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Quando se gosta de viajar e se sente que as exigências profissionais e o ritmo de vida alucinante deixam cada vez menos tempo e disponibilidade para estar com as crianças, a perspetiva de uma aventura on the road pode parecer tentadora. Para muitos pais, trata-se de um sonho impossível de realizar – porque viajar com os filhos é irresponsável, perigoso e cansativo, porque estes não se adaptariam a tantas realidades diferentes, porque é preciso levar muita tralha, etc. É certo que o projeto exige uma boa organização, não oferece 100% de liberdade e o fator dinheiro é importante. Mas, a julgar pelo número crescente de famílias nómadas, as limitações estão mais nos adultos do que nas crianças.

Luísa Pinto, jornalista, e Filipe Morato Gomes, cronista e fotógrafo de viagens, decidiram embarcar numa volta ao mundo com a filha, Inês, quando esta tinha quase cinco anos. A experiência, que ficou registada no blogue O Diário da Pikitim, durou 10 meses, num itinerário com paragens em locais como Tailândia, Malásia, Filipinas, Indonésia, Austrália e costa oeste dos Estados Unidos da América. Luísa diz que a viagem foi feita no "timing adequado, isto é, na véspera do ensino obrigatório" de Inês. "Queríamos mostrar à nossa filha que habitamos numa pequena gota de um grande oceano chamado Terra. […] Queríamos mostrar-lhe que é com as mãos na terra que se talham as experiências e as recordações mais duradouras. E que se adquire conhecimento, que se apreende com a diversidade, que se ganha maior respeito pela Natureza. […] Acreditamos sinceramente que a estrada é a melhor escola da vida."

Os benefícios são inquestionáveis, tanto para os pais como para os filhos, corrobora Mário Cordeiro: "Viajar com crianças, em família, sobretudo já tendo passado a fase das ‘fraldas e biberões’, é muito compensador. Em idade escolar, já desfrutam das viagens e podem aprender muito, ficando mais completos e conhecedores. E os pais, com calma, sem o stress do quotidiano, podem apreciar algumas facetas dos filhos que, no dia a dia, passam despercebidas."

Os melhores conselhos

Idealizar Se viajar é importante, não deixe de o fazer por causa dos filhos. Se os pais estão felizes, as crianças também vão estar.

Adaptar Estejam abertos para falar com estranhos, sendo cautelosos mas não desconfiados. Partam com grandes doses de humildade e respeito.

Planear Estudem a viagem na perspetiva de todos os elementos da família, pensando que as crianças reagem de forma diferente, sobretudo a nível do cansaço e dos objetivos. Não vale a pena fazer planos muito exaustivos porque eles vão mudar.

Acalmar Abrandem o ritmo e ajustem as expectativas, interiorizando que não vão conseguir fazer tudo o que querem viajando com filhos. A solução é viajar mais devagar e aceitar que terão dias mais fáceis e outros mais difíceis, na certeza de que se ficassem em casa também os teriam.

Motivar Tanto para o conhecimento como para a brincadeira. Tem-se a ideia de que crianças e museus são incompatíveis. Nada mais errado. Uma criança motivada alinha em (quase) tudo. Sem esquecer que elas também precisam da companhia de outras crianças e de brincar.

Proteger Percebam quais os riscos e medidas preventivas a tomar depois de selecionados os destinos (nomeadamente a nível de vacinas). Preparem uma pequena farmácia de viagem e tenham um contacto de um pediatra que possa responder em tempo útil. Guardem as senhas das instituições (segurança social, finanças) e não saiam de Portugal sem um seguro com cobertura e capacidade de resposta em viagem.

Mia, a filha de Miriam e Nélson, fez a sua primeira viagem de avião com três meses e ainda não tinha completado um ano (22 meses) quando partiram numa volta ao mundo. No blogue Menina Mundo, vencedor do prémio Blogger Travel Awards 2016, podemos acompanhar o percurso da família, que já passou por países como a China, Vietname, Camboja, Tailândia, Malásia e Índia. Tirando a alimentação, que poderá criar alguma dificuldade sobretudo em países onde é radicalmente diferente da nossa, enfrentar os desafios encontrados em viagem não difere muito daquilo que a família já faz em casa, admitem Miriam e Nélson. "A educação e disciplina são encaradas da mesma forma, as rotinas são próximas das que existiriam em casa. Em viagem, o modelo de pensamento é de antecipação das dificuldades, procurando estratégias para lhes fazer face."

