16 momentos que definiram os desfiles de Alta-Costura para a primavera-verão 2020
A Semana de Moda de Paris mostrou o que de melhor se faz nas grandes casas que ainda mantêm a maior das artes da passerelle.

Nesta sua segunda coleção para a maison, o diretor criativo Daniel Roseberry inspirou-se no surrealismo e dadaísmo, grandes referências da própria Elsa Schiaparelli, mostrando silhuetas que pareciam saídas das obras de Alberto Giacometti, artista plástico suíço. Vimos sumptuosos vestidos de noite, mas também houve espaço para uma alfaiataria mais relaxada em vestidos em seda drapeados, mangas megalómanas, peças cores berrantes, transparências e muitas joias para usar durante o dia.

A designer holandesa virou-se para os oceanos em busca de inspiração para a sua mais recente coleção, intitulada Sensory Seas. As modelos entraram na passarelle e passaram por um trio de esculturas cinéticas rodopiantes do artista britânico Paul Friedlander, que evocavam ondas. Van Herpen inspirou-se também nos desenhos anatómicos do neurocientista espanhol Santiago Ramon y Cajal, replicando as delicadas linhas de suas ilustrações em peças em seda e folhas de organza transparente.

O designer libanês levou à passerelle montada no Palais de Chaillot lembranças de verões passados no Mediterrâneo, nomeadamente nas praias da Sardenha. Chiffons fluidos, penas, chapéus dramáticos, franjas com missangas e muitas referências aos anos 1950. A modelo Maya Henry fechou o desfile num vestido de noiva cravejado de cristais. Hobeika também apresentou os seus primeiros looks masculinos de alta-costura.
Maria Grazia Chiuri celebrou o trabalho de uma outra visionária nesta temporada, ao convidar a artista Judy Chicago para criar uma escultura no jardim do Museu Rodin, que também serviu de cenário para o desfile The Female Divine. A obra lembrou uma figura feminina voluptuosa, contendo uma série de grandes faixas bordadas com perguntas. Destaque para: "E se as mulheres governassem o mundo?" A coleção foi buscar inspiração à Grécia clássica, mostrando uma variedade de vestidos com franjas e drapeados numa paleta em tons de ouro.

