Será este o glamour sagrado que a moda ecológica aguardava? Para o copo-d’água do casamento com o príncipe Harry, Meghan Markle escolheu um vestido de cocktail em seda cor de marfim desenhado por Stella McCartney. Uma bela vitória para a pioneira de luxo ético que foi a primeira, há 15 anos, a inventar uma moda radical e desejável. Ao substituir o pelo e as peles de animais e a cola de peixe por materiais ecológicos (couro à base de micélio, seda de aranha ou caxemira reciclada), McCartney abriu caminho à inovação verde no universo do luxo. O desafio? Responder aos desejos dos millennials, os novos consumidores de luxo em busca de transparência sobre a origem das suas roupas e da naturalidade nos produtos cosméticos. "As pessoas com menos de 30 anos têm, cada vez mais, a consciência de que a Moda é a segunda indústria mais poluente do mundo, após o setor petrolífero", analisa Cécile Lochard, consultora e coautora do livro Luxe et Développement Durable: la Nouvelle Alliance (edições Eyrolles). "Os setores da moda e da beleza já não podiam prevalecer sobre as matérias-primas raras sem se preocuparem com o colapso da biodiversidade ou o sofrimento dos animais. Ao menor deslize, a informação circula nas redes sociais e a imagem das marcas é afetada. Vivemos num momentum, num impulso." Não se passa nem um mês sem que esta ou aquela marca anuncie a sua conversão ao fur-free (não usar pelo de animais), uma parceira com uma start-up ecológica ou o lançamento de uma cadeia de fornecimento responsável. "Há dez anos que a transição ecológica da indústria do luxo tem vindo a ganhar força", acrescenta Cécile. "É uma vaga comparável à da revolução digital de há dez anos. A ecologia já não é considerada uma obrigação, mas uma oportunidade de inovar e de criar valor." Do mesmo modo, a ascensão das marcas mais recentes com preocupações ecológicas desafia as gigantes do luxo. "A Ecologia já não é uma opção. É uma necessidade", afirma Marie-Claire Daveu, diretora de desenvolvimento sustentável da Kering." Quase 93% da nossa pegada ambiental vem da cadeia de fornecimento, da produção de matérias-primas provenientes da agricultura e da criação de animais. E 7% são gerados pelas nossas operações internas (vendas e distribuição). Para mudar o modelo de negócio precisamos de inovações radicais." Encontramos o mesmo voluntarismo no grupo LVMH: "Os nossos clientes perguntam-nos, cada vez mais, qual a origem das matérias-primas", confirma Alexandre Capelli, responsável pelo setor de ambiente. "É um assunto muito mais estratégico do que há 20 anos. Tudo converge para uma mudança de paradigma." Como se prefigura o luxo ético do futuro? Para o compreender, neste contexto, há cinco questões a reter.
Valorizar o bem-estar animal

É o desafio mais touchy do momento. "Face à emoção gerada pelas campanhas da Peta e da associação L214, os millennials esperam, agora, que as marcas de luxo assumam posições fortes no que diz respeito à causa animal", afirma Cécile Lochard. Depois de Armani, em 2016, grandes nomes da Moda como Gucci, Versace ou John Galliano abandonaram, este ano, o uso de pelo. "As peles preciosas exóticas, como a de crocodilo ou de pitão, perderam valor porque há cada vez menos vontade de usar a pele de um animal morto. As tendências vegan e contra o uso de pelo obrigaram a Moda a redefinir-se", afirma Barbara Coignet, fundadora da Biennale 1.618, dedicada ao luxo inovador e sustentável que se estreou em junho no Carreau du Temple, em Paris. Face à inquietude dos consumidores, as marcas multiplicam as auditorias às empresas de criação de animais. Para evitar o excesso de população ou os maus-tratos, a Louis Vuitton e a Hermès verificam todas as suas unidades de criação de crocodilos, de coelhos e de avestruzes, a cada dois anos. E a Kering, que também desenvolveu modos sustentáveis de produção de caxemira, na Mongólia, e de lã, na Nova Zelândia, interessa-se pelas blockchains, as enormes redes de computadores que lutam contra a falsificação, a fim de garantir a rastreabilidade das matérias-primas. As marcas devem provar que respeitam o bem-estar animal. "Passámos, pouco a pouco, de contar histórias a ter de prová-las", comenta Cécile Lochard. Outra novidade: alguns pioneiros garantem as suas cadeias de fornecimento enquanto tentam ter um impacto positivo nos ecossistemas. Exemplo disso é a marca italiana Loro Piana, que contribuiu para salvar a vicunha, uma pequena espécie de lama ameaçada de extinção, na década de 1980, criando uma reserva natural, no Peru. Também a Guerlain se decidiu a lutar, em 2011, contra o desaparecimento das abelhas, o emblema da marca. "Quase 30% das abelhas morrem todos os anos, em França", afirma, com inquietação, Sandrine Sommer, diretora de desenvolvimento sustentável da marca. "Nós financiamos o Conservatório da Abelha Negra Bretã, da ilha de Ouessant, no âmbito de um programa de mecenato de desenvolvimento sustentável. O mel destas abelhas, que possui propriedades cicatrizantes incomparáveis, é utilizado na nossa gama L’Abeille Royale. Também apoiamos Thierry Dufresne, diretor do OFA (Observatório Francês de Apidologia), que ambiciona criar 10 milhões de colmeias na Europa, até 2025."
Incubar biotecnologias
Como encontrar matérias alternativas capazes de corresponder às exigências de qualidade do luxo? As marcas gigantes abrem-se, cada vez mais, às start-ups de biotecnologia. "Os couros [sintéticos] à base de fibras de ananás, de maçã ou de bambu ainda não têm a resistência, a estética e a flexibilidade necessárias para satisfazer os nossos critérios", sublinha Alexandre Capelli. "Os desenvolvimentos mais avançados dizem respeito às sedas e aos couros sintéticos desenvolvidos pela start-up californiana Bolt Threads. Interessamo-nos igualmente pela AlgiKnit que inventou um têxtil à base de algas. Ainda falta verificar se o seu custo ambiental é melhor do que o das matérias animais…" Neste caminho rumo à inovação, a LVMH abriu um espaço de start-ups, em finais de abril passado, na Station F, em Paris. Pelo seu lado, a Kering associou-se recentemente à incubadora holandesa Fashion for Good. Para manter o seu avanço, Stella McCartney lançou um concurso em parceria com a Peta, no qual participam cerca de 30 grandes universidades norte-americanas com o objetivo de fabricarem lã vegetal.

Preservar o vegetal
No universo da Beleza, o sucesso exponencial das pequenas marcas bio ou ecológicas, como a Tata Harper, espicaça os gigantes da Cosmética. Com uma aposta crescente na naturalidade, estas últimas aligeiraram os seus produtos e reduziram os seus ingredientes químicos. "Já não queremos incluir derivados de petróleo nas nossas fórmulas", afirma Édouard Mauvais-Jarvis, diretor de comunicação científica da Dior. "As nossas gamas mais recentes têm até 83% de produtos naturais." Também aqui o caminho para a inovação atinge o seu expoente máximo. "O primeiro que conceber um filtro solar vegetal conquistará o Graal!", acrescenta. Outro grande desafio: o óleo de palma, desejado pelas suas virtudes emolientes, mas cuja produção é uma das maiores causas da desflorestação. Na Dior, 50% do óleo de palma provém de plantações sustentáveis", sublinha Édouard. Para Tristan Lecomte, fundador da Pur Projet, que realiza auditoras para as gigantes de luxo, "o colapso da biodiversidade ameaça o fornecimento. Comprometer-se com a preservação das matérias-primas vegetais é uma necessidade económica para assegurar as cadeias de produção". A orquídea da China para a Guerlain, a baunilha de Madagáscar para a Chanel, o farelo da quinoa da Bolívia para a L’Oréal… Todas as grandes marcas criaram cadeias de fornecimento sustentáveis. Sob o impulso do seu diretor, Laurent Boillot, a Guerlain incubou a sua própria start-up, a Cha Ling, uma marca econo "coração" do Grupo LVMH. "A Cha Ling nasceu de um sonho ecológico: devolver a vida a uma floresta de árvores de chá Pu’Er, em Yunnan, o pulmão verde da China", conta Laurent Boillot. "Parte das receitas da Cha Ling financiam a reflorestação. Plantámos quase 100 mil árvores de chá, cujas virtudes desintoxicantes são utilizadas na nossa gama de cosméticos."
Copiar a vida

Imitar a Natureza para inovar: é esta a última tendência. Laura Magro, chefe de missão do Ceebios (Centro Europeu de Excelência em Biomimetismo, em Senlis [na França]), é assessora de cerca de 40 empresas, entre as quais a LVMH e a L’Oréal. Laura cita duas vias de inovação importantes dos últimos tempos: a borboleta Morpho, cujas asas azuis iridescentes inspiram a Dior na criação de pigmentos menos tóxicos para a pele e para o planeta; e o nenúfar, com as suas folhas hidrofóbicas, que serve de modelo para as toalhitas de autolimpeza que consomem menos água e detergentes. "No mundo vivo existem condições contratuais", explica Laura Magro. "A Natureza recicla todos os seus resíduos, minimiza o consumo de matérias-primas e de energias – que são todas renováveis – e funciona em modo cooperativo com relações de simbiose e de entreajuda. O luxo poderia partilhar o fluxo de matérias para que os resíduos de uns fossem os recursos de outros."
Objetivo: zero resíduos
Barbara Coignet, da Biennale 1.618, está convencida: "O luxo do século XXI não tem medo dos resíduos e cria valor a partir de matérias desprezadas." Além disso, a economia circular participa na redefinição, pensa o antropólogo Marc Abélès, autor de Un Ethnologue au Pays du Luxe (edições Odile Jacob): "Há muito tempo associado ao excesso, ao fausto e à ostentação, o luxo inscreve-se agora numa tendência care green que consiste em cuidar de si próprio e do planeta. Cada vez mais, os consumidores rejeitam roupas e cosméticos que resultem de agressões à Terra. Em vez disso, procuram uma harmonia pacífica, uma arte de viver em consonância com a Natureza." Mesmo que o número de inovações ainda esteja no estado experimental, a metamorfose do luxo está muito bem lançada.

Exclusivo Madame Figaro | Tradução Erica Cunha e Alves

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