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Filipe I de Portugal. A história do rei maldito que casou 4 vezes e dividiu os portugueses

A escritora e jornalista Isabel Stilwell narra uma nova história repleta de conspirações e intrigas, num período fundamental da História de Portugal, desta feita sobre o rei a quem apelidaram de "O Prudente."

Foto: Pedro Ferreira
12 de maio de 2023 Máxima

Jornalista e escritora portuguesa com uma mão cheia de romances históricos publicados, como também livros infantis, Isabel Stilwell é apreciadora e especialista de longa data da monarquia. Desde que lançou o livro D. Filipa de Lencastre, em 2007, sobre a vida da princesa inglesa, têm-se sucedido outros livros de sucesso neste formato.

Estamos agora perante Filipe I de Portugal - O Rei Maldito, a novidade de 2023, neste ficamos a conhecer Filipe I, um rei "apaixonado por arquitetura e botânica, atormentado por episódios obscuros que deram origem a uma lenda negra que ficaria para sempre associada ao seu reinado". Conversámos com a autora.

Será que o cognome "O Prudente" se adequava a Filipe I? Porque tinha ele esta fama?

Filipe analisava os problemas de todos os ângulos antes de decidir — os documentos que lhe passaram pelas mãos estão todos anotados à margem com reparos e questões, — ao ponto de impacientar os ministros com o tempo que demorava a chegar a uma conclusão. Foi também ensinado pelo pai a desconfiar de tudo e de toda a gente, consciente de que quem detém tanto poder se torna num alvo fácil, ontem como hoje, dos "yes, men", que recorrem à lisonja e à mentira em benefício próprio. Por isso, sim, era prudente, porque queria muito acertar.

Este era ou não o rei certo para Portugal?

Depois do desastre de Alcácer-Quibir e da necessidade de canalizar todos os recursos para resgatar os milhares de cativos, Portugal estava depauperado de gente e de dinheiro. Os campos estavam abandonados, faltava o pão, a peste tomava muitas cidades como Lisboa, e a crise sucessória aberta com a morte primeiro de D. Sebastião e depois do Cardeal-rei D. Henrique dividia o reino. D. Filipe tinha um plano estruturado para Portugal e após ter sido jurado rei, nas cortes de Tomar, vai contribuir para o desenvolvimento da economia portuguesa. Mas acredito que se o Cardeal D. Henrique se tivesse decidido a tempo e horas pela sua sobrinha favorita, a infanta D. Catarina, teria sido ela a rainha certa para Portugal.  

Há uns anos, Henry Kamen, um historiador britânico, disse que Filipe I "foi senhor do maior Império no mundo, mas nunca se deu qualquer importância e ao contrário dos reis seus contemporâneos, nunca pensou em si em termos de grandeza", concorda com isto?

É difícil analisar esta citação fora do contexto da biografia que Kamen fez de D. Filipe, e que não li, mas é verdade que D. Filipe é um rei de gabinete, que se sente melhor entre os papéis e a natureza, do que em festas na corte, que prefere investir na ciência e na arte, do que no cerimonial cortesão, mas discordo que nunca tenha pensado em si mesmo em termos de grandeza. D. Filipe era um rei absoluto, e acreditava que acima dele só estava Deus...

Qual foi o maior desafio a escrever sobre este rei? Tinha algum preconceito sobre ele, por assim dizer?

Julgo que a maioria dos portugueses tem preconceitos quando se fala no tempo dos "Filipes", arrumamos os três reis numa palavra só, como se fossem iguais, e na realidade não podem ter sido mais diferentes. Mas foi exatamente a consciência de que não sabia nada sobre este período da História, para lá dos lugares comuns, que me levou a querer estudá-la. E a surpreender-me a cada momento como, espero, aconteça agora com o leitor. 

Capa do livro
Capa do livro "Filipe I de Portugal - O Rei Maldito". Foto: Planeta Editora

Filipe I foi casado com 4 mulheres, acha que foram casamentos por conveniência ou houve sentimentos envolvidos?

Casou primeiro com uma portuguesa, depois com uma inglesa, de seguida com uma francesa e por fim com uma "alemã" e, como acontecia sempre nestes casamentos, todos eles aconteceram por razões de Estado. Mas isso não significava que, uma vez concretizados, não pudessem evoluir para relações de amor profundo ou, pelo menos, de grande amizade e cumplicidade. O primeiro casamento durou apenas um ano, e a princesa Maria Manuela morreu no parto, o segundo, com Mary Tudor, com o dobro da sua idade, além de curto foi atribulado, mas a união com Isabel de Valois, uma princesa francesa, acabou por ser um casamento de amor. O último, com a sua sobrinha Ana de Áustria (a consanguinidade destes casamentos é assustadora), foi um casamento sereno, mas de grande afeto, e o rei ficou muito abatido quando a rainha morreu em Badajoz, a meses de entrar em Portugal e ser jurada também nossa rainha. E D. Filipe esteve quase, quase, para casar ainda mais uma vez, mas esse segredo está no livro.

Em que se inspirou para escolher o título deste livro? E a capa?

O título sintetiza a ideia que muitos portugueses têm de D. Filipe, e para o qual contribuiu a lenda negra que foi criada contra ele nos Países Baixos – rei "mal-dito", ou seja, de quem se diz mal. Mas deve ser imediatamente ligado à mulher que surge na capa e no subtítulo porque o meu livro não é uma biografia de D. Filipe, é sobre a luta entre os dois primos, netos de D. Manuel I pela coroa de Portugal. Contada pela voz de um e de outro, alternadamente, ambos com o mesmo peso. E há tanto que desconhecíamos...

Quanto à capa, é uma recreação quase cinematográfica destes dois personagens, porque para mim é importante que o leitor entenda que estamos a falar de pessoas de carne e osso, gente que quero insuflar de vida para que o leitor os veja e sinta "a três dimensões", e não como retratos antigos, de gente presa num museu. 

Já escreveu vários romances históricos durante o seu percurso como escritora, no que é que este se destaca dos outros?

Este é o meu décimo primeiro romance histórico e todos são diferentes uns dos outros, desde logo, porque dão voz a pessoas com uma personalidade muito distintas umas das outras, que viveram em épocas e contextos diferentes. Talvez estes dois personagens, Filipe e Catarina, tenham a mais valia de serem os mais desconhecidos dos portugueses o que, espero, suscite a curiosidade do leitor, como suscitou a minha.

Qual foi o feedback que teve após o lançamento deste livro?

A velocidade com que as pessoas leem o livro e me dão feedback sobre ele é o melhor elogio que me podiam fazer — as redes sociais têm esse lado extraordinário de nos permitir um contacto próximo com os leitores. Temos, também, o indicador dos tops das livrarias e, felizmente, há quase um mês que o livro lá está nos lugares cimeiros, e o indicador da procura — já estamos na 4ª edição.  

Como surgiu este seu interesse pela história de Portugal, que tantos anos já tem?

O meu pai era formado em História e um contador de histórias, e por isso cresci a saber que a História não tem de ser uma "seca", nem um compêndio de datas. Quando me propuseram escrever um romance histórico tive medo de não ser capaz, mas Filipa de Lencastre encontrou leitores interessados e ávidos de saber mais sobre as nossos reis e rainhas. E eu já tinha, entretanto, ficado "viciada" na História. 

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