As meninas e adolescentes sonham com uma casa - mais do que com um parceiro
Nem príncipes encantados, nem histórias de amor, nem sequer filhos. De acordo com o estudo Girls’ Attitudes Survey 2023, um teto e quadro paredes é o que as raparigas entre os sete e os 21 mais desejam.

Cada vez mais tristes, mais ansiosas e mais descontentes com a sua imagem: assim se sentem as meninas e jovens com idades entre os sete e os 21 anos. Estão muito preocupadas com as alterações climáticas e, ao mesmo tempo, zangadas com os governos e as gerações mais velhas por lhes deixarem em herança um mundo à beira do abismo. Mas nem tudo é revolta: a maioria destas jovens está hoje mais interessada em arranjar uma casa do que um parceiro – só não é claro se isto é consequência do empoderamento feminino ou da crise da habitação. Estas são algumas das principais conclusões do estudo Girls’ Attitudes Survey 2023, desenvolvido pela Girlguiding – uma ONG britânica que todos os anos, desde 2009, pergunta a meninas, adolescentes e jovens mulheres o que sentem sobre as suas vidas.
Embora haja alguns motivos de otimismo, na sua grande maioria os resultados são preocupantes. Embora tenham ocorrido algumas melhorias, este estudo demonstra que, em demasiados aspectos, nos últimos 15 anos, a vida destas crianças e jovens tem vindo a piorar. E se é verdade que o Girls’ Attitudes Survey 2023 foi baseado num inquérito feito a 2000 crianças e jovens do Reino Unido, muitas das suas conclusões são universais e, certamente, aplicáveis a meninas e adolescentes portuguesas e, portanto, dignas de reflexão.
Mas vamos aos números. 89% das questionadas, entre os sete e os 21 anos, dizem sentir-se frequentemente stressadas, preocupadas e ansiosas, um número de compara com 78% em 2016. As suas principais preocupações estão relacionadas com resultados escolares, encontrar um bom emprego, as alterações climáticas, elas ou a família não terem dinheiro suficiente para sobreviver, assédio sexual e com a necessidade de terem corpos e rostos perfeitos. Na verdade, cada vez mais meninas reportam ser alvo de comentários negativos sobre a sua aparência: 69% dizem ter passado por isso, um número que compara com 49% em 2016. Por outro lado, o número de raparigas que dizem ouvido comentários sexistas nas redes sociais duplicou desde 2018 e 2013. Das adolescentes e jovens entre os 11 e os 21 anos, 81% dizem ter experienciado situações ameaçadoras ou perturbadoras online, um valor que compara com 65% em 2018.
Resultado? Hoje, apenas uma em cada cinco raparigas diz ser muito feliz, quando, em 2009, duas em cada cinco diziam sê-lo. Ou seja, se em 2009 9% das raparigas diziam não ser felizes, em 2023 essa percentagem saltou para 25%. E foi no grupo de idades entre os sete e os 10 anos que o decréscimo de felicidade foi mais notório: de 57% de meninas felizes em 2009, passamos para 28%.

É nas perguntas sobre o custo de vida que o estudo obtém alguns dos resultados mais comoventes. Por exemplo, nas crianças entre os sete e os 10 anos, 35% tenta não pedir coisas aos pais. Um número que sobe para 51% nas meninas entre os 11 e os 16 anos, e 53% nas jovens entre os 17 e os 21. Metade das raparigas entre os 11 e os 16 anos dizem que os pais falaram com elas sobre a necessidade de gastar menos dinheiro. E isso inclui poupar em atividades extra-curriculares, algo que 18% das meninas entre os sete e os 16, e 27% das jovens entre os 17 e os 21, dizem passar-se nas suas famílias. A conclusão é que 75% do número total de meninas e raparigas questionadas dizem estar muito preocupadas com o aumento do custo de vida.
Já as redes sociais são algo que, na sua maioria, estas jovens vêem como uma faca de dois gumes. Se, por um lado, as fazem sentir empoderadas para dar a sua voz a causas que as preocupam (48% das raparigas entre os 13 e os 21 dizem ser esse o caso), por outro, mais de 8 em cada dez raparigas entre os 11 e os 21 acham que há demasiadas discussões online sobre corpos femininos. As consequências são preocupantes: 67% das raparigas neste intervalo de idades tem vergonha do seu aspeto por não se enquadrar nos padrões de perfeição das redes sociais; 68% gostariam de ser mais magras; 48% saltam refeições para perder peso; e 37% deixam de participar em atividades que consideram divertidas por estarem desconfortáveis com a sua aparência.
Apesar de todo este cenário pouco animador, há alguns motivos para celebrar. Um deles é o facto de sentirem que estão a criar laços mais fortes com as suas comunidades. Se, em 2011, 29% sentia uma ligação com os seus vizinhos e concidadãos, hoje esse número passou para 35%, com 58% das raparigas entre os 11 e os 21 a participar em ações de voluntariado. Muitas fazem-no em prol do planeta, com 9 em cada 10 a considerar que todos temos a responsabilidade de poupar energia, reduzir a quantidade de coisas que descartamos e proteger o ambiente. Aliás, 65% das adolescentes e jovens entre os 11 e os 21 anos estão zangadas com os adultos por terem danificado o ambiente, empurrando para a sua geração problemas que já deviam ter sido resolvidos – um número que compara com 38% em 2018.
É também no campo das aspirações que o estudo mostra algumas evoluções positivas – ou que poderão ser positivas, dependendo dos casos. Para começar, menos meninas e jovens mulheres têm como objetivo primordial para as suas vidas arranjar um parceiro e ter filhos. Se, em 2009, 60% queria chegar aos 30 anos casada ou com um parceiro ou parceira, em 2023 essa percentagem desceu para 48%. Hoje, o que as raparigas mais querem é chegar aos 30 anos com uma casa, com 52% a indicar ser esse o caso. Por outro lado, em 2009, 47% das raparigas tinha como objetivo de vida chegar aos 30 com filhos; hoje, apenas 33% diz o mesmo.

Quando pensam no seu futuro, as maiores preocupações destas raparigas são: não conseguirem comprar uma casa (59%); não terem dinheiro para pagar renda e, portanto, terem de ficar em casa dos pais (55%); e receberem menos dinheiro que os homens da sua idade para fazerem o mesmo trabalho (50%). Como as compreendemos…

Mundo, Discussão, Girls’ Attitudes Survey 2023, Estudo
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