As novas clientes do luxo
A explosão dos países emergentes afetou a trajetória dos artigos de luxo. Menos estereotipadas, mais conectadas e mais exigentes, as consumidoras estão igualmente mais recetivas a surpresas, a produtos inovadores, ao mix & match… mas continuam a sonhar com o chique “à francesa”.

Chamamos-lhe Henry, um acrónimo 100 por cento inventado pelo marketing, em 2016, para designar a nova cliente do luxo e que significa "High earner not rich yet", ou seja, alguém que ganha bem, mas que ainda não é rica. Uma pessoa com poder económico, mas que ainda não é milionária. Henry era, segundo os oráculos anglo-saxões do consumo, a nova consumidora do setor. É aquela que foi qualificada na década de 1990 como yuppie (young urban professionna/jovem quadro de alto nível) ou dink (double income no kids/ parte de um casal profissionalmente ativo, sem filhos). Mas a cliente do luxo de 2018 não se deixa catalogar desta maneira. Há uma única certeza a seu respeito: nestes dois últimos anos ela mudou profundamente, tornando-se simultaneamente mais jovem e mais exigente. Uma ave rara e sedutora, atrás da qual se escondem várias facetas e que suscita muitas dúvidas. Fará ela parte da clientela tradicional? Ou das millennials, uma outra designação ampla que tanto se aplica aos nativos da década de 1980 como aos que nasceram a partir da década de 2000? Será ela fiel ou volátil?
Um primeiro esclarecimento é-nos dado por Christel de Lassus, professor universitário (responsável pelo Master 2