Cópia, imitação e plágio – quais são as consequências reais para a indústria?

Antes de chegarem às montras dos designers que as criaram, ideias copiadas aterram nas lojas dos impérios de fast fashion para democratizar a moda, mas também para matar o potencial dos originais que imitaram. Como é que a cópia afeta os criadores e os consumidores? Fomos investigar.

30 de outubro de 2017 às 22:20 Carlota Morais Pires

Dizem que a Alta-Costura nasceu pelas mãos do inglês Charles Frederick Worth, que foi o primeiro designer a imaginar as apresentações das suas coleções em desfiles com modelos, mas também a coser etiquetas com o seu nome nos vestidos que criava – era assim que garantia a autenticidade das suas peças. A cópia não é (mais um) problema dos tempos modernos - e não é preciso investigar a fundo para descobrir os casos mais graves de plágio de ideias na moda. Já em 1930, Gabrielle Chanel uniu-se a Madame Vionnet para processar Suzanne Laneil, quando descobriram que tinha criado 48 imitações das peças das duas criadoras. Foi a partir dessa data que o tribunal francês começou a dar maior proteção aos criadores de moda, reconhecendo o seu trabalho criativo com a mesma legislação aplicada a escritores e artistas.

"Ser copiado é o preço a pagar pelo sucesso", dizia Coco Chanel. Cinquenta anos mais tarde viríamos a assistir à edificação de toda uma indústria que se alimenta da cópia das coleções que vemos desfilar nas passerelles. Os impérios de fast fashion continuam a crescer à medida que imitações de peças da Gucci, Vetements, Balenciaga, Céline e Chanel voam das prateleiras até esgotarem em poucos dias. O que as lojas da Inditex (como a Zara e a Uterqüe), a H&M e a Topshop fazem é democratizar a moda – trazem as tendências de Nova Iorque, Londres, Milão e Paris para o mundo, vendem imitações óbvias de marcas preferidas da indústria por menos de um terço do preço. "Como criadores até nos podemos sentir elogiados quando vemos uma peça inspirada numa ideia nossa numa loja. Já me aconteceu, quando a Zara criou uma camisola muito semelhante a uma que tinha apresentado numa coleção anterior", conta Diogo Miranda à Máxima. "É bom sinal quando estão atentos ao nosso trabalho. Por outro lado, também é frustrante, porque estamos a trabalhar numa coleção entre quatro a seis meses, mantemos tudo em segredo e, depois de apresentada, só chega ao público passados outros seis meses. Entretanto podemos ver a peça numa loja de mass market logo depois do desfile e podemos comprá-la por 29,99 euros. Claro que este preço levanta ainda outras questões, porque não sabemos onde foi produzida nem em que condições", acrescenta o criador português. 

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Na verdade, as marcas de fast fashion souberam adaptar-se à modernidade – investiram nos seus sites e nas redes sociais, contrataram supermodelos e superstylists, aperfeiçoaram a sua imagem, tornaram-se mais exigentes com as peças e com a estética das suas campanhas. Todas estas mudanças eliminaram o preconceito que havia em relação às marcas mais acessíveis nos anos 90, altura em que as associávamos a camisolas com borbotos, camisas em poliéster e saias com bainhas descosidas. Hoje encontramos camisolões em caxemira na Zara e sapatos na Uterqüe que não trocaríamos por um par de Louboutins. Os consumidores deixaram de olhar as marcas consideradas low cost com preconceito mais ou menos ao mesmo tempo que as começaram a coordenar com peças de luxo. E esta jogada mudou tudo para nós, consumidores, mas também para as equipas que trabalham durante meses para verem as suas ideias roubadas em segundos.

"Quando cópias quase idênticas de objetos de luxo chegam às lojas de marcas de high street acabam por tornar os originais menos apetecíveis. O consumidor dos produtos de luxo já não vai querer pagar várias centenas ou milhares de euros por uma peça que tem uma versão muito semelhante à venda na Primark ou na H&M", explica Elain Maguire, professora de direito de moda, em entrevista ao site inglês Business of Fashion. É difícil entrar numa guerra com um gigante de fast fashion – não só pela dimensão das suas estruturas, mas também porque geralmente têm departamentos legais tão importantes quanto os de design. Depois, se falarmos de designers em ascensão, é ainda mais complicado investir fundos necessários ao crescimento da marca em longos e dolorosos processos contra advogados experientes.

Por isso mesmo, as marcas (e também os consumidores) estão a usar os trunfos da Internet para denunciar os casos mais óbvios numa tentativa de consciencializar quem compra mas também quem vende. É o caso do site norte-americano Fashioncopycats.com, que publica online montagens que comparam peças de designers com suas imitações low cost, mas também outros casos de marcas do mesmo sector que se inspiram nos trabalhos de outras.  

O calendário que rege a indústria obriga os criadores a apresentarem as suas coleções seis meses antes de serem vendidas nas lojas – hoje qualquer pessoa pode ver um desfile em livestream e ter acesso a todas as imagens online poucas horas (ou serão minutos?) depois de serem apresentadas. Esta antecipação já começa a ser suprimida com as novas regras da lógica see now, buy now, que disponibilizam a coleção para venda imediatamente depois da sua apresentação; mas todas as marcas que continuam a seguir o registo temporal de sempre dão margem às lojas de fast fashion para colocarem nas lojas cópias das suas peças ainda antes de os originais chegarem às prateleiras.

A própria organização do mercado não ajuda as marcas nestes casos, mas também somos nós, consumidores, que deviamos começar a colocar algumas questões - onde é que esta peça foi produzida e com que recursos? Porque é que tem este preço? E qual é a qualidade dos materiais e do corte? Prefiro pagar menos e comprar mais peças ou pagar mais por roupa e acessórios que vão durar uma vida? O futuro da indústria está nas nossas mãos - só temos de fazer as escolhas certas para começar a mudá-la. 

   

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