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Esta mergulhadora conta os perigos que viveu no fundo do mar. "Já tive alguns desmaios, todos eles em competições"

Carol Schrappe, recordista de mergulho em apneia, vai estar em Portugal para as palestras Diving Talks. À Máxima, recorda os perigos de mergulhar tão fundo e as emoções que viveu ao praticar esta modalidade.

Foto: Pedro Paulo Cunha
13 de setembro de 2023 Rita Silva Avelar

Carol Schrappe, campeã brasileira de free diving, e discípula de Kirk Krack (por curiosidade, o braço direito de James Cameron para o treino dos atores de Hollywood quando as cenas envolvem água), estará em Portugal para o evento Diving Talks, um congresso internacional de mergulho, que acontece entre os dias 6 e 8 de outubro. A mergulhadora, que é também fisioterapeuta, mãe, e de Curitiba, bateu o recorde mundial sul-americano de mergulho em apneia no Egipto, em junho passado, após ficar 2 minutos e 22 segundos submersa, na categoria Lastro Variável 95m. À Máxima, conta como já enfrentou a euforia de estar no fundo do mar a viver as maiores aventuras.

Carol Schrappe, recordista de apneia.
Carol Schrappe, recordista de apneia. Foto: DR

O que é que já viu de extraordinário no "fundo" do mar?

Eu já vi tanta coisa linda e maravilhosa. Nos Açores eu tive um encontro fantástico com umas raias, umas móbulas gigantes, e foi um dos mergulhos mais bonitos da minha vida, porque eu e a minha dupla mergulhámos, não muito fundo, e elas estiveram à nossa volta durante 30 minutos. Como foi mergulho livre elas não nos rejeitaram, aceitam muito mais quando não temos cilindro, não fazemos barulho, não soltamos bolhas, tal como os golfinhos. Eu também já mergulhei com golfinhos em alguns lugares do mundo, mas tive um encontro fantástico nas Galápagos no qual eu interagi muito mais, porque estava no mergulho livre, eu até vi golfinhos a mamar, porque eles me deixaram entrar dentro do meio deles, não me expulsaram para fora, o que normalmente acontece no mergulho scuba, os machos vão empurrando os mergulhadores scuba para fora enquanto as fêmeas passam com o filhotes. No mergulho livre é diferente, eles aceitam muito mais, eles vêem-nos como animais do meio, porque nós subimos para respirar como eles, descemos de novo nadamos de uma forma muito parecida, então já tive encontros fantásticos com golfinhos, raias móbulas, tubarões... No ano passado fiz uma viagem para as Bahamas para mergulhar com os tubarões tigre e com os tubarões cabeça-chata, em apneia, e foi maravilhoso.

Que episódios já viveu, mais perigosos, que possa contar? E outros mais caricatos?

Já houve vários, estou inclusivamente a escrever um livro sobre esses episódios, histórias boas, histórias não tão boas, histórias de alguns acidentes. A maioria das histórias são dos recordes que eu bati, porque há sempre uma história por detrás de um recorde e uma história do dia e durante o mergulho. Mas eu já passei por alguns percalços, algumas dificuldades no mar que eu acho que são normais, até porque nós nos estamos a adaptar a usar o nosso corpo que é feito para andar e respirar para nos metermos a mergulhar e a ficar sem respirar, é uma adaptação.

À Máxima, conta como já enfrentou a euforia de estar no fundo do mar a viver as maiores aventuras.
À Máxima, conta como já enfrentou a euforia de estar no fundo do mar a viver as maiores aventuras. Foto: Jason Washington

Nas competições tudo se torna mais duro e passível de ser mais arriscado? 

Eu já tive alguns desmaios, todos eles em competições, a tentar fazer o meu melhor, o meu máximo. Ao contrário de outros atletas, eu acho que a competição é um lugar muito confortável para mim, porque eu sei que durante uma competição tenho toda a gente a olhar para mim e a prestar atenção ao meu mergulho. Eu sinto-me muito segura durante as competições e é por isso que eu normalmente bato os meus recordes durante as competições. Há muita gente que fica com medo da competição, da própria concorrência, e isso é uma das coisas que aprendi no mergulho livre, eu vou sempre competir comigo mesma. Então eu não quero só ganhar a competição, eu quero me superar, e esses acidentes podem acontecer justamente porque estamos a falar de um desporto de limites. Hoje, na categoria mais funda que eu faço, que é o lastro variável, já desci 114 metros de profundidade em apneia e é uma das categorias mais perigosas porque é mais funda, mas eu concordei e comecei a fazer essa categoria porque eu volto para a superfície com o meu próprio esforço. Sou eu que tenho de bater as pernas, não dependo de outras máquinas nem de outros equipamentos para subir para a superfície. Eu considero uma categoria funda, mas segura. E, claro, hoje acho que sou a terceira ou a quarta mulher no mundo a ir mais fundo nessa categoria, eu orgulho-me muito de ter conseguido isso, e nessa categoria nunca tive um desmaio, até porque eu sou muito conservadora e treino sempre para ir mais fundo do que realmente vou.

Que tipo de situações de acidente, recorda algumas com precisão?

Falando de acidentes, já aconteceram alguns desmaios e eu já tive um incidente que aconteceu durante um recorde de variável, mas que eu consegui contornar. Eu fiquei presa num cabo, num cargo de mergulho autónomo que não tinha nada a ver com o meu cabo principal nem com a minha estrutura, eu consegui desenvencilhar-me depois de um tempo, mas o meu mergulho completo demorou 40 segundos a mais e eu consegui finalizar o recorde mesmo tendo que ficar a nadar 40 segundos a mais. Temos que nos preparar muito bem para tentar uma profundidade tão grande, a mais de 100 metros de profundidade, e é exatamente sobre isso que eu vou falar no Diving Talks, sobre mergulhos profundos em apneia, como é a adaptação do nosso organismo abaixo dos 100 metros, o que é que temos que fazer para levar o nosso corpo. Eu sou uma mulher de 49 anos, quase 50 anos, que consigo levar o meu corpo a um extremo como esse e eu gosto de inspirar outras mulheres e outras pessoas que a idade é apenas um número e que nós conseguimos realmente condicionar o nosso corpo e a nossa cabeça para fazer aquilo que queremos.

Como descreve a sensação de mergulhar tão fundo? Sente medo?

Eu nunca senti medo. Eu respeito muito o mar, eu sei que ele é muito mais forte do que eu. Eu não mando nada ali, não comando muitas coisas no mar, o clima, as marés, por isso eu tenho sempre um plano. Eu brinco que eu tenho um plano B, um plano C, um plano D, então normalmente nós temos vários planos contingentes, justamente para me deixar tranquila. Medo eu nunca tive, apesar de eu já ter sofrido alguns incidentes no mergulho, eu nunca tive medo de morrer ou medo de sofrer um acidente grave. Na hora eu penso sempre na melhor saída e na melhor solução e tento ficar o mais em paz possível.

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