Nudismo e porcos de asa delta

“Olhámos para o céu e vimos dois tipos de asa delta a sobrevoar o lugar. Aos assobios juntaram piropos inapropriados sobre as nossas partes íntimas”

Foto: D.R
02 de agosto de 2021 às 12:04 Cláudia Lucas Chéu

Não pratico nudismo. Na adolescência fui uma vez à praia de nudistas com uma amiga, a Sandra, que queria ser modelo e que praticava nudismo para evitar as marcas inestéticas de tom de pele do fato-de-banho. Nunca achei desagradável à vista ficar com o pipi e as mamocas mais branquinhos quando comparados com o tom dourado do resto do corpo. Pareciam uma espécie de preciosidades, assim distinguidos pela candura leitosa graças à protecção solar que oferecia o tecido da roupa de banho. Quando fui com a Sandra à tal praia de nudismo, tínhamos talvez uns 17 ou 18 anos, achei a experiência bastante desconfortável. O sol aquecia-me demasiado os mamilos, já de si bastante sensíveis, e a areia alojava-se em partes menos disponíveis aos intrusos e ásperos grãos, causando-me um desconforto claramente palpável. A única parte positiva consistia na ida ao mar, nos banhos. Nadar nua foi um prazer e uma experiência de liberdade. Mesmo que a entrada no mar nos fizesse sentir que os mamilos se iam tornar estalactites polares, prestes a quebrar a qualquer momento. Depois de passado o desconforto do choque térmico nas partes mais sensíveis, a experiência de nadar no mar em pelota foi absolutamente libertadora.

Já a estadia nas toalhas parecia-me uma ida à tostadeira avariada. A melhor forma de aguentar o calor era ficar deitada de barriga para baixo. Deixando as nádegas e as costas aguentarem o chapão incandescente. Posso dizer que fiquei com um escaldão enorme no rabo, mesmo tendo reposto a protecção solar com regularidade; duas nádegas a combinar com a bandeira do Benfica. Claro que não tínhamos chapéu de sol, alguma vez duas adolescentes se dariam ao trabalho de acartar com tal objecto? Já para não falar da falta de estilo que os mais jovens associam à sombrinha. Para os adolescentes, um guarda-sol é um adereço para mães e avozinhas ou bebés ainda de fralda. A Sandra gostava de fazer nudismo mas não apreciava ficar ao pé de pessoas. Por isso, tivemos de andar quilómetros no areal até não avistarmos mais ninguém. Nessa tarde, à hora do almoço, estava eu de rabo literalmente virado para o céu e a Sandra a bronzear as suas morenas e generosas mamas, quando começámos a ouvir assobiar. Olhámos em volta e não vimos ninguém. Coisa estranha, não percebíamos de onde tinha vindo o assobio quando este tornou a ouvir-se. Olhámos para o céu e vimos dois tipos de asa delta a sobrevoar o lugar. Aos assobios juntaram piropos inapropriados sobre as nossas partes íntimas. Eu tinha um lenço na cabeça a cobrir o sol e tirei-o imediatamente para tapar o rabo. A Sandra pôs-se de pé e enrolou-se na toalha. Começou a gritar alguns dos impropérios que tínhamos recebido em direcção aos mirones voadores. «A tua mãe é que tem uma bela peida, ó cabrão.» Pedi-lhe que se calasse. Afinal eram dois tipos que podiam descer das asas delta e nós estávamos ali nuas, a quilómetros de outros nudistas. A Sandra não se calou, enrolada na toalha cor-de-laranja, gritava a plenos pulmões. «A vaca da vossa mãe é que tem umas grandes tetas, ó filhos da puta.» Felizmente os tipos não lhe ligaram nenhuma e foram voar para outra freguesia. A Sandra mostrou-se orgulhosa por tê-los afugentado e eu jurei que seria a minha primeira e última vez de nudismo. Não estava para levar com aquilo: escaldões e porcos voadores. Dei assim por encerrada a minha experiência no nudismo. 

*A cronista escreve de acordo com o Acordo Ortográfico de 1990. 

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*A cronista escreve de acordo com o Acordo Ortográfico de 1990. 

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