Rita Torres-Baptista. Muito mais que um rosto feminino na liderança da NOS
O festival NOS Alive foi o mote para uma conversa com a gestora de 48 anos, que é diretora de marca e comunicação da NOS. Uma entrevista franca, onde o assunto BES não foi tabu. O seu maior desafio profissional, ensinou-lhe, pois, o que já desconfiava: que temos muito a aprender com o insucesso.
Foto: Vitor Chi06 de julho de 2022 às 19:42 Máxima
O ponto de encontro é uma instalação no meio do recinto do NOS Alive, na véspera da abertura do festival ao público. Há ainda muito trabalho por fazer e toda a gente parece compenetrada e pouco disponível. Exceto Rita Torres-Baptista, que nos recebe com um sorriso imenso. Temos pouco tempo, mas a diretora de marca e comunicação da NOS não se mostra atrapalhada na entrevista à Máxima. Pelo contrário, é rápida, assertiva e muitas vezes, difícil de acompanhar – num bom sentido.
Esta é uma edição especial para o NOS Alive, após dois anos de interrupção pandémica. A promessa? O melhor cartaz de sempre. Magia viva, que só se consegue na junção da arte ao rigor, através do esforço conjunto de muitos intervenientes. É talvez o que nos chama mais à atenção na gestora, que fala sempre no plural e em quase todas as questões remete para o valor do trabalho em equipa.
Com uma carreira vasta, onde o mérito e a experiência multicultural parecem ter tido um peso grande, fala-nos da importância do questionamento constante, de um sucesso que se orienta pela clareza e de um propósito de vida que alia felicidade e utilidade – só assim faz sentido. Já com gravadores de voz desligados desvenda: "somos entregues ao mundo não só para ocupar espaço e consumir ar, mas para acrescentar algo". Ei-la.
Qual o seu papel enquanto diretora de marca e comunicação da NOS? Como é um dia de trabalho para si?É ser guardiã do propósito da marca, da sua razão última de ser, da sua visão e missão. É dar mais vida à vida, expandindo todas as ligações possíveis e imaginárias, cada vez mais ligados. A marca é uma ponte entre o negócio e as pessoas, uma promessa entregue.
E falo em ser guardiã no plural, num trabalho de equipa intenso e mobilizado para o mesmo propósito. O meu dia de trabalho começa na véspera. Nunca termino o dia sem refletir sobre o que atingimos, o que não correu tão bem e como podemos desenhar o dia seguinte. Sou fiel à minha lista de to-dos e a este momento de análise e planeamento.
Uma área que trabalha com tecnologia e suas possibilidades, é uma área muito poder. Como se gere este mesmo poder e se consegue a inovação no setor?
Sempre com a bússola sem perder de vista o Norte, isto é, o propósito. Com inspiração nas necessidades que temos enquanto pessoas e sociedade e pensando numa tecnologia for good: ética, inclusiva e comprometida com os desafios do presente e do futuro. Existimos com a missão, cada vez mais importante, de possibilitar um mundo e uma vida mais ligada.
Para isso é necessário expandir o acesso o mais universal possível às ligações que já conhecemos – pensemos nos conteúdos, na internet, no streaming, ontem o videoclube – e imaginando ligações que até aqui eram impossíveis, como uma cirurgia à distância ou uma ida à lua em realidade virtual. Esta mobilização pelo propósito é vivida pela NOS no coletivo, através de um trabalho de equipa que, com precisão Suíça de um mecanismo de relógio, entrega a experiência, cumprindo e surpreendendo.
Depois de dois anos de interregno, há uma grande expetativa para este NOS Alive. É uma pressão acrescida? O que é que o público pode esperar?
A verdade do NOS Alive. O melhor cartaz sempre. A energia festiva entregue em cada dia, sob o sol quente da tarde, o céu laranja da magic hour e o calor humano da madrugada. Tudo isto potenciado pelo desejo da espera. Finalmente, The Dream is Alive. A emoção da música ao vivo, que se consome ali, ao mesmo tempo que toma conta das redes, que se partilha e amplifica. Vive-se no Instagram, no TikTok, no Facebook, em lives e em selfies. É um volume de uploads e downloads como nunca antes se viu. Todos ligados, por esta rede que a NOS instala no recinto e que faz dele uma cidade 5G.
Numa altura em que os festivais musicais proliferam, como é que o NOS Alive se distingue?
É único, icónico, admirado, desejado e vivido com a maior intensidade. Faz parte da agenda das emoções da música e do verão. E merece toda esta reputação porque foi pensado com a mesma dose de sonho e de rigor. Um produto tão artístico quanto técnico. Há uma magia que traz 60 mil pessoas por dia ao recinto e todos os conteúdos que ganham asas próprias em social media.
