Iacobella Gaetani, uma italiana apaixonada pelo mundo

Fundadora da marca Iacobella Naked & Sacred colabora pela segunda vez com a Missoni. Quem é esta artista que escolhe - entre outros destinos - Lisboa para viver, cidade a que também mostra a sua arte?

27 de dezembro de 2019 às 07:00 Rita Silva Avelar

Iacobella Gaetani nasceu no Canadá, mas não tem memórias deste país. Filha de pais italianos, Iacobella correu o mundo a viajar, vivendo de local em local, das Caraíbas ao Brasil. Estudou em Londres, mas foi em Madrid que começou a universidade, terminando em Nova Iorque. Fez voluntariado em sítios como o Peru, a Índia e a Etiópia. Acabou por decidir viver em Roma, mas Portugal pisca-lhe o olho durante uma boa parte do ano, assim como o Brasil, agora que é mãe.

O espírito viajante e explorador corre-lhe nas veias (do lado paterno, a família é descendente do famoso explorador italiano Baron Raimondo Franchetti). Foi a paixão por viagens e pela descoberta de culturas nativas, que cultivam as tradições artesanais de costurar manualmente, que se apaixonou por esta arte. Mas acabou por ser numa praia de Ipanema, no Rio de Janeiro, que nasceu aquela que é hoje a sua marca: Iacobella Naked & Sacred, em 2009. Porém, só em 2017 se afirmou no mercado, sendo hoje uma das marcas de acessórios preferidos de ícones de estilo como Kate Moss.

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No dia em que se viu a última lua cheia da década, a artista apresentou, na residência atual do irmão em Lisboa, a sua mais recente coleção de carteiras e malas, feitas à mão com cristais e peles vegetais tingidas em várias cores, do preto ao roxo, passando pelo verde e pelo vermelho. Todos os modelos têm nomes mágicos, com significado, alusivos a um local mítico ou a um simbolismo específico. Os cristais que adornam as peças que Iacobella produz são escolhidos por si, sempre que todos os anos vai ao Brasil.

No ano passado, a marca foi convidada para uma colaboração com a consagrada marca italiana Missoni para o outono/inverno 2018-19. O resultado foi uma coleção de carteiras com 10 combinações de cores. O desafio voltou a ser lançado por Margherita Missoni, da qual Iacobella é amiga, e na primavera-verão de 2020 as duas marcas voltam a juntar-se com novas combinações originais.

Sei que cresceu entre várias partes do mundo, de Itália às Caraíbas. Que memória retém dessa infância? São lugares que continuam a inspirá-la?

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Mais do que viajar, vivemos em muitos sítios durante períodos longos. Eu chamo-lhe slow traveling. Vivemos dois anos nas Caraíbas, passávamos longas temporadas no Brasil, e nunca viajávamos muito como turistas. Nasci no Canadá, mas parti quando era muito pequena. No ano passado, antes de ficar grávida, estava prestes a mudar-me para o Canadá, na verdade. Os meus pais são italianos, o meu pai vive em Itália e é por isso que regressei para lá. A minha mãe não vive em Itália há muitos anos. Tenho um irmão, que vive metade do ano no Brasil e a outra metade em Lisboa.

Em dado momento começou a fazer as suas próprias viagens. Quais foram os destinos mais apaixonantes e porquê?

A primeira vez que viajei sozinha, fui à Etiópia. Quis viajar com um propósito, e por isso fui fazer voluntariado. Apaixonei-me pela Etiópia. Fiz voluntariado com a [associação] Madre Teresa, e acabou por ser a experiência mais forte que tive em toda a minha vida. Ia três vezes no mesmo ano, e comecei a ir ao Peru, à Índia… devagar, comecei a ir durante um mês de forma periódica. Quando se ganha a confiança para estar longe de casa, é mais fácil.

