Na semana passada, duas brasileiras tiveram um sucesso estratosférico com as suas performances cinematográficas, mas só uma viu o seu esforço reconhecido com prémios e elogios. Fernanda Torres fez história ao receber um Globo de Ouro pelo seu papel em Ainda Estou Aqui, um filme sobre o período da ditadura no Brasil. Já Linda de Sousa Abreu, que protagonizou uma curta-metragem intitulada A Dita ‘Tá Dura Mas Deixa Que Eu Dou Um Jeito – Edição Especial Prisão de Sua Majestade, tem sido alvo apenas de repúdio e consternação. E isto apesar de o filme de Linda ter viralizado nas redes sociais, que é novilíngua para "foi visto por gente que nunca mais acaba". Enquanto Fernanda recebeu flores, abraços e um pisa-papéis fálico, Linda, depois de ter contracenado com um falo, foi detida pela polícia no aeroporto de Heathrow e cumpre agora uma sentença de 15 meses de prisão. É assim, umas são filhas – da Fernanda Montenegro – e outras são… Outra coisa.
Linda de Sousa Abreu, uma brasileira de 30 anos emigrada no Reino Unido, casada e mãe de uma menina de oito anos, era guarda prisional na cadeia de Wandsworth, no Sudoeste de Londres. Profissão que exercia com grande zelo e visível preocupação com os reclusos. Certo dia, ao passar pela cela de Linton Weirich, Linda reparou que o prisioneiro tinha roupa insuficiente para o frio que se fazia sentir e tentou aquecê-lo como pôde. Com as mãos, com a boca, enfim, com tudo o que tinha e de onde pudesse extrair algum calor humano para partilhar. Sucede que tanta proximidade causou um certo exacerbamento de alma e o que começou como inocente obra de misericórdia – aquecer os que têm frio –, acabou por se transformar num reiterado exercício libidinoso.
Ora, sucede que a prática de sexo desenfreado entre um recluso e uma guarda prisional está interdita. Enfim, não explicam, devidamente, as funções que uma pessoa vai desempenhar e depois é o que se vê. Como é que as actividades extracurriculares dos dois jovens vieram a público?, perguntará o leitor. Porque ambos consentiram que um outro recluso os filmasse, com a câmara do telemóvel – objecto igualmente interdito dentro da cadeia –, algo que este complementou com uma narração ao estilo de David Attenborough durante um episódio especial do programa BBC Vida Selvagem sobre acasalamentos.
Que este jovem tenha decidido ignorar o chaveiro da cadeia que Linda largou, à toa, em cima da cama – de acordo com o testemunho que um visivelmente perturbado director da prisão prestou em tribunal –, optando por continuar a filmar, diz alguma coisa sobre o seu desejo de endireitar a sua vida e de contribuir para a sociedade desenvolvendo novas capacidades. Ou isso ou é sinal de um fraco entendimento sobre a função das chaves.
Coube ao juíz Martin Edwards narrar exactamente o que se passou, quando atribuiu a sentença de prisão a Linda Abreu, algo que fez com grande classe, frieza de espírito e imperturbabilidade, adornado com a obrigatória peruca empoeirada e com os óculos entalados no meio do nariz: "[A senhora] disse que o amava e que nunca se sentiu tão protegida na sua vida e que [fazer o que estava a fazer com o recluso] a fazia sentir como uma gangster. A filmagem dura cerca de quatro minutos e meio, durante os quais [a senhora] praticou sexo oral com o recluso, depois coito vaginal em diversas posições, terminando com mais sexo oral. Actividades nas quais participou com evidente entusiasmo. O segundo recluso gravou o episódio e forneceu diversos comentários em jeito de encorajamento, incluindo: ‘Malta, estamos a fazer História! É isto a vida em Wandsworth, manos! És ganda gangsta, man, e tu sabes!’"
Ora, posso estar enganada, mas tenho a sensação que, se era de um gangster que Linda estava à procura, não precisava de ter atravessado o oceano. Afinal, Weirich – cuja namorada está grávida e certamente delirante com a súbita fama do pai da criança – foi só condenado pelo roubo de um cofre com bens no valor de 65 mil libras, aquilo que qualquer meliante de vão de escada no Brasil factura numa manhã de domingo ao enfiar a mão na caixa do dízimo de um qualquer estabelecimento da Igreja Universal do Reino de Deus.
Para minimizar o alarme social que esta situação tem causado no Reino Unido, a irmã de Linda já fez saber que a jovem é swinger – ela e o marido trocam frequentemente de parceiros sexuais – e sempre fez este género de coisas, tanto que até participou num reality show do Channel Four, chamado Open House, que seguia a vida de diversos casais que praticavam swing. É possível que a moça não saiba o significado de "alarme social". Ou de "minimizar".
A autora escreve segundo as regras do Antigo Acordo.