Allen v. Farrow, o documentário que tenta chegar à verdade sobre Woody Allen
O novo documentário da HBO analisa ao detalhe as alegações de abuso sexual feitas por Dylan Farrow bem como a tumultuosa relação entre Woody Allen, Mia Farrow e Soon-Yi Previn. Pelo caminho, reflete sobre a difícil separação entre a obra e a moral dos artistas.
Ao longo dos quatro episódios do documentário que recupera a complicada história de um dos mais icónicos casais de Hollywood, Woody Allen sublinha várias vezes o seu desinteresse por ter filhos. Quando Mia Farrow diz ao parceiro de 12 anos e mais de uma dezena de filmes, que quer engravidar, Allen concorda, mas avisa que nada quer ter a ver com os cuidados diários de uma criança. Mais tarde, já com a possibilidade de adoção em cima da mesa, o realizador e argumentista acrescenta que uma menina loira o poderá fazer mudar de ideias.
Dylan Farrow tinha sete anos quando acusou pela primeira vez o pai adotivo de abuso sexual, mas muito antes disso, testemunham babysitters e amigos da família, a relação entre ambos já era descrita como "inapropriada e intensa". O episódio de alegado abuso, negado consecutivamente por Allen, terá acontecido na casa de Farrow no Connecticut, a 4 de agosto de 1992, e é contado ao pormenor pela pequena Dylan em vídeos filmados pela mãe e revelados ao público no novo documentário. 30 anos depois, Dylan regressa aos acontecimentos nas várias entrevistas que compõem a investigação da HBO: as suas palavras cresceram, mas o desconforto é o mesmo. "É estranho sentir-se medo e amor pela mesma pessoa," diz Dylan a certa altura, um conflito de sentimentos que atravessa todo o documentário.


Assinado por Kirby Dick e Amy Ziering, conhecidos pelos seus trabalhos cinematográficos sobre abuso sexual, Allen v Farrow parte assumidamente da perspetiva da família Farrow, entre Dylan, Mia (que apenas concordou ser entrevistada no último minuto) e Ronan, filho biológico do casal e um dos jornalistas que investigou as acusações de violação e abuso sexual contra o produtor Harvey Weinstein, na origem do movimento #MeToo. Allen não quis participar no documentário, surgindo em vídeos e entrevistas, bem como através de citações retiradas da sua autobiografia, A Propósito de Nada, publicada o ano passado. É o próprio Allen que descreve a sua relação com Soon-Yi Previn, adotada por Mia Farrow em 1977, como uma história de amor. E que acusa Farrow de ‘treinar’ Dylan como vingança por ter descoberto fotografias de Previn deixadas à vista de forma mais ou menos intencional. A versão oficial diz que o Soon-Yi tinha 21 anos quando começou a namorar com Allen, de 56, mas testemunhos ouvidos em tribunal e agora divulgados indicam que a filha de Mia Farrow visitava Allen desde o fim da adolescência. Casaram em 1997 e estão juntos até hoje.
Após as várias acusações mútuas entre Allen e Farrow, ainda em 1992, seguiu-se uma batalha pela custódia de Dylan e Moses, os dois filhos de Farrow adotados por Allen, e por Ronan. Foi o fim de uma relação que simbolizou uma era em Hollywood, o casal que vivia em apartamentos diferentes, separados pelo Central Park e que ligava e desligava as luzes para dizerem que gostavam um do outro. Allen v Farrow conta ainda com entrevistas a muitas das figuras que marcaram as diferentes investigações conduzidas nos anos 90, de assistentes sociais a procuradores do Ministério Público, e analisa as declarações da pequena Dylan aos olhos dos especialistas de hoje. Conversa ainda com jornalistas que acompanharam o caso na época e com críticos de cinema que analisam a obra de Allen, hoje com 85 anos, e a sua importância. Um debate cultural que parece apenas estar a começar.

O primeiro episódio de Allen v Farrow já está disponível na HBO.

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