Dating em Lisboa. "Ter namorado não é motivo de vergonha"
Ter namorado é vergonhoso? O título escolhido pela Vogue britânica para lançar o tema foi perfeito para gerar controvérsia e colocar a Internet aos gritos durante quase um mês. Confesso que só soube da polémica de Is Having a Boyfriend Embarrasing Now? quando vi um Reels da influenciadora Beatriz da Costa Bica. “Finalmente, ao fim de 26 anos, arranjo namorado e agora é cringe?”, queixava-se. Uns dias depois cruzei-me com um Reels da autora, Chante Joseph, onde defendia a sua narrativa, mas estava claramente alarmada com a quantidade de leitoras que lhe terão escrito a relatar terem terminado as relações depois de lerem o artigo. Foi quando fui finalmente lê-lo para tentar perceber o porquê do hype. Afinal, terminar uma relação devia ser algo ponderado.
Vou dizê-lo de forma clara: ter namorado não é motivo de vergonha. Mas não ter também não é. É verdade que estamos exaustas. Fazemos temporadas boy sobers e até a Rosalía admite estar a passar por um período voluntário de celibato – quer dizer, eu própria precisaria de uma pausa depois de um romance, que assumo tórrido, com o Jeremy Allen White e nem sequer o conheço. Mas está tudo bem! A pandemia deixou-nos viciadas em apps, malucas a fazer swipes no Tinder e depois do Tinder vieram mais uma dezena de outras apps. Match, match, match! A dopamina andou completamente aos saltos. O nosso sistema relacional sobrecarregou, na grande maioria dos casos aqueceu com encontros frustrados – porque nem todas tivemos a sorte da Rama Duwaji que fez match com o Zohran Mamdani -, e depois entrou em colapso. É como comer uma caixa inteira de chocolates: sabe bem, mas acaba por enjoar. Até juramos que nunca mais o vamos fazer. E depois fazemos. Com chocolates ou vinho, conforme os dias.
Concordo inteiramente com a autora quando escreve que as mulheres já não se deixam definir pelas relações amorosas e muito menos pelos homens. Existe uma mudança de paradigma, algumas de nós estão mais autónomas e focadas no seu percurso pessoal, com ou sem namorado. Concordo também que existem mulheres que preferem uma estética mais discreta na exposição dos relacionamentos nas redes sociais, seja lá por que razão for – adorei saber das preocupadas com o “mau olhado”, mas fiquei apreensiva por ler acerca das que se sente julgadas. Além disso, não podemos esquecer que existe todo um movimento que quer trazer de volta o conceito de dona de casa dos anos 50 – há até quem, estupidamente, defenda que os ferros de engomar fizeram mais pelas mulheres do que o feminismo. Só um aparte: não, não fizeram. Já os homens que levam as camisas para engomar fora, ou as passam eles próprios, são uns santos. Por isso, o caminho não é linear. Quando abro o meu Instagram, encontro equilíbrio: mulheres que discretamente partilham pormenores das relações e mulheres que expõem abertamente namorados, maridos, filhos e famílias. E cada uma é livre de o fazer. Apesar de tudo, o meu algoritmo tem este equilíbrio, embora ninguém tenha o mesmo algoritmo.
Não escrevo este artigo como a iludida que ainda não tem namorado, mas que, quando tiver, vai encher a Internet de content amoroso até mais não. Mas não o vejo com embaraço. Faço parte dessa geração de mulheres emancipadas para a qual a Chante escreveu. As mulheres independentes, que se sentem realizadas profissionalmente, algumas com casa própria (se conseguirem), que têm a terapia em dia, e estão saturadas de namorar. Mas também acredito no poder do amor e das relações. E não quero ser cancelada por publicar fotografias com o meu namorado - embora isso dissesse mais sobre quem me bloqueia do que sobre mim.
Na perspectiva de uma mulher heterossexual solteira, parece-me muito seguro afirmar que ter namorado é boring ou motivo de chacota, que é mais fixe ser solteira e empoderada, reunir um grupo de amigas celibatárias e pertencer a um exército, do que expormo-nos a frustração, mágoa e desgosto. Porque o amor tem essa coisa chata de só existir na vulnerabilidade e quando vejo os testemunhos e as reações ao artigo temo que as mulheres estejam apenas a construir armaduras, não autodesenvolvimento. Depois de anos a correr atrás da atenção dos homens, agora parece que os odiamos. Mas será que estamos realmente a escolher-nos? Ou só estamos a fechar a porta porque estamos desiludidas?
Por isso, para mim, a questão não se prende com ser ou não vergonhoso ter um namorado, nem se o devemos divulgar nas redes sociais. Prende-se com a razão pela qual o fazemos, ou não. Ter namorado não nos torna melhores, superiores ou mais completas. Mas ser autossuficiente talvez torne. Quando vemos uma mulher independente numa relação sabemos que está realmente apaixonada. Não está à procura de alguém com quem dividir a renda ou a agarrar-se a uma relação vazia ou tóxica por medo da solidão e da tormenta que é enfrentar a família sozinha no jantar de Natal depois dos 30 anos. Tem sido essa ideia que tenho tentando demonstrar através desta crónica, assumindo as minhas idiossincrasias, mostrando como muitas vezes sou a saudável e noutras, a tóxica. O meu estilo de apego desorganizado existe e a razão pela qual as minhas relações falham não é só porque “os homens não prestam”. Acho que não devemos diabolizar os homens quando nós próprias também temos os nossos issues. Então, namorado? Talvez. Vergonha? Só se for da Internet.