Ralph & Russo
Em homenagem a uma década de criações, a coleção apresentou uma interpretação jovem e moderna inspirada no arquivo da marca. Com drapeados sumptuosos, tailleurs em crepe de seda, florais estruturados e grandes laços, as peças combinaram elementos novos e leves num caleidoscópio de rosa pastel, verde e azul-cobalto.
Em vez de um desfile, o criador apresentou uma exposição na galeria Jeu de Paume, no Jardin des Tuileries, que estará aberta ao público. O que não mudou foram os vestidos maximalistas adornados, com camadas volumosas de tule, folhos, bordados e penas. Houve também vestidos de tafetá inspirados nos anos 1960, mais leves e explorando uma certa "simplicidade".
Desta vez, o cenário do desfile foi um bonito jardim com um claustro cenário, elemento-chave na lendária história de Gabrielle Chanel. Coco tinha 11 anos quando sua mãe morreu e decidiu-se que seria enviada para o convento de Aubazines, comuna na remota região francesa de Corrèze. As freiras ensinaram a jovem Chanel a costurar e esta estética ficou com a desginer (e mais tarde com a sua marca) para sempre. Consciente deste significado biográfico, Virginie Viard, a diretora criativa, recorreu ao passado e transformou o Grand Palais, dando o toque "de casa" ao recinto com dezenas de lençóis de linho antigos pendurados, como se secassem na brisa.
A mesma inspiração viu-se nas treliças de bordados que retratavam os pisos de pedra, nas lantejoulas que evocavam os vitrais da capela, na silhueta parecida com a de um uniforme escolar e na paleta de cores que inclui preto, cinza, malva, creme e branco.
O tema da coleção foi o Ikat, padrão têxtil que se entrelaça nas histórias culturais de países ao redor do mundo e conquistou a moda ocidental através dos viajantes hippies dos anos 1960. Entre as peças, destaque para as calças em tafetá, com padrões e missangas, além de uma enorme variedade de jaquetas. Os vestidos de noite sem alças chegaram em grande número, intercalados com vestidos camisola.
Clare Waight Keller revisitou o seu amor por jardins e recuperou as lembranças das suas visitas ao Castelo de Sissinghurst, no Reino Unido, e as leituras das apaixonadas cartas de amor entre Vita e Virginia Woolf. As referências criaram uma coleção poética com força na alfaiataria – daí os vários fatos – e na forma de pétalas tridimensionais nos vestidos. Kaia Gerber foi a noiva num chapéu tão grande que quase formou um dossel sob o qual poderia fazer os votos.
O diretor criativo propôs-se a investigar "o impacto dos códigos patrimoniais na era da revolução cibernética industrial", informava o comunicado de imprensa. Os modelos desfilaram ao som de um podcast sobre sustentabilidade e a inevitável evolução do consumismo. Nas peças, esta ideia de reciclagem dos códigos burgueses surgiu em designs recortados, alguns preenchidos com pele falsa. O desfile também foi ainda palco da apresentação em primeira mão da colaboração da maison com a Reebok, com um sapato enérgico, resultado da união do Tabi da Maison Margiela com o Instapump Fury da Reebok.
Uma coleção recheada de referências ao México e à sua cultura visual, particularmente nos motivos bordados usados ??em quase todos os vestidos de noite. Destaque para o brilho dourado em que a coleção parecia estar banhada, com peças preenchidas com bordados e mais bordados, incrustações de flores e pérolas e redemoinhos barrocos. Por outro lado, em oposição a essa opulenta sobrecarga visual, uma série de vestidos em seda em tons coral e turquesa ofereciam a combinação certa de glamour e drama.
Os designers Viktor Horsting e Rolf Snoeren decidiram pegar nas suas próprias sobras de tecido e amostras enviadas por fornecedores – que eles nunca deitaram fora – para criar a sua nova coleção. O que se viu foram estilos florais com laços e retalhos de brocado com capas ornamentadas. O croché e o tule enfeitaram e fixaram os tecidos. As modelos desfilaram com tatuagens temporárias no rosto e no pescoço, com mensagens que liam "sonho", "amor", "o sucesso não é definitivo" ou "a falha não é fatal".
O designer encontrou inspiração no Egito Antigo e nos símbolos da época, aplicando-os numa série de peças em lantejoulas e tons dourados. Para além dos vestidos, viram-se macacões e uma combinação de jaqueta e bermudas. Muito ouro (leia-se ouro até no forro dos vestidos) e muito trabalho manual, como se quer numa coleção de alta-costura.
Carl Jung, o papel do subconsciente, sonhos e o toque do surrealismo. Pierpaolo Piccioli antecipou a sua coleção artística afirmando querer canalizar livremente as suas paixões criativas. A passerelle misturou as habituais jovens modelos com nomes de sempre, incluindo Stella Tennant, Karen Elson e Maria Carla Boscono. As peças mostraram construções complexas, silhuetas ousadas, folhos e geometria de tirar o fôlego.
A designer chinesa foi em busca de Shangri-La numa coleção fantasia inspirada pelos Himalaias. Aqui, a mais alta cadeia montanhosa do mundo tornou-se num símbolo de elevação. Neste destino sagrado as silhuetas fizeram referência a mitologias asiáticas, com capas que se estendiam no chão, retalhos de cintos japoneses e motivos sagrados budistas bordados em metros de tecido.
Este desfile entrou para a história como o último do designer francês na passerelle. E foi uma extravagância de música e dança, com um elenco de estrelas como muito bem sabe fazer Jean-Paul Gaultier. O Théâtre du Chatelet foi o palco da despedida dos seus 50 anos de carreira e, durante mais de uma hora, modelos, amigos e celebridades desfilaram mais de 230 looks com referências a antigas coleções.
Não poderiam faltar blusas de marinheiro, espartilhos, smokings e trompe-l'oeil, as assinaturas do enfant terrible da moda vistas nas modelos Karlie Kloss, Gigi e Bella Hadid, Jourdan Dunn, Winnie Harlow e em amantes da marca, como Dita Von Teese, Rossy de Palma e Paris Jackson, para nomear alguns.
Na plateia não faltaram colegas designers, com a presença de Pierre Cardin, Nicolas Ghesquière, Christian Lacroix, Christian Louboutin, Dries Van Noten, Clare Waight Keller e Isabel Marant.
No estilo típico de Gaultier, a despedida foi marcada por um funeral fictício – o caixão na passerelle continha os seios cónicos, em referência ao icónico soutien que Madonna usou nos anos 1990. O desfile foi aberto com a cena do funeral do filme Qui êtes-vous, Polly Maggoo? (1966), de William Klein, ao som de Boy George a cantar Back to Black, de Amy Winehouse.
Mas o tom fúnebre não significa que Gaultier irá pendurar a tesoura completamente. A Gaultier Paris continuará com um novo conceito, que pode envolver designers convidados, e o seu cabaret Fashion Freak Show seguirá para Moscovo e São Petersburgo, na Rússia. O fim de uma era na alta-costura poderá ser o começo de outra.