Catorze edições de um festival dizem muito. Sólido e com uma identidade muito própria, consegue combinar gigantes da música internacional com nomes que vêm a explodir, mais tarde. Este ano existe uma maior expressão internacional, com centenas de nacionalidades presentes no evento. A experiencia para o público é renovada e melhorada a cada ano, e a NOS a contribuir para isso mesmo.
Como foi pensado o cartaz para este ano? Quem são as grandes apostas? Que atividades de entretenimento paralelas vão existir no recinto?
O promotor é o curador do festival, é dele todo o mérito na escolha deste cartaz de luxo, que promete fazer o melhor regresso de sempre. O cartaz está repleto de uma imensa diversidade de artistas, dos mais variados géneros musicais, aos quais se juntam também grandes nomes do humor nacional, num total de mais de 154 atuações.
Destaco o enorme talento português – Dino de Santiago, Pedro Mafama, Rita Vian, Eu Clides, e o facto de pela primeira vez termos um cabeça de cartaz nacional – Da Weasel. Pessoalmente, o que eu não vou perder: Florence & The Machine, Jungle, War on Drugs, The Strokes, Stromae, Jorja Smith, e claro, Da Weasel. É sempre emocionante ver uma reunião depois de tanto tempo e testemunhar a emoção dos fãs.
Os influenciadores têm um enorme papel nesta era digital. Como se gerem estas parcerias e que caras podemos ver associadas ao festival?
Prometemos a 1400 clientes NOS um pé no NOS Alive para que possam viver esta experiência única. Se fosse possível, seria uma experiência para todos. Os influenciadores abrem janelas sobre o NOS Alive, com o olhar singular de cada um e a riqueza da diversidade de todos. São eles próprios os produtores de conteúdos, o que torna ainda mais valiosa esta rede de partilha. A sua ajuda permite levar mais longe (e de forma inclusiva) o NOS Alive.
Foto: Vitor Chi
Quais os highlights que destaca ao longo destes 25 anos de carreira? Teve mentores que a orientaram?
Trata-se de uma carreira intensa, marcada por desafios muito ricos e formativos, quer profissional quer pessoalmente. Os mentores foram e são ainda hoje muitos e reúnem a minha admiração, respeito e confiança. Por razões diversas e em momentos distintos - da infância, a começar no meu pai, até hoje. Souberam acordar o melhor em mim, ensinando-me a replicar o mesmo. Mas também a perceber a empatia.
O meu primeiro desafio profissional foi muito marcante. Liderei, em 1999, o lançamento do primeiro site de e-commerce português. O Pingo Doce online. Foi uma experiência extraordinária. Uma grande aposta em mim e na equipa que construi de raiz. Uma folha em branco, onde tudo era possível e onde a criatividade, a inventividade, a estrutura, o rigor e a capacidade de execução se fundiam. Tenho a sorte de ter tido bons mentores e equipas fortes, em que a aprendizagem é fluida e se faz em todas as direções. Na Academia, tive sempre um motor de propulsão e de auto-desafio, seja na muito sólida formação de base da Católica, INSEAD, Cornell, e em 2012, HEC. E aprendo em contínuo como docente, na investigação obrigatória, na procura de relevância, na utilidade da partilha da experiência, tanto com os alunos de Mestrado como Executivos. É uma compatibilização desafiante, mas muito ganhadora.
Como descreveria o seu percurso académico/profissional? Foi fácil escolher o caminho a seguir?
Queria ser gestora, sempre senti essa vocação. Ainda tive durante muito pouco tempo a ideia de ser bailarina [sorri]. A Católica, o INSEAD e a HEC deram-me a base sólida para abraçar desafios complexos, exigentes e com o denominador comum de centros de decisão nacional, sem perder o impacto internacional. Propósitos mobilizadores, setores-chave no país, setores competitivos, objetivos claros e equipas muito profissionais. Giro como empreendedora, no rigor e no desassossego. E é este o mindset que procuro sempre inspirar nas equipas e nas relações de parceria: um grande foco no porquê, uma grande clareza nos objetivos e a dose útil de tomada de risco. A cultura de utilidade e de resultados, mas também inconformismo.
Esteve sempre ligada a grandes empresas - Jerónimo Martins, Banco Espírito Santo, Novo Banco, NOS. Está, hoje, como peixe na água?
Estão no centro de decisão nacional. Há ambição nestes setores e nestas marcas, um compromisso com o impacto real, uma cultura onde a estratégia e a ação se concentram para acrescentar valor. Novamente, a possibilidade da folha em branco, a criatividade. É saber onde começamos, mas sentir que temos na mão a possibilidade de construir. Nestas marcas fortes, a construção de valores intangíveis faz verdadeiramente diferença na capacidade de persuasão. Aqui, acredita-se no talento e pratica-se este acreditar.
