'Morte no Nilo'. A magnífica adaptação da obra de Agatha Christie, do guarda-roupa ao elenco

Um thriller sobre um caso de amor obssessivo e um homicidio do qual todos se tornam suspeitos. Conversámos com Paco Delgado, designer de figurinos, e Wakana Yoshiara, designer de cabelo e maquilhagem, para descobrir tudo sobre o processo criativo na idealização das personagens.

Foto: 20th Century Studios
10 de fevereiro de 2022 às 17:01 Ana Filipa Damião

O ano é 1937. Em vez de estarmos sentados numa sala de cinema algures em Portugal, acabámos de embarcar numa aventura pelas águas do Nilo, no Egipto. Nesta aventura, que na realidade é um thriller de mistério baseado no romance clássico de Agatha Christie, seguimos um grupo de possíveis assassinos, ao lado do infame Hercule Poirot (Kenneth Branagh). Antes tranquilas, as férias do detetive belga são interrompidas quando este se vê embrenhado num triangulo amoroso perigoso. 

Tudo começou quando Simon Doyle (Armie Hammer) trocou a sua noiva Jacqueline de Bellefort (Emma Mackey) pela amiga de infância desta, Linnet Ridgeway (Gal Gadot), uma mulher de negócios com uma riqueza substancial. Desde então que o recém casal se encontra em constante fuga de Jacqueline, que jurou desfazer os apaixonados. A pensar que estão a salvo, decidem fazer a lua de mel num cruzeiro pelo Nilo, acompanhados pelos amigos, família e empregados de Linnet. Mas nem tudo é o que parece e a estrela principal acaba por ser assassinada. Poirot acredita que todos são suspeitos, e dá início a uma longa investigação. Assim é o enredo de Morte no Nilo, realizado por Kenneth Branagh e escrito por Michael Green.

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Foto: 20th Century Studios

Podia encher uma página (por assim dizer) a descrever a obra, desde a performance no ponto dos atores aos cenários de tirar a respiração. Contudo, para quem gosta de Moda, o que prende rapidamente a atenção, logo na primeira cena, são os looks inspirados nos anos 30. O objetivo nunca passou por retratar pormenorizadamente a época, e sim manter uma pitada de modernidade em Morte no Nilo, algo que Paco Delgado, responsável pelo guarda-roupa e vencedor de vários prémios pelo seu trabalho em filmes como Os Miseráveis ou a A Rapariga Dinamarquesa, e Wakana Yoshiara, responsável pelo cabelo e maquilhagem (fez o mesmo em Spencer e Belfast), conseguiram criar na perfeição.

"Quando conversei com Kenneth, no início, ele disse-me que queria um filme da época que fosse apelativo para o público. Queríamos criar um ambiente mais contemporâneo e o que fiz foi olhar para a Moda da altura e ver o que se adaptava melhor ao nosso estilo atual", contou Delgado em entrevista à Máxima. Como tal, os looks estabelecem a hierarquia social da década de 1930 ao mesmo tempo que refletem os atributos de cada personagem, numa fusão flawless de moderno e vintage. "Relativamente aos penteados, concentrei-me em introduzir algo que fosse mais historicamente correto, mas em relação à maquilhagem, tentámos fazer algo que chegasse mais às pessoas", acrescentou Yoshiara.

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Foto: 20th Century Studios

Quanto à paleta de cores geral, a resposta pareceu óbvia: tons claros de verão, como cremes e azuis, e tecidos leves. Cada personagem tem um estilo muito próprio - ora sofisticado, como Euphemia Bouc (Annette Bening), amiga de Linnet, ora mais extravagante e boémio, como a cantora Salome Otterbourne (Sophie Okonedo), ora mais prático e conservador, como a empregada Louise Bourget (Rose Leslie), o médico Linus Windlesham (Russel Brand) ou a sobrinha de Otterbourne, Rosalie (Letitia Wright). De facto, o guarda-roupa é de sonho: temos vestidos acima do tornozelo, blusas com colarinhos, mangas com pregas nos ombros e costas nuas. Os homens deslumbram num estilo clássico mas descontraído, digno de férias.

Foto: 20th Century Studios
Foto: 20th Century Studios

"Desde o início que pensei que Linnet e Jacqueline eram personagens conflituosas. Elas são o centro dos problemas que acontecem no filme", contou-nos Delgado. "Queria mostrar que Linnet é uma mulher mais frágil, com cores mais pálidas, mais sofisticada de alguma forma. Pensei no facto de as pessoas que se vestem sempre de branco têm mais dinheiro ou alguém que lhes lave a roupa", porque naquela altura trocavam de roupa 3 a 4 vezes por dia. Para a maquilhagem, Yoshiara inspirou-se em figuras da década de 40 como Barbara Hutten e Katharine Hepburn, isto porque Linnet tinha sem dúvida "mais estilo e era uma trend setter."

Foto: 20th Century Studios

Por outro lado, e para contrastar com o estereótipo de estrela de cinema milionária, Jacqueline foi imaginada em tons de vermelho, com um look intemporal inspirado na fotógrafa Lee Miller. "Achei que ela era uma personagem mais forte, era mais apaixonada de alguma forma, porque era movida pela força do amor e também da traição.", explicou Delgado. Através das cores quentes, "conseguimos ver a raiva dela. Linnet está preocupada, mas mantém a calma, e Jacqueline está verdadeiramente zangada."

Foto: 20th Century Studios

Curiosamente, grande parte da entrevista levou-nos a um look em específico - o vestido de casamento de Linnet combinado com o famoso Tiffany Diamond de 128 quilates, recriado exclusivamente para a ocasião. O diamante amarelo original foi encontrado em 1877 e adquirido um ano mais tarde pelo fundador Charles Lewis Tiffany. "É uma peça impressionante de um estatuto lendário. Foi usada antes por Audrey Hepburn e Lady Gaga. É uma peça que mostra quão importante e rica é a pessoa."

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Foto: 20th Century Studios
Foto: 20th Century Studios

O vestido em tons de pêssego foi uma das peças que Delgado mais gostou de criar, e também uma das mais complicadas, embora o designer jure que não achou difícil de todo desenhar os figurinos do filme. "Muitas coisas não estavam planeadas, estávamos a trabalhar todos juntos e isso foi fantástico." O vestido era feito em chiffon e teve de ser tingido até ter a cor certa, revelou. "Tivemos de pintar pássaros a voar e depois bordar por cima. Parece muito simples, mas não é." Os outfits divertidos de Otterbourne e os de Linnet e Jacqueline no clube de jazz fazem ainda parte da lista dos looks de eleição de Delgado.

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Foto: 20th Century Studios

Por fim, não podemos falar sobre um filme com Poirot sem mencionar a sua personalidade inquietante, o icónico bigode e, spoiler, a cicatriz escondida pelo mesmo. "Houve sangue, suor e lágrimas para chegarmos àquele bigode. Acho que tivemos 12 protótipos", disse Yoshiara. "Acho encantador que se possa ver que existe uma razão por trás [do bigode], que não é apenas um fashion statment

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