Marta Gonzaga defende que "os desejos muito fortes de aventura não são para guardar na gaveta dos arrependimentos", até porque afirma não conhecer "uma pessoa com uma vida perfeita, que possa dizer que nada falhou nas suas decisões para com os filhos". O ano passado, a consultora de comunicação viajou pelo continente asiático com a filha Maria, de 18 anos, e a experiência ficou registada no site ruaalegre.com. A maior diferença para as outras crianças (Mia e Inês) foi a questão do ensino formal. Apesar de preencherem os dias com exercício, leituras, passeios e workshops de culinária, estudavam em casa com livros vindos de Portugal. Mas aquilo que mais as marcou foram os momentos e emoções fortes que viveram juntas. "Embora tenha mantido o meu papel de mãe, claro que houve uma cedência de autoridade, no sentido de que todas as decisões foram tomadas pelas duas e ela teve de tomar consciência de que os caminhos que escolhemos implicam sacrifícios."
Nélson e Miriam também aprenderam a relativizar: "Passámos a viver apenas com 20 quilos em duas mochilas e a leveza e liberdade que isto nos traz é impagável." Todos tiveram de se adaptar a novos contextos e as mudanças a nível da personalidade de cada um já se fazem notar. No caso de Mia, cujas transformações físicas e cognitivas são uma constante na sua idade, há certos aspetos que os pais julgam ter sido fomentados por esta viagem. Como a forma de lidar com situações inesperadas ou de encarar a diferença. Ou ainda a sua definição de casa, que prontamente responde incluir "a Mia, o papá e a mamã": "Aos dois anos ela sabe que o que faz de nós família não é vivermos sob o mesmo teto e as mesmas paredes todos os dias, é o que nos mora dentro do peito, independentemente do lugar no mundo."

E quanto às rotinas? Muitos especialistas consideram-nas um elemento estruturante para o crescimento das crianças. Como nos disseram unanimemente os pais, é possível mantê-las em viagem e Mário Cordeiro desdramatiza: "É fundamental habituarmo-nos às rotinas, como regras, mas depois termos as exceções e as transgressões, para apimentarem um pouco a vida. Exatamente por estas mudanças se darem num determinado contexto bem definido – o de viagens – são toleradas e estimulantes, mais do que causarem stress ou serem disruptivas."

No entanto, nem tudo é fácil. Miriam e Nélson confessam que "fazer viagens de longa duração não é a mesma coisa que ir de férias" e por isso tiveram de fazer concessões para realizar o sonho – venderam o carro e outros bens para juntar economias. Já para Marta Gonzaga, o mais difícil foi saber que tinha "a responsabilidade total pela segurança e o bem-estar da minha filha", já que passaram por "momentos muito duros, sem tempo para fraquejar".

Apesar de tudo, compensa. Muito. E a palavra de ordem é, definitivamente, família. Além de conhecerem mundo, eles aprenderam o seu verdadeiro significado. Como dizem os pais da pequena Mia: "Hoje temos menos [coisas], mas hoje vivemos mais, vemos mais, aprendemos mais, conhecemos mais, conhecemo-nos mais e somos mais: hoje temo-nos mais. Esta viagem é o nosso melhor retrato de família.

*Originalmente publicado na edição de junho de 2016 da Máxima (Nº333)

Luísa Pinto e Filipe Morato Gomes (O Diário da Pikitim) decidiram embarcar numa volta ao mundo com a filha Inês, quando esta tinha quase cinco anos.
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O Diário da Pikitim
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Os autores do blog Menina Mundo (Miriam e Nelson), com a filha Mia.
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Marta Gonzaga partiu coma filha Maria em viagem e acabaram por assentar em Bali.
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