Histórias de divórcio no feminino. “Seria muito fácil dizer que ele me traiu, mas fui eu que o traí a ele”

No meio de uma crise, o relato de uma mulher que se envolveu com outra pessoa e não se perdoou. Tomou a decisão de se separar “por medo” de perder o marido “ainda mais”.

Foto: IMDB / Sex and The City
28 de maio de 2024 às 19:02 Júlia Serrão

Um ano depois de casarem, o marido recebeu a oferta de um "emprego promissor" numa nova cidade. Se Carolina (nome fictício) quisesse acompanhá-lo teria de abrir mão do seu, no setor privado e sem possibilidade de transferência. A oportunidade era tentadora mas exigia alguma reflexão. O casal decidiu que ele devia aproveitar. E se inicialmente colocaram a hipótese de ficarem geograficamente separados, logo a descartaram.

A princípio tudo foi mais fácil para ele: com o novo emprego, o futuro afigurava-se tranquilo enquanto ela "deixara para trás tudo o que tinha, e estava longe da família com quem tinha laços muito fortes". Acabou por encontrar um trabalho temporário e mal pago. "Isso estabilizou-me mais a nível emocional, pois estava ocupada", conta, explicando que voltaram "a ser um casal unido" depois de três meses a discutir muito.

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Dois anos mais tarde, em 2020, a pandemia da Covid-19 aconteceu, e em março era decretado o primeiro confinamento. Nessa altura, Carolina já estava a exercer a profissão para que tinha estudado e com vários projetos privados em curso. Os dois ficaram sem trabalhar por uns tempos, à semelhança do que aconteceu pelo mundo e com igual apreensão no futuro. Mas, logo depois, ela começou a trabalhar online, conseguindo manter algum rendimento financeiro, e ele perdia o emprego: "Isso gerou um conflito emocional muito grande entre nós, porque eu passei a sustentar a casa e ele sentia-se extremamente constrangido pelo facto." Como o que Carolina ganhava não era suficiente para fazer face às despesas, o pai dela passou a ajudá-los, o que deixou o marido ainda "mais desconfortável, entrando em depressão". Começaram a discutir muito e de forma constante, e ele saiu de casa, ficando fora três semanas. 

A infidelidade e a tentativa de salvar o casamento

Apesar de andarem a discutir como nunca tinham feito, a ausência dele provocou nela um grande vazio. "Carente do carinho do meu marido, atenção e cuidado, deixei que um amigo meu se aproximasse e, quando ele insistiu um pouco mais, cedi" conta. Para acrescentar: "Eu estava muito sensível, fragilizada… com isto não estou a tirar a minha parte de culpa, de ter cedido, porque na verdade eu quis e eu fiz, se eu não quisesse eu não teria feito. Mas, depois, fiquei muito mal."

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Imbuída de um enorme sentimento de culpa, quando o marido voltou para casa contou-lhe o que tinha acontecido. "Ele sentiu-se profundamente traído. Obviamente com razão, pois até aí não tínhamos tomado a decisão de nos separamos." A notícia inesperada levou-o a sair de casa por mais algum tempo, e quando regressou tomaram a decisão de trabalhar a relação para "salvar" o casamento: "Fizemos terapia de casal durante um ano, mas ele continuava a mostrar-se muito sensível à situação, e eu ficava a imaginar como seria difícil nós lidarmos com isso se ficássemos juntos", comenta. Por isso, e ainda que, realça, "o amor não tivesse acabado", tomou a iniciativa e propôs que se separassem. Ele não se opôs.

À distância de sensivelmente dois anos e meio desse episódio, Carolina diz que consegue "entender o que ele sentiu e colocar-se no lugar dele": Aponta: "Tenho mais maturidade para pensar de forma diferente, e vejo que realmente não lutei tanto quanto ele lutou. Porque quando ele decidiu voltar para casa sabendo que eu tinha sido infiel, dedicou-se imenso. Nós viajámos muito e ele procurou todas as formas de estar próximo e presente, superar o sucedido." Afirma que tomou a decisão de se separar "por medo de perder" o marido "ainda mais."

Depois do amor, talvez o amor

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Os dias que sucederam a separação, e sobretudo o divórcio, que oficialmente materializa esse acontecimento sempre doloroso independente das razões que o desencadeia, foram particularmente duros. "Porque no meu caso, o amor não tinha acabado…se calhar ainda não acabou. Os dias ainda são difíceis!", afirma. Também se culpabilizou muito durante algum tempo. 

Mas cada dia que nasce é uma vitória sobre outro. Carolina, agora com 38 anos, está divorciada há quase ano e meio, e consegue manter uma "relação de amizade" com o ex-marido. Falam-se menos por estes dias, em que ele está a construir uma nova família. Ela continua sozinha, cuidando dela e aquietando-se. Depois de alguns relacionamentos passageiros com pessoas que encontrou nas apps e sites de encontros, conclui que "os relacionamentos estão muito fluidos, voláteis, superficiais". Apesar disso, mantém a esperança que talvez o amor seja possível depois do amor.

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