Esteve mais de 10 anos na Banca e passou pela transição do BES para Novo Banco. Foi um dos grandes desafios da sua carreira? Que outro desafio destaca?
Foi, claro. Foi um desafio de marca no seu sentido mais puro. Restaurar uma promessa, procurar a confiança num contexto extremo. Foi um enorme desafio de superação, vivido em grupo. Provavelmente, o desafio que em toda a minha vida profissional vi abraçar com maior coesão de grupo. Esta situação de crise extrema que não foi feliz, deu-nos uma grande clareza. Esta clareza do objetivo e a sua importância estratégica mobilizou-nos e deu-nos a base do sucesso. Sucesso este, medido na dimensão exata da viabilidade do banco. Sem confiança, sem continuidade, sem transferência de valores de marca, não teria sido viável o Novo Banco.
A verdade é que na gestão, o desafio é renovado todos os dias. É assim também na NOS, na procura de sermos úteis e relevantes, acrescentando mais às vidas das pessoas neste mundo, cada vez mais ligado. Na NOS trabalhamos todos para ser uma rede de suporte à vida: das pessoas, das empresas, do país. É uma grande responsabilidade.
Foto: Vitor Chi
Quais as maiores dificuldades que uma mulher atravessa para chegar a um cargo de liderança hoje e se com a sua posição de destaque pretende ser uma voz para essetipo de questões. De que forma é que essas preocupações se refletem numa marca como a NOS?
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Nunca senti dificuldade por ser mulher, nem enquanto estudante, nem como jovem profissional ou hoje. Acredito no mérito, nas skills e nas competências, no trabalho e sobretudo na procura incessante pela clareza, que nos dá direção e inspira soluções úteis. Escolhi sempre desafios onde eram estes os valores que pontuavam. A clareza não tem género. E é poder.
A NOS é profundamente diversa. As minhas equipas são diversas. A diversidade, que está muito para lá do género, é absolutamente crítica à sensibilidade relevante e à harmonia final que vem da disputa de pontos de vista, de ângulos complementares em que nada fica por explorar. Quero fazer parte de um mundo em que as oportunidades são para todos e em que reconhecemos e atuamos com compromisso sobre os freios que ainda existem. Sem demagogia e com a convicção do valor acrescentado da pluralidade.
Como é ser uma líder feminina hoje?
Os desafios da liderança são muitos e hoje têm contornos mais complexos. Pela velocidade, pelas interações, pela exponenciação que nos traz o alargar da própria fronteira de possibilidades. Nada se decide ou explica com duas variáveis. E no mundo dos algoritmos e da inteligência artificial, a intuição ainda é uma ferramenta chave do repertório da liderança.
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Não enfatizo o feminino. Mas antes o humano, o desafio da gestão humanizada. O líder é como um guardião da clareza – algo que é ele que tem de encontrar – para depois, como um maestro de orquestra, inspirar e orientar as entregas individuais [de cada pessoa da equipa] que fazem o todo mágico.
No Linkedin termina com uma crença pessoal e escolha: "O objetivo da vida é ser feliz e útil". Como é que isto se consegue?
Meditando para alcançar também esta clareza. Ser feliz implica percebermos quem somos, respeitarmos a nossa verdade, ao mesmo tempo que aceitamos os nossos limites. Para que, dentro destes limites, nos sintamos satisfeitos. Temos tudo e nunca chega. Ser útil é termos o compromisso de contribuir, em esferas concêntricas que vão desde cada um de nós - por exemplo a nossa saúde - à nossa família, à nossa equipa, à nossa empresa, ao nosso bairro, ao nosso impacto coletivo. Acredito que a felicidade e utilidade andam de mãos dadas e que a pergunta "sou feliz e útil?" é boa conselheira.
O que significa o sucesso para si? Como o mede e celebra?
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O sucesso último podemos dizer que é sermos felizes e úteis. É um exercício diário, que vai para lá dos tableaux de board, dos KPI’s (Key Performance Indicator) e de todos os acrónimos que inevitavelmente nos dão o score. Trata-se de um exercício simultâneo de introspeção e de comunicação, mas também de feedback e escuta. Celebra-se com tchin-tchins, claro, mas mais ainda com a rede de confiança que ganhamos quando praticamos esta ideia de sucesso nas equipas. Sem medo do insucesso, que é igualmente bom conselheiro. Aliás, o insucesso é extraordinário para perceber o que falhou, o que está entre nós e o sucesso,