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Na Índia, o meu irmão ofereceu-me um retiro de ioga e meditação, como presente de Natal, que durava um mês. Acabou por fazê-lo comigo, e o que aconteceu foi que ficámos não um mas nove meses na Índia. Como o meu irmão é músico, acabou por fazer cursos lá. Em dado momento, uma familiar afastada ligou-lhe para dizer que estava a realizar um documentário ficcionado na Índia [em Arunachal Pradesh] e precisava de um engenheiro de som. Ele aceitou, e eu fui com ele. Tornei-me assistente, mas acabei por ser a protagonista do filme (risos). Foi incrível, porque Arunachal Pradesh é uma zona da Índia que não é turística, fica na fronteira [com o Butão] e é preciso permissão para entrar. Foi também assim que fui parar a Itália, porque esta mulher convidou-me para a acompanhar e fazer a pós-produção com ela. Na altura eu ainda vivia, oficialmente, em Londres, e não queria voltar. Estudei lá até aos 18 anos, e mais tarde estudei Comunicação Intercultural na Universidade Americana de Madrid, terminando o curso em Nova Iorque. Como italiana, sempre quis regressar a Itália, até porque o meu pai vive em Roma.

Em que momento descobriu as culturas nativas que a inspiraram para criar a Iacobella Naked & Sacred?

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Nas minhas viagens, comecei a criar acessórios. Na Etiópia, pedia que me fizessem as minhas próprias joias. Mas no Brasil foi onde tudo começou. Como é um sítio para onde viajo com alguma frequência, em 2009 comecei a levar materiais de Itália para o Brasil, como tecidos em pele… Coisas que achava durante o ano, juntava e levava para criar peças em conjunto com artesãos brasileiros. Em Ipanema há muitos hippies e artesãos, e encontrei um com quem senti uma conexão especial. Eu estava numa praia de Ipanema quando o conheci. E durante três anos criámos peças. A maior parte das coisas eram presentes para as minhas amigas em Itália. Nunca foi algo que fiz na perspectiva de negócio. Quando decidi viver em Itália, foi quando decidi criar a marca.

Como era a primeira carteira que criou já com a marca?

O primeiro modelo foi a tote bag (hoje, a carteira Atlantis). Se a observarmos ao pormenor conseguimos ver que tem diferentes pontos de costura, como o macramé. Hoje em dia, a confecção artesanal deste tipo de peças voltou a estar na moda mas as pessoas continuam sem entender bem que é um trabalho lento, minucioso, logo mais caro. E existem muitas coisas a que chamam "handmade" e que na verdade não o são.

E em que momento entram as pedras (ou cristais) incrustadas nas carteiras?

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Existem desde sempre nas minhas peças. As coisas que eu fazia com os índios tinham sempre imensas pedras, seguradas por macramé. Mas para mim isso era demasiado hippie e comecei a usar apenas uma pedra em cada carteira. Sou eu que as escolho quando todos os anos vou ao Brasil. Eu adoro o quartzo rutilado, que agora é mais difícil de encontrar. Desde muito jovem que coleciono pedras, e eu própria as colocava nas carteiras. Hoje gostava de as ter de volta (risos) porque eram mesmo especiais. Hoje em dia usamos vários cristais quartzo, do rosa ao branco, à turmalina ou à ametista. Uma vez ao ano vou a feiras de cristais, a maior na Europa acontece na Suíça.

Porquê Naked & Sacred?

Eu tenho um grande amigo colombiano a viver no Brasil que é xamã (palavra que, por acaso, eu odeio). Durante uma conversa, ele disse-me que eu precisava de deixar de ser tão séria porque a vida não é para ser levada com muita seriedade. Disse-me para viver a vida de forma sagrada. E a palavra nua, para mim, significa deixar para trás tudo o que seja "extra", mesmo que sejam ideias ou pensamento, ou algo material. Então cheguei ao nome Naked & Sacred [nu e sagrado, em português].

Qual foi o maior desafio ao colaborar com a Missoni?

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É o facto de, agora, este projeto ser estruturado. Porque comecei como um hobby, de forma não profissional. A abordagem da Missoni estabeleceu um método e regras legais que me levaram a ter que estar preparada. A minha equipa é incrível, e foi graças a eles que tudo foi possível. Tornar a marca estruturada o suficiente para poder trabalhar com a Missoni foi o maior desafio. O meu trabalho profissional acabou por me ajudar, também, a nível pessoal.

Se pudesse escolher uma cultura ou um estilo de vida que regesse a sua, qual seria?

Eu adoro tanto o Brasil… mas Itália e Portugal apaixonam-me. Os meus bebés nasceram aqui, porque a minha mãe vive em Melides há sete anos. Quando fiquei grávida do meu primeiro bebé o primeiro pensamento foi: vou para casa da minha mãe (risos). Aconteceu também da segunda vez. Hoje em dia sinto-me mais europeia que nunca. Espero viajar para muitos sítios, durante a minha vida.

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