O que dizem as roupas das seis ministras de Montenegro na tomada de posse?

Num país que olha cada vez com mais atenção para quem lidera — e como lidera — estas seis mulheres mostram que, de certa forma, política e estética não se excluem. Pelo contrário: quando bem conjugadas, tornam-se linguagem.

Foto: Tiago Sousa Dias
06 de junho de 2025 às 14:43 Safiya Ayoob

Na tarde de 5 de junho de 2025, o Palácio Nacional da Ajuda voltou a abrir portas para uma das mais simbólicas cerimónias da democracia portuguesa: a tomada de posse do XXV Governo Constitucional. Sob a liderança de Luís Montenegro, a nova composição governamental traz consigo um conjunto de sinais — políticos, sociais e até estéticos — que vale a pena observar com atenção.

Um dos mais comentados prende-se com a redução da representação feminina: 20 mulheres entre os 60 governantes (incluindo o primeiro-ministro), o que corresponde a 33% do total. Seis destas mulheres ocupam pastas ministeriais, algumas em áreas nucleares do executivo. A sua presença no palco da posse, captada pelas câmaras e pelos olhares atentos do país, foi também uma afirmação visual. Num momento em que cada detalhe comunica — do discurso à postura, do olhar ao corte de blazer — a roupa escolhida pelas ministras revela pistas sobre como querem ser vistas: sérias, disponíveis, confiantes, ou discretamente firmes.

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Reconduzida no cargo de ministra da Saúde, Ana Paula Martins apareceu vestida com um fato preto clássico, de corte justo e sem ornamentos — uma escolha que quase ecoa o lado mais técnico do seu perfil. Farmacêutica e ex-presidente da Ordem dos Farmacêuticos, é uma figura que passou discretamente da técnica para a política, mantendo uma imagem de rigor e contenção. A sobriedade visual reforça essa ideia: sem excessos, sem cedências ao acessório, Ana Paula Martins reafirma-se como alguém que quer ser julgada pela competência, não pelo estilo — embora, ironicamente, o estilo escolhido diga tanto sobre o seu posicionamento.

A nova ministra da Cultura, Juventude e Desporto é também a mais jovem deste elenco e fez questão de afirmar esse traço com um coordenado leve mas estrategicamente bem calculado: blazer e calças creme, top branco, cabelo solto e maquilhagem sóbria. Margarida Balseiro Lopes — ex-líder da JSD, deputada ativa, voz firme no Parlamento — chegou ao Governo com vontade de marcar território. A roupa que escolheu para o dia da posse não é só elegante; é luminosa, contemporânea e assertiva, sem nunca sair do registo institucional. Uma afirmação subtil de que juventude não significa impreparação — e que modernidade e responsabilidade podem vestir-se no mesmo tom.

Conhecida pela solidez académica e perfil técnico, Maria do Rosário Palma Ramalho apresentou-se na tomada de posse com uma parte de cima de malha fina, mangas curtas e saia plissada, conjugado com um colar de pérolas e cabelo solto modelado. A escolha foi clássica, mas não rígida — transmitindo sobriedade sem rigidez, e autoridade sem esforço. Como ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Rosário Palma Ramalho não precisava de vestir peso para mostrar que o tem. E o que vestiu foi, precisamente, o reflexo da sua maneira de estar: uma presença tranquila, de quem está habituada a pensar antes de falar — e a construir antes de exibir.

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Foto: @trabalhopt

Com um vestido vermelho total, de corte simples e mangas curtas, Maria da Graça Carvalho foi uma das presenças mais marcantes na cerimónia de posse — não apenas pelo currículo extenso, mas também pela escolha visual clara. Engenheira, eurodeputada durante vários anos, com passagem anterior por ministérios da ciência e tecnologia, assume agora o Ambiente e Energia com um perfil técnico consolidado. A aposta numa cor intensa como o vermelho — sem contrastes, sem atenuantes — revela a confiança de quem já não precisa de justificar o lugar que ocupa. É uma imagem que transmite força, segurança e autonomia.

Figura de confiança de Luís Montenegro e independente de perfil reservado, Rita Júdice apresentou-se com um look equilibrado entre o formal e o feminino: blazer claro e top preto com detalhe de renda discreta, conjugado com umas calças pretas largas e com cabelo solto e colar delicado. Jurista de formação, ministra da Justiça num tempo particularmente sensível, a sua presença procurou comunicar moderação e sensibilidade. A roupa, sem excessos, reforça a mensagem de alguém que quer ser firme sem ser confrontacional, acessível sem perder a autoridade. Uma espécie de presença invisível, que, ainda assim, se faz notar.

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Recém-chegada à pasta da Administração Interna, Maria Lúcia Amaral (de quem não tínhamos ainda obtido imagens, à data de publicação deste artigo) é tudo menos uma estreante nos corredores do poder institucional. Ex-Provedora de Justiça e juíza do Tribunal Constitucional, é conhecida pela sua contenção, independência e profundo conhecimento da lei. Na tomada de posse, apresentou-se com um blazer vermelho estruturado sobre um vestido com padrão gráfico preto e branco — uma combinação ousada, sobretudo para uma figura com um perfil tão contido. Mas talvez seja essa a mensagem: quem tem peso próprio pode permitir-se contrastes. A cor forte do blazer impunha presença; o padrão do vestido revelava atenção ao detalhe. Um visual inesperado, mas coerente com alguém que entra no Governo com voz própria e autoridade silenciosa.

A tomada de posse não é apenas o início formal de um mandato — é também a primeira fotografia de um governo perante o país. E neste governo, que se aproxima como nenhum outro da paridade, as seis ministras ofereceram uma lição de como a política se faz também de presença. Cada uma à sua maneira, com o seu percurso, com a sua voz e com a sua escolha de vestuário, mostrou mais do que o que está no papel. Mostrou como se constrói um lugar num palco ainda marcado por desigualdades subtis.

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