O escândalo das mãos dadas
Nara Vidal, escritora brasileira, reflete sobre os preconceitos que persistem quando ex e atual mulheres se dão bem ou, pasme-se, são amigas.

A frase repetiu-se nos destaques de vários jornais e revistas: Gwyneth Paltrow e Dakota Johnson de mãos dadas. Veja você que eu, ao bater os olhos, pensei que se formava ali um novo casal, que as duas estavam juntas como namoradas. O fato é que eu não sigo as celebridades e suas vidas, por isso, não sabia que Dakota namora, não Gwyneth, mas seu ex-marido, Chris Martin. Então, veio o incômodo: porque é que a suposta amizade ou o bem querer entre as duas é notícia?
Acertou quem perguntou onde já se viu a ex e a atual se darem bem? Mas, ainda que seja essa a frase mais previsível e, possivelmente, a mais pensada, essa mesma frase esconde (ou no caso, revela) o homem como o centro do mundo. Veja que o espanto é que duas mulheres, cuja interseção entre elas é um homem, se dão bem e convivem. Segundo Paltrow são mesmo boas amigas. Por outro lado, o que me espanta é esse assombro dos outros em compreender que, no caso dessas duas mulheres, a relação civilizada e que não prevê competição entre elas é valorizada e praticada. Verdade seja dita que Gwyneth, ainda que venda produtos estranhos no seu site, parece exercitar bem a civilidade. E note que essa frase não tem, apesar de parecer, nenhum sarcasmo. Nenhum. Eu, realmente, admiro e até me enquadro em algumas das configurações tão modernas da atriz norte-americana. Também sou muito próxima e amiga do meu ex-marido e pai dos meus filhos. Na verdade, moramos na mesma casa e já escrevi aqui sobre esse arranjo. Também consigo me imaginar convivendo e muito bem com uma namorada dele ou uma mulher de um próximo casamento. Respeito profundamente o pai dos meus filhos e suas escolhas. Sei que quem quer que esteja com ele é uma opção de conexão afetuosa e amorosa. Não caberia qualquer animosidade da minha parte, até porque os filhos se misturam, convivem com o outro que se insere e eu gostaria que meus filhos tivessem paz e confiança no caráter alheio, especialmente o do pai deles.


Dito tudo isso, qual seria a desconfiança da cena dessas duas mulheres de mãos dadas? Parece-me que isso está pautado no velho machismo que nos ensinou a desconfiar e a não gostar das outras mulheres. Estrutura machista que nos deu boas e eficazes aulas sobre competirmos entre nós para chamar atenção de homem. Comportamentos que nos convenceram de que, se o homem fica com outra, é ela a puta (aliás, palavra que não deveria soar como ofensa: é profissão e deve ser respeitada por isso).
Quando, em 2003, houve o caso das Mães de Bragança, as esposas dos homens portugueses quiseram expulsar as mulheres brasileiras que lá trabalhavam como prostitutas. Pelo que entendi, depois de serem bem-sucedidas, os mesmos maridos cruzaram a fronteira e foram buscar as trabalhadoras espanholas. O caso aqui não me parece só de machismo e preconceito, mas de racismo e xenofobia. Além, claro, de um elemento crucial na análise que é o da pobreza das famílias daquela região que viam seus fundos serem gastos de forma que talvez julgassem inconsequente e imoral, quando, vai saber, a mesa não estava farta. Porém, o que chama a atenção é precisamente o ódio de uma mulher por outra mulher. Essa repulsa, essa rejeição são tristemente previsíveis e ainda estamos bem longe de espalhar a tal "sororidade", palavra que me incomoda porque é usada por tanta gente que destila segundas intenções e comportamentos opressivos. Mas ainda assim, falta camaradagem, falta entender que o homem precisa deixar de ser o centro das atenções, o troféu quebrado e barato que tantas vezes é. De fato, um homem não é troféu nenhum: é sim, quando calha, um companheiro, um namorado, um pai, um amante, um amigo. Mas colocar um homem como alguém que tem uma importância ao ponto de fazer desesperar uma mulher que destila seu ódio em campanhas abertas ou comportamentos mais sutis como, por exemplo, o espanto em relação a amizade entre duas mulheres que se relacionaram com o mesmo homem, é, não só tolo, como de uma ingenuidade quase comovente.


O que espantou tanta gente não foi apenas a capacidade de amizade entre duas mulheres bem resolvidas e financeiramente independentes (por favor, marque esse ponto). O que escandalizou foi a incapacidade da grande maioria de mulheres se ver no lugar delas, convivendo em paz com o movimento da vida. Foi a inabilidade em compreender que uma não foi trocada pela outra, que não existe competição e que uma relação de amizade entre mulheres que conheceram os mesmos homens é possível e passível de civilidade. Com sorte cabe ainda afeto.
Gosto muitíssimo de um ditado inglês: o lixo de um é o tesouro de outro. E se você pensou que eu me referia ao Chris Martin, está enganada. Pensei mesmo no julgamento engessado dos outros que pego pra mim como se fosse uma oportunidade de pensar diferente.

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