Opinião. No "Casados à Primeira Vista", por favor, não sejam felizes para sempre
O conflito e o escândalo entretêm mais do que a harmonia e a sensatez — isto já os gregos sabiam e não seria o "Casados à Primeira Vista" a vir provar o contrário. É azar ao amor, sorte às audiências.
Foto: SIC27 de maio de 2025 às 13:11 Catarina Moura
Homens de meia idade que
estranham que uma mulher não os queira beijar, uma noiva que desmaia no altar
ao ver o futuro marido e um sexagenário que garantiu a um amigo que uma mulher
com menos 20 anos estava interessada nele. “Esta sim, esta vale a pena. É boa
ao toque”. Este cavalheiro terminou com um longo pousio televisivo: há muito
tempo que ninguém dizia em sinal aberto “vou-me fazer ao bife”.
Tudo isto é errado se
falarmos de relações, mas como já disseram alguns concorrentes ao longo desta
série, “isto não é o amigos à primeira vista”, ou o “clique à primeira vista”
nem mesmo o “abrir as pernas à primeira vista”. Isto é o Casados à Primeira Vista
e ainda bem que não tem nada a ver com amor.
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Desde o Big Brother de
2020, o primeiro reality-game show em Portugal, já ninguém nos engana. Isto não
é “a vida real” nem uma “experiência sociológica”, como se disse mais do que
esdruxulamente nos primórdios do género em Portugal. Esta também não é a “experiência
social” para “almas gémeas desencontradas”, como anunciam algumas publicidades.
Isto é televisão.
Foto: SIC
Dentro da espontaneidade
das conversas, das reações e discussões dos realities há as ficções que todos
conhecemos (mais ou menos intuitivamente) e aceitamos. A ficção que dá mote a
este programa: casais de estranhos são escolhidos por três pessoas com profissões
inventadas neste milénio e apelidados de especialistas — uma coach “designer de
vidas”, um mestre do eneagrama (uma teoria que divide 8 mil milhões de pessoas
em nove tipos e diz quais se conseguem aturar uns aos outros) e uma psicóloga e
sexóloga
Nesta edição juntaram um
advogado do exercício físico com uma sedentária que se descreve como “capaz de
estragar um almoço de família”; um sexagenário auto-centrado e machista com uma
mulher independente; uma noiva cética que perde os sentidos quando vê dentes
desalinhados com um tarólogo, professor da auto-confiança com um diastema de
meio centímetro; uma ex-back vocal de Mickael Carreira com o amigo de um amor
de adolescência que estava entre os convidados do noivo. O trunfo da temporada:
uma mulher de quarenta anos que gosta de divertir-se e nem precisava de um
marido para nada recebeu em sorte um ex-concorrente da primeira temporada,
controlador e manipulador.
Como se intui pela amostra,
se os casais que se deram bem fossem currículo para os especialistas, ninguém
os contratava. Digamos que o eneagrama anda de mãos dadas com as audiências: há
o tipo de pessoa prestativa de um bom share; o “tipo performático” de uma
cegada que nos mantenha no mesmo canal à mesma hora no dia seguinte; “o
perfecionista” de pataquadas capazes de alimentar não só o horário nobre como
várias entrevistas do daytime. Ainda bem: foi para isto que se fez o eneagrama,
e não tanto para andar a vender cursos de coaching à classe média.
Foto: SIC
Sem prémio final e
escolhendo de livre vontade sair ou ficar a cada domingo, não haveria razão
nenhuma para estas pessoas continuarem ali, uma semana atrás da outra. Nem o
argumento de que uma relação dá trabalho as poderia manter — sobretudo sem um
prémio final. À segunda semana, a maioria já viu o que tinha a ver: se se
encontrassem os dois a fazer a reciclagem da carta de condução tinham mais em
comum e, mesmo assim, não trocavam mais do que o horário das aulas de código.
Felizmente, em algum
momento das primeiras temporadas o programa jogou a cartada do desenvolvimento
pessoal — e quem é que não quer desenvolver-se? É como aquela pergunta ardilosa
que nos fazem na rua quando estamos em andamento: “tem um minuto para direitos
humanos?”. O que é que a pessoa responde sem perder a face? E se não for para
fazer a jornada do auto-conhecimento, “ao menos, leva-se daqui um amigo” e já
não se perde a viagem.
Assim, os especialistas
passam boa parte do tempo a convencer os concorrentes de que, se a atitude
deles for de uma certa maneira, aquilo ainda dá uma relação muito linda — o
mulherengo ainda pode amar profundamente e o profissional do gaslighting ainda vai
dar um marido devoto ou pelo menos um amigo “que me acrescente”, como se diz.
Aliás, nesta edição anda a namorar-se a ideia de que se elas deixarem que eles
lhes toquem aqui e ali, se se rirem mais um bocado e ignorarem o que não gostam
lá muito — mesmo que seja resultado dos mais básicos instintos de sobrevivência
feminina — ainda vão ver nascer um bonito amor. Citando um participante da
temporada anterior, “como é que ela sabe que não gosta de mim? Ela nunca me viu
nu”.
Qualquer ameaça a este
ecossistema de broncas apetitosas é um susto. Quando uma das concorrentes
começou a enumerar umas quantas “linguagens do amor”, num momento de teorização
inofensiva e apaziguadora, a especialista psicóloga apressou-se a dizer que estas
teorias “não têm evidência científica”, apesar de estar sentada ao lado do
especialista dos eneagramas.
Foto: SIC
Não confiemos na televisão
e nos realities para colher ensinamentos sobre o amor e as relações. Deixemos o
Casados à Primeira Vista cumprir o seu único desígnio possível além do
entretenimento: o nosso apelo por explorar tudo o que pode correr mal numa relação,
como se o vivêssemos não tendo de o viver; poder experienciar a raiva, a
indignação, a desilusão e até a bizarria na segurança e no conforto, garantindo
que tudo não passará de uma instrutiva viagem ao estranho para matar a
curiosidade.
Os casais que no meio disto
resultam são bons para ir buscar um copo de água à cozinha. É bastante
desinteressante ver casais a darem-se bem, a serem ponderadas e empáticos —
façamos uma exceção ao casal a Marta e César, a cabeleireira de Vizela e o tarólogo
de Braga que, mesmo numa fase de enamoramento, conseguiram oferecer-nos
momentos de deleite, como a massagem com óleo afrodisíaco em que César garantiu
trabalhar “mais como terapeuta, não quis entrar muito na parte de marido”, ou o
momento em que o sedutor alimenta a sua mulher enquanto descreve o ato: “um
moranguinho para a tua boquinha”.
Não há razão para temer que
a taxa de sucesso dos casais e de aborrecimento do público cresça em próximas
edições. O mais recente anúncio a uma próxima temporada — ou, pelo menos, a um
formato declinado deste — pede candidatos que se achem compatíveis com
anteriores concorrentes do Casados. Os números em queda desde a terceira
temporada estão longe da audiência média de um milhão de espetadores de alguns
episódios das primeiras. Está na altura de assumir que os especialistas escolhem pouco ou nada e de apostar no mercado da saudade — a saudade de
assistir a um acidente de carro, de ler aquele manual criativo de o que não
fazer. Em sete anos, o ex-concorrente regressado à temporada agora no ar
refinou os delírios e consegue dizer cada vez mais frases sem sentido.
Esperemos que os outros tenham envelhecido na mesma cave.
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