Os limites, ou "boundaries", como se diz em inglês, se quisermos usar o jargão da modernidade, são essenciais para a saúde mental. Principalmente para as mulheres. Porquê? Porque, não querendo desiludir ninguém, temos o hábito perverso de dizer “sim” a tudo, e depois acabamos estafadas, frustradas, com metade dos pratos no ar e a outra metade escaqueirada no chão, e a sentir que toda a nossa existência é em prol dos outros. O que resulta em ansiedade, stress, noites mal dormidas e muito pouco tempo dedicado àquilo que realmente nos traz alegria, seja lá isso o que for – passar tempo com os filhos, fazer jardinagem, ler policiais nórdicos, fazer um workshop de teatro, escrever um livro, abrir um negócio, fazer surf ao fim do dia, aprender danças de salão ou, simplesmente, contemplar o mundo a partir da janela com um chá (ou um gin tónico) na mão.
Quando foi a última vez que tirou tempo para si, sem dar explicações a ninguém? O mais provável é que não se lembre. Mas se lhe perguntarmos quando foi a última vez que apagou um incêndio (metafórico), deve ter meia dúzia de episódios recentes pendurados na ponta da língua. Um telefonema stressado da sua mãe que não sabe onde enfiou os exames que tem de mostrar ao médico daqui a menos de uma hora e que precisa mesmo da sua ajuda para os desencantar; o seu filho que não disse que hoje é dia de levar cartolinas para a escola; o seu parceiro que se esqueceu de ir às compras e agora não há nada que se coma; milhões de objetos que nunca ninguém encontra e que lhe toca a si procurar pela casa; o cão que apanhou uma carraça (ou ela é que o apanhou a ele, como se fosse o 758 para as Portas de Benfica com buffet incluído) e toda a gente tem nojo de lhe tocar e lá vai a cara leitora perguntar ao Chat GPT, já de luvas calçadas, como raio é que se arranca carraças. Parece-lhe familiar?
É verdade que tudo isto se resolve com limites bem impostos, porém, se os limites fossem fáceis de impor, nada disto seria um problema. E toda a gente gosta de viver com o pé em cima da linha vermelha, a ver se nos põe a fazer só mais uma coisinha. Portanto, não é segredo para ninguém que andamos a fazer tudo mal. O que talvez não saiba é que há um pequeno truque de semântica que, quando aplicado às respostas que dá às solicitações que recebe, pode mudar a sua vida.
Num episódio recente do podcast da BBC The Woman’s Hour Guide to Life, Helen Tupper, uma especialista em desenvolvimento de carreira e liderança, co-fundadora e CEO da Amazing If, empresa com missão de tornar as carreiras melhores, explica que a forma como respondemos a um pedido deve ser estanque, por oposição a deixar uma brecha para a pessoa entalar o pé e abrir caminho rumo à nossa (relutante e exasperada) concordância.
“Se [a uma solicitação] responder ‘não posso’, frequentemente, uma pessoa altamente persuasiva e assertiva vai convencê-la de que pode”, diz Tupper, pedindo aos ouvintes do podcast que imaginem o seguinte cenário: “Vamos supor que diz a alguém ‘bem, não posso ir à reunião’, ao que o interlocutor responde ‘Então, fazêmo-la um bocadinho mais curta e consegues ir, certamente.’” Sucede que, de acordo com a especialista, esta é a resposta errada. A fórmula que devemos usar não é “não posso” ou “não consigo”, mas “não vou” ou “não faço”, que são respostas muito mais difíceis de rebater ou negociar porque criam uma identificação entre nós e a nossa forma de estar e a resposta que estamos a dar.
Retomando o exemplo da reunião marcada em cima do joelho, Helen Tupper diz que a resposta deve ser qualquer coisa como: “Não vou a reuniões às quartas-feiras depois das cinco da tarde porque tenho de ir buscar os meus filhos.” Fim de conversa.