?
Estou numa posição privilegiada. É ingrato para mim falar
disso como se tivesse sido esse o meu problema. Tenho
a sorte de estar rodeada das pessoas certas. O Lourenço,
que me deu esse suporte, a minha mãe, a TVI, um canal
com o qual tenho um compromisso profissional, que me
deu tempo. Como é que será para todas as mães que têm
mesmo de trabalhar? Que estão sozinhas, que precisam
de dinheiro, que têm de pôr os bebés na creche? Infelizmente, vivemos num país que não nos dá condições para
estarmos em casa a cuidar dos nossos bebés. Os primeiros anos de vida são fundamentais. E é uma pena que o sistema não esteja feito a pensar nisso. O sistema não está
feito para as mães. Na posição de privilégio em que estou,
voltar ao trabalho já foi um processo doloroso. E pus-me
no lugar de todas essas mulheres. Se esta fase da vida das
crianças fosse passada com tempo, com mais colo e segurança, se calhar o mundo seria diferente.
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Como é que fazes para voltar a uma personagem como a Bruna, a esse sítio onde já estiveste?
Há qualquer coisa de muito interessante quando se retorna a uma personagem. Há muita coisa que volta rapidamente, que está em nós. Que fica. Antes de começarmos a
gravar, houve um trabalho que fizemos: fomos aos Açores,
dormimos todos juntos numa casa, cozinhámos juntos.
Até começarmos a gravar, pudemos mergulhar nas diferentes camadas das personagens.
O Zé Condessa é dos atores com quem mais contracenei
na minha carreira, o que também facilitou o processo. E
depois, trabalhar com o Augusto Fraga, que é o realizador
desta história, é incrível. Ele é mesmo incrível, principalmente para um ator, porque é alguém que ouve. Haver este
espaço de cocriação torna todo o processo muito mais entusiasmante, e é por isso que falo deste projeto com tanto
carinho. É feito com amor, é fascinante ver toda a gente no
set. Toda a equipa está dedicada de alma e coração. Nem
sempre é possível vermos isso.
Kelly Bailey
Foto: RICARDO SANTOS / MÁXIMA
De que forma é que te identificas com a tua personagem? E te afastas dela?
A Bruna tem um lado com que me identifico, de ser uma
miúda jovem, que gosta de festa, é livre, onde vai é luz.
E é descomplicada. Ao mesmo tempo, tem um lado mais
escuro. Ela não é responsável, de todo, experimenta todas
as drogas. Eu sou muito mais responsável. Tenho muito
mais medo de me atirar para esse tipo de experiências.
Mas muito daquilo que a Bruna faz é uma chamada de
atenção para os pais. Tive uma família mais presente, essa
é a grande diferença entre nós. Mas há muitas coisas dela
que são minhas. Inevitavelmente.
Sacos, botas em pele, tudo Louis Vuitton.
Foto: RICARDO SANTOS / MÁXIMA
O que é para ti um ícone?
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É alguém que consegue ser verdadeiro com ele próprio,
que tem impacto, que é uma voz na sociedade, como o
David Bowie. É daquelas pessoas que, quando morrem,
há qualquer coisa que também morre com elas, morremos todos um bocadinho. É alguém que deixa uma marca, mesmo não estando cá, e que não está preocupado em
agradar. É puro, genuíno e verdadeiro.
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Portugal tornou-se casa para uma nova geração de talentos globais. Fotógrafos, stylists, designers e modelos refletem sobre carreira, pertença e o equilíbrio entre ambição e saudade.
Conhecido pela sua abordagem conceptual e atenção à intuição no design, tem vindo a desafiar a moda autoral a sair do editorial e a ganhar vida no dia-a-dia das pessoas. A sua colaboração com o estúdio Layers na coleção Rush Hour reflete esta filosofia: criar peças que resistem ao tempo e ao caos, sem perderem personalidade.