Manuel Luís Goucha e Rui Oliveira: "O Rui trouxe para a relação o riso, a leveza e a certeza de que não há problemas"
Fomos voyeurs, imortalizámos o amor alheio. Depois da pandemia, num mundo assumidamente individualista, que lugar têm as ambições pessoais numa relação amorosa? Quatro casais contam-nos as suas histórias de amor no século XXI.

Factos. No dia 18 de outubro de 2023, a proteção civil lançou um alerta laranja (o segundo mais grave numa escala de três) para oito zonas de Portugal. Ventos fortes, chuvas torrenciais e risco de cheias. Por momentos a sessão que juntava os protagonistas deste editorial esteve para ser anulada. As ruas da capital encheram-se de água, andaimes que cobriam as fachadas das obras ameaçaram soltar-se, algumas árvores voaram. Foi nesta energia que conhecemos os protagonistas destas imagens. É costume evocar-se a bonança depois de uma tempestade, só que Lisboa parece não querer parar. Mais elétrica e engarrafada que nunca, promete continuar a crescer no tamanho das linhas de metro que agora se constroem e deixam as ruas com alcatrão aberto. A tempestade parece ter ativado a procura de boémia na fauna do centro da cidade, como se a vontade de novos encontros, antes de um possível mergulho no inverno, gritasse aos lisboetas e seus aliados internacionais que depois da tempestade… há uma possibilidade de amor.
Manuel Luís Goucha e Rui Oliveira


Manuel Luís Goucha é o primeiro a chegar e, casualmente, começa a entrevistar todos os membros da equipa presentes no estúdio de fotografia. A profissão de entrevistador segui-lo-á sempre no quotidiano? Mais tarde, já sentado ao lado do marido fala de um compromisso com o público, "a partir do momento em que saio pelo portão do meu jardim, eu não sou mais meu – sou das pessoas". Manuel e Rui Oliveira falam connosco lado a lado, Rui sorri ligeiramente sempre que Manuel fala. Visto do exterior é como se as palavras do marido o continuassem a fascinar. Estão juntos há 25 anos, desde o fim dos anos 90.
Perguntamos onde ficam as ambições pessoais num casal com uma relação tão longa? Manuel pede para responder. E diz-nos. "A minha prioridade é a minha profissão. Portanto, eu confesso que foquei muito a minha vida no trabalho. Por isso estou há 40 anos a fazer televisão sem parar, dos quais há 31 todos os dias. Queria ser um grande apresentador e fixei-me nisso. Agora, esta minha ambição não me desvia da ambição do casal, da ambição dos dois. O facto de saber que está lá o Rui proporciona-me estabilidade emocional."


Conheceram-se na noite de Santo António, num jantar em casa de amigos. Rui tinha o distanciamento de alguém que tinha vivido muitos anos no estrangeiro. É bem-disposto, os amigos queriam que se fizesse passar por um conde durante a refeição. Sentou-se simplesmente à frente de Manuel Luís, falaram a noite toda. Rui lembra: "Já tínhamos rido muito e dei-lhe um abraço enquanto me despedia, ele desatou a rir... Uma gargalhada medonha, nunca mais parava de rir." Entre os risos que o episódio ainda provoca, Manuel Luís explica-nos não ser muito dado a abraços ou até a um toque excessivo.

Os caminhos entrelaçam-se. Rui foi incentivado em casa por Manuel a aceitar um convite recente para apresentar um programa na CMTV, "eu não andava à procura de fazer televisão, aconteceu simplesmente". Ao fim de tantos anos deve haver um certo mimetismo no comportamento dos dois, o que terão absorvido um do outro? "Eu não absorvi coisas tuas", responde prontamente Manuel Luís. Rui contrapõe, "eu uso o meu perfume há muitos anos, um Patchouli, ao início ele dizia-me que era muito intenso, que deixava rasto". Manuel Luís começa a rir sem parar, "confesso que comprei o Patchouli há dias, ainda não comecei a usar, mas está lá". E, assim, Rui garante que se averiguarmos o passado de Manuel Luís conseguimos perceber quando ele entrou na sua vida. Algo mudou na atitude dele, passou a ser menos altivo e até as calças de alguns fatos começaram a ficar mais curtas. Manuel não concorda, tenta resumir, quer mudar de assunto. Rui responde, "ele quer sempre resumir". Manuel tem a noção de timing apurada, são muitos anos em direto no prime time da televisão, a última palavra é dele. "Posso dizer o que o Rui trouxe para a relação, o riso, a leveza e a certeza de que não há problemas, só soluções. Claro que a pessoa velha que eu era, independentemente da idade que tinha, se aligeirou." O casal acaba de lançar um livro de receitas, afinal tudo começou à mesa de jantar.
Créditos Realização
*Artigo originalmente publicado na revista que celebra os 35º anos da Máxima.

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