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E se o meu marido for gay?

A tendência de um heterossexual trocado por uma relação homossexual é pensar que algo no seu comportamento desencadeou o cataclismo.

Foto: Unsplash
07 de janeiro de 2020 às 07:10 Dulce Garcia

Aos 20 anos, C. tinha um namorado toureiro. Um desses rapazes viris até à medula, que se deslocam de perna arqueada e em bando, bebem litros de cerveja e ficam a olhar para as raparigas com a sobranceria de quem pode desdenhar meia dúzia porque tem outra dúzia à espera.

As famílias aprovavam a relação e a sociedade tinha o casamento como certo. Até ao dia em que ele foi apanhado nas cavalariças aos beijos na boca com o tratador.

A escandaleira foi tão grande como imensa era a fama de marialva do rapaz. Teve de abandonar a cidade onde vivia e emigrar para parte incerta, deixando C., uma rapariga liberal, apesar da educação conservadora, entregue às gracinhas dos antigos compinchas e à falsa piedade das invejosas que antes lhe cobiçavam o homem  – "Coitadinha…"

Hoje C. tem 40 anos, é casada, e consegue rir-se da história. Mas continua a ter dúvidas em relação ao passado – será que teve alguma parcela de culpa na viragem? Como foi possível nunca ter percebido? Terá ele sentido algum prazer com ela?

Tudo perguntas legítimas. A tendência de um heterossexual trocado por uma relação homossexual é pensar que algo no seu comportamento desencadeou o cataclismo. Como se uma relação frustrada fosse suficiente para renunciar a um género ou, em última instância, uma só relação homossexual bastasse para definir toda a sexualidade do indivíduo.

Alfred Kinsey bem tentou explicar ao mundo que nesta matéria há muitas variações possíveis. As investigações do zoólogo sobre comportamento sexual humano, desenvolvidas entre 1947 e 1948, com 17 mil homens brancos, permitiram-lhe fazer uma escala que ruborizou a América. Foi ele que disse que existem heterossexuais e homossexuais exclusivos; heterossexuais e homossexuais que já tiveram relações homossexuais; e bissexuais. Não contente, ainda avançou com percentagens: afirmou que 37 por cento dos inquiridos tinha tido pelo menos uma experiência homossexual, com orgasmo, entre a adolescência e a idade adulta; e que 13 por cento sentira atracção erótica por alguém do mesmo sexo. Mais tarde, quando se debruçou sobre o universo feminino, o fundador do Instituo de Pesquisa sobre o Sexo revelou que a incidência da homossexualidade nas mulheres era menor.

Quantas vezes já ouviu a pergunta: o que é que é pior, ser trocada por outra mulher ou por um homem? C. diz que, apesar de tudo, a segunda hipótese é menos traumática. "O caso fica arrumado. Não podes competir, é outro campeonato. Se for uma mulher, vais passar a vida a perguntar-te: mas o que é que ela tem que eu não tenho?"

Curiosamente, para os homens é mais chocante saber que foram trocados por outra. Parece que a mudança de género ofende a sua virilidade. G. está casada com R. há oito anos e têm uma filha de quatro. Há dois anos começou a suspeitar de alguns "comportamentos suspeitos" – como ela própria define – do marido. Apanhou-o a conversar com homens na Internet e percebeu que o jantar semanal que ele apregoa como sendo com colegas da empresa é, afinal, outro tipo de convívio. "Uma vez segui-o de táxi até ao restaurante. Era uma mesa enorme, só de homens, e não conheci nenhum. Tinham todos o mesmo corte de cabelo, meio rapado, t-shirts justas… achei-os estranhos. Nada parecidos com os amigos dele."

Sem coragem para confrontar o marido, e com vergonha de falar do assunto às amigas, G. passa a vida consumida em dúvidas. Se vivesse nos Estados Unidos podia recorrer à Gay Husbands & Straight Wives, associação fundada em 1985 para apoiar mulheres de gays e bissexuais. A fundadora, Bonnie Kye, sabe do que fala – descobriu que o marido era gay e quase entrou em colapso. Hoje, vende milhares de livros sobre o assunto e gaba-se de já ter ajudado cerca de 30 mil mulheres defraudadas. No site da organização, a estimativa nacional não é animadora – calcula-se que existam quatro milhões de mulheres ou ex-mulheres de gays e bissexuais, a maioria delas a viver na mais completa ignorância. Mais: 10 mil a 20 mil mulheres contactaram recentemente grupos de apoio on-line para falar deste problema, a maioria entre os 20 e os 30 anos.

Ninguém gosta de ser enganado e Bonnie pôs a sua dor a render – vende livrinhos onde ensina esposas desconfiadas a tirarem a prova dos nove. The Gay Husband Checklist – For Women Who Wonder, por exemplo, é um best-seller.

Literatura sobre a matéria é o que não falta na América. My Husband is Gay, a Survival Kit for Straight Spouses, de Carol Grever, reúne o seu próprio testemunho e relatos de mais 4300 pessoas (entre homens e mulheres) que a contactaram sobre o assunto. Nele, a autora fala da sua terrível descoberta, do calvário do marido e das razões que levam muitos destes casais a manter-se unidos. Ela faz parte dos 85 por cento que decidiram separar-se. Casou outra vez. E agora não tem dúvidas.

Atenção aos sinais

Segundo a organização Family Pride Coalition, 20 por cento dos gays americanos têm casamentos heterossexuais e 50 por cento são pais. Surpreendente? Pode acontecer a qualquer um. Eis alguns sinais que podem ser preocupantes:

  • Manter algum tipo de comunicação não verbal com outros homens – olhares, toques demasiado demorados ou gestos de intimidade
  • Consumir pornografia (vídeos, fotografias, revistas ou sites) com muitas cenas entre homens
  • No historial do motor de busca, estarem registadas várias consultas a sites bissexuais
  • Ter perdido o interesse pelo sexo e não conseguir manter uma erecção
  • Ter uma súbita fixação em sexo anal
  • Receber muitas chamadas de outro homem
  • Comprar ou receber presentes íntimos ou caros de outro homem
  • Reagir excessivamente a qualquer manifestação gay – comportamentos homofóbicos
  • Aparecer com diversos amigos gays
  • Passar muito mais tempo com os amigos do que consigo
  • Responder a anúncios em sites gay
  • Ter números de telefone de serviços de encontros gay
  • Frequentar bares ou restaurantes gay e aparecer com facturas desses locais

Fonte: Ruth Houston, autora do livro Is He Cheating on You: 829 Telltale Signs

Artigo originalmente publico na edição nº 252 da Máxima 

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