A criação de um best-seller
Uma carteira ultradesejável esgota-se poucos dias depois de aparecer nas lojas. As marcas de luxo sonham com esta fórmula mágica para estabelecerem o seu poder. Na época das redes sociais, descodificamos as novas estratégias de marketing.

A sua definição no dicionário é, no mínimo, concisa: "Best-seller. Grande êxito de vendas." E não subentende a vitória implícita. No entanto, não estaremos a referir-nos a um Graal desejado por todas as marcas de moda e de luxo? Os especialistas do sector são muito menos comedidos em relação a este assunto e também mais rigorosos: "É preciso sublinhar a diferença entre as peças ditas icónicas e os best-sellers", afirma Bruno Pavlovsky, presidente das atividades de moda da Chanel. "Os ícones identificam a marca. São reconhecíveis à primeira vista e fazem parte da história e do ADN da marca."
A caminho da intemporalidade

Não faltam ícones a Chanel: o vestido preto, os slingback – sapatos bicolores criados em 1957 –, a carteira 2.5, para mencionar alguns. "Quanto aos best-sellers, são peças que emergem de uma coleção e que suscitam um interesse quase imediato na cliente", afirma Bruno Pavlovsky. "Esta paixão é generalizada. A dita peça fica esgotada em todo o mundo." A carteira Gabrielle, lançada em 2017, é um exemplo perfeito. "O seu sucesso foi imediato. Passou, assim, a integrar os best-sellers que decidimos voltar a comercializar esta estação e poderá juntar-se ao clã das peças icónicas." Com efeito, não é raro um best-seller tornar-se uma peça intemporal e ganhar estatuto entre os ícones da marca. "É o caso da carteira Saddle, da Dior", explica Maud Barrionuevo, diretora de compras do site de vendas online 24sevres.com. "A Saddle acaba de ser reeditada pela marca quase vinte anos após a sua criação. A Saddle renasce com novas cores e em novos materiais. Está prestes a tornar-se um ícone. Isto não significa que tal aconteça a todos os best-sellers. Alguns, apesar de um sucesso fulgurante, não duram mais do que uma estação…"
O desejo e a raridade
São estes os mistérios do sucesso das vendas. Alix Morabito, diretor de moda das Galeries Lafayette, esclarece: "Uma coleção tem, geralmente, três componentes: os carried over, as famosas peças transportadas de uma estação para a outra; as peças sazonais, com longevidade limitada; e as peças-imagem, ou seja, peças visualmente fortes que vemos frequentemente nas campanhas publicitárias e na imprensa. Todas as estações, algumas peças de roupa e acessórios distinguem-se destas duas últimas categorias e tornam-se best-sellers." Foi o caso da carteira Peekaboo, de Fendi, da Luggage, de Celine, da Petite Malle, de Louis Vuitton, dos botins Susanna, de Chloé, dos slingback, de Chanel, da carteira Kelly, de Hermès, dos mules-sapatos forrados, de Gucci, da carteira Dior Book Tote, dos sapatos Rockstud, de Valentino, da gabardina Heritage, de Burberry, das carteiras Muse Two, de Yves Saint Laurent. A lista de sucessos é longa. "Um produto junta-se ao círculo exclusivo dos best-sellers porque combina o fator desejo com a raridade", diz Maud Barrionuevo, da 24sevres.com. "Suscita um enorme interesse geral na imprensa, nas redes sociais e na própria indústria. Chega frequentemente a ficar esgotada – sold out. E essa escassez provoca ainda mais desejo e é assim que surgem as listas de espera."

A equação impossível
A Gucci excede-se neste exercício. Desde a chegada de Alessandro Michele à sua direção artística que a marca italiana conta com um número recorde de best-sellers. Embora a marca – como tantas outras – não mencione os números, podemos evocar o sucesso da T-shirt com o logótipo da marca, lançada em 2016, que esgotou em todo o mundo. O mesmo se aplica aos sapatos de ténis Flashtrek, enfeitados com cristais amovíveis, ou a carteira GG Marmont: dois modelos que esgotaram assim que chegaram às lojas… "Alguns best-sellers são tão desejáveis que se esgotam em poucos minutos", sublinha Maud Barrionuevo. "Foi esse o caso das colaborações de Rimowa com a Off-White e a Supreme, ou das sapatilhas Archlight Louis Vuitton…" Existirá alguma fórmula mágica para criar um best-seller? "Não e ainda bem!", afirma Bruno Pavlovsky. E acrescenta: "Nós propomos e a clientela escolhe. São as clientes que detêm o poder. Imaginem a tristeza que seria se os best-sellers fossem previsíveis? A criatividade seria controlada. Pois bem, é essa criatividade que dá vida à Moda." E o sucesso de alguns produtos é, por vezes, surpreendente. "Em 2006, nunca imaginaríamos o sucesso fenomenal da Coco cabas, XXL, em vinil!"
O encontro com o grande público

O mesmo espanto invadiu os estúdios de Isabel Marant por causa do sucesso planetário das suas sapatilhas Becket. "Eu ainda me lembro de a Isabel chegar ao meu escritório e de me mostrar os desenhos daquela sapatilha em forma de OVNI. A sola compensada dissimulada e as suas proporções não existiam, em 2012. Isabel acreditava no seu design. Eu tinha algumas dúvidas", recorda Sophie Duruflé, co-fundadora e diretora-geral da marca. "Essa sapatilha ainda hoje é o nosso maior best-seller. Já produzimos 196 mil pares!" Para Florence Muller, historiadora de Moda, qualquer produto se pode tornar um best-seller. "A história da Moda testemunha-o. Há imensos best-sellers que o foram por acaso, graças a um conjunto de circunstâncias ou por terem sido colocados nas mãos da pessoa certa. A carteira Lady Dior é um exemplo perfeito. Quando a Casa Dior a lançou, não tinha nome. Vendeu-se bem, mas nada de especial. Ela ganhou o seu encanto quando a Dior ofereceu uma a Lady Di, em 1995. Diana apaixonou-se por ela, literalmente, e usou-a em todos os seus eventos oficiais. A carteira recebeu o nome de Lady Dior. Quem fala em best-sellers fala em encontros entre o produto e o público."
Instagram, motor de invejas
Um best-seller não se pode programar, mas o seu encontro bem-sucedido com o público pode ser provocado. Para o conseguir, não faltam ferramentas às marcas. Estas incluem campanhas publicitárias, protagonizadas pelas musas do momento, e os editoriais de moda publicados nas revistas são incontornáveis. É igualmente impossível não mencionar as redes sociais, mais especificamente o sucesso mundial do Instagram. "Para mim, um best-seller é um produto no qual a cliente consegue rever-se", afirma Alix Morabito. A forma como as top-models, as celebridades e as influencers usam certas peças de moda tem impacto no comportamento da cliente. À custa de verem determinada carteira, saia ou sapatilhas no Instagram, ficam com inveja. O exemplo mais incrível foi o sucesso das botas altas Knife, de Balenciaga. No inverno passado, ficaram sold out nas Galerias Lafayette em tempo recorde." O Instagram estimula a audácia. Há algum tempo, ninguém poderia imaginar o atual entusiasmo pelos dad sneakers, as sapatilhas volumosas hoje em dia tão populares. "Esta estação, Balenciaga, Louis Vuitton, Chloé e Prada, entre outras, apresentam as suas interpretações do dad sneaker", recorda Maud Barrionuevo.

A viralidade do sucesso
Este entusiasmo súbito e coletivo por um produto em particular não é um fenómeno isolado – parece que este inverno tudo gira à volta dos hoodies em lã! Isso é encorajado pela viralidade das redes sociais: publica-se, vê-se, partilha-se. Guillaume Delacroix, fundador da agência de imprensa DLX, não o desmente: "Nós representamos a marca de carteiras Wandler que se deu a conhecer, unicamente, através das redes sociais e tem um sucesso gigantesco. A marca não tem ainda dois anos, mas já tem 80 pontos de venda em todo o mundo e imensos best-sellers."
A fim de promover as vendas, várias marcas desenvolvem também a estratégia do gifting, seja de roupa ou de acessórios, a esta ou aquela pessoa famosa para que ela seja fotografada com a peça ou a publique na sua conta de Instagram. "As nossas clientes possuem acesso à tecnologia e dados necessários para saber o que uma publicação gera em termos de concretização de transação: a taxa média é de cinco aquisições em cada 100 pessoas", sublinha Guillaume Delacroix. Ele vai ainda mais longe. Segundo Delacroix, poderá haver produtos feitos para serem best-sellers à nascença. "Em breve, a agência vai colaborar com uma empresa americana que trabalha em inteligência artificial aplicada à Moda. O seu software ambiciona prever se um produto vai ou não ser bem-sucedido. Esta ferramenta anunciará quantas publicações uma carteira ou um casaco poderá gerar e, de seguida, contabilizará o número de potenciais vendas." Uma pequena revolução digital ainda incerta e cambaleante, mas que poderá mudar a génese de um best-seller. A não ser que os criadores e os consumidores de luxo decidam não se submeter à ditadura dos algoritmos.

A mule Princetown, de Gucci
Nascimento: 2015
Criador: Alessandro Michele

ADN: Uma interpretação divertida e contemporânea do mocassin icónico da marca.
Sinal particular: O seu famoso forro em pêlo de borrego.
O clique: Quando os editores de moda de todo o mundo começaram a usá-la nas ruas parisienses ou milanesas, tornando-a o número 1 dos passeios urbanos.
A carteira Saddle, de Dior
Nascimento:1999
Criador: John Galliano
ADN: Um espírito chique equestre com curvas que fazem lembrar a sela de um cavalo.
Sinal particular: Um pendente dourado em forma de D.
O clique: Vista no braço de estrelas da década de 2000, como Beyoncé, Kate Moss e, sobretudo, Sarah Jessica Parker, aliás, Carrie Bradshaw em Sexo e a Cidade. Voltou a aparecer no braço das celebridades, em 2018, nomeadamente Bella Hadid, Kendall Jenner, Adwoa Aboah, após o seu regresso incrível, este ano, nas novas versões imaginadas por Maria Grazia Chiuri para a Dior.
A carteira Gabrielle, de Chanel
Nascimento: 2017
Criador: Karl Lagerfeld
ADN: Acolchoamento, corrente metalizada, duplo C. Enfim, todos os essenciais da Chanel.
Sinais particulares: Uma base rígida sob um volume flexível com uma corrente dupla que permite usá-la com o máximo estilo: uma corrente sobre um ombro e a outra na diagonal, sobre o outro.
O clique: O lançamento de uma nova carteira Chanel é, por si só, um caso de sucesso. Com embaixadoras como Kristen Stewart, Caroline de Maigret, Pharrell Williams e Cara Delevingne, é igualmente um best-seller garantido.
O sapato Rockstud, de Valentino
Nascimento: 2010
Criadores: Pierpaolo Piccioli e Maria Grazia Chiuri
ADN: Um espírito punk e sofisticado.
Sinais particulares: As famosas tachas directamente inspiradas nos pregos dourados que enfeitam as portas de Roma.
O clique: Imediatamente usados e instagramados por it girls e estrelas de cinema, desde Dakota Fanning a Olivia Palermo, passando por Emma Stone.
A carteira Petite Malle, de Louis Vuitton
Nascimento: 2014
Criador: Nicolas Ghesquière
ADN: A versão minicarteira das emblemáticas LV, criadas pelo banqueiro Albert Kahn, no início do século XX.
Sinais particulares: As três pequenas cruzes, assinatura de Albert Kahn para distinguir as suas malas.
O clique: Vista no braço de estrelas, desde Julianne Moore a Michelle Williams, Alicia Vikander, Chloë Sevigny, Chloë Grace Moret, entre outras.
