Ah, a quadra natalícia! A época mais mágica do ano, quando o aumento da taxa de depressão deve ser proporcional ao número de pessoas que se enrola com os colegas de trabalho no jantar de Natal da empresa. Bem sei que parece uma piada de mau gosto, mas falo por experiência. É que sobre a embriaguez e as luzes amarelas até o Carlos da contabilidade adquire um outro encanto – e não, não me envolvi com o Carlos da contabilidade porque isso seria demasiado cliché até para mim. Ele é casado e acabou de ser pai pela segunda vez. Enrolei-me com o fulano novo, porque é mais bonito e bem cheiroso.
O novo colaborador, cujo nome é pouco relevante para o decorrer desta história e, por isso, será designado de "fulano", integrou a equipa no verão. Inicialmente, algumas pessoas questionaram a sua sexualidade. "Não achas que fulano pode ser gay? Ele tem uns tiques estranhos". Fulano também tem demasiados amigos homossexuais e um grupo de amigos predominantemente feminino, o que pode levantar algumas suspeitas, de facto. E é pequenino, esguio e gosta de usar dobras nas calças de ganga. Eu própria questionei, eventualmente, mas uma mulher sabe quando o seu rabo é objeto de observação. E quando uma mulher não sabe tem sempre uma colega que envia mensagem a alertar: "Levantaste-te e fulano babou". E fulano foi babando durante todo o verão, enquanto construíamos uma relação de proximidade. A pouco e pouco fui-me tornando a sua work wife e ele o meu work husband. O Whatsapp estava sempre aberto para podermos trocar mensagens e acreditem: os homens gostam tanto de uma boa coscuvilhice quanto as mulheres, só não o admitem. Talvez seja do signo. Fulano é Gémeos, como eu. E os Gémeos adoram uma boa dose diária de corte e costura.
Mas embora fulano fosse muito dado, não se dava em demasia. Certa vez tentei fazer planos. Convidei-o para o teatro, mas respondeu que não podia nesse dia. Não dei importância. Afinal, fulano parecia ser muito ativo socialmente. E era. Só não comigo. Os meses foram passando e nada de especial foi acontecendo, mas existia uma química inegável entre mim e fulano. Estava ali. Diariamente. E tornava-se mais evidente quando saímos entre colegas para beber um copo ou jantar. Fulano sentava-se sempre ao meu lado ou à minha frente. Partilhávamos entradas e sobremesas. Recordo-me de certa vez fulano dizer que queria sobremesa e eu responder que já tinha pedido pelo dois, o cheesecake de manteiga de amendoim. "Boa escolha, Maria!". Uma sobremesa, duas colheres. Conta como partilha de intimidade? Eu achei bastante romântico.
No jantar de Natal tive de me vestir de árvore de Natal e fazer um discurso sobre como apenas era montada uma vez por ano. Era temático, tínhamos de interpretar personagens e cumprir desafios. A mim calhou-me uma árvore de Natal que odiava o Natal, depressiva e que estava sempre de copo na mão. Poderia ter-me calhado uma figura melhor? Bebi copos atrás de copos, e incorporei o espírito Grinch em versão arbusto perante a figura patética que fazia em prol do corporativismo laboral. No fundo, apenas tive de me manter fiel a mim própria nesta altura do ano. Ser rabugenta, rezingar com as pessoas e ter bolas e luzes espalhadas pelo corpo – nada a que não esteja habituada. Fulano foi uma rena básica. Adorável, mas uma rena básica que não cumpriu nem metade dos desafios. Já eu fui tão credível que saí vencedora. Ganhei um cupão de 20% de desconto para outros Escape Rooms que deitei no lixo assim que tive oportunidade.
Mais tarde, num bar de karaoke, fulano e eu cantámos músicas românticas de microfone em punho. Eu esganicei nos tons agudos, fulano arrasou nos graves. Quando dei por nós bebíamos do mesmo copo e alguém perguntava: "Mas o que se passa entre aqueles dois?". Aqueles dois estavam prestes a incorrer em pecado empresarial. Bebida demais, fui à casa de banho e quando abri a porta fulano estava do outro lado. Sorriu e disse algo que não percebi. Decerto, fora confirmar se estava bem. Puxei-o para dentro e beijei-o – era a última oportunidade que tinha de acabar com os equívocos e chegar ao Fim de Ano enamorada. Ele resistiu ao início para depois se entregar com satisfação. E do pescoço as mãos foram descendo, apoderando-se do meu rabo. Nos entretantos, uma delas subiu e acariciou-me o seio. A mão gelada arrepiou-me o mamilo e todo o meu corpo tremeu. O desejo que vinha crescendo desde o verão ganhava forma naquele momento. Porém, quando tentei enfiar a mão nas suas calças, afastou-se bruscamente e num tom assustado disse: "Maria, não podemos fazer isto. Ainda estou à experiência. Posso ser despedido!". Compôs-se, e sem dizer uma palavra saiu porta fora. A noite acabou ali. Ele que queria seguir para o Trumps comigo desistiu. E o pequeno grupo que estava disposto a continuar a festa resignou-se. Na manhã seguinte, entre Gurosan e copos de água, a colega atenta perguntou-me o que tinha acontecido. Contei desavergonhadamente e perguntei o que achava. "Eu disse-te que fulano era gay. Os homens não pensam quando estão com tesão. Primeiro fodia-te e depois arrependia-se". Não tive como discordar. Afinal, contra factos, não existem argumentos. Acho que ainda não será desta que o Pai Natal me irá presentear com amor no sapatinho. Resta-me pedir mais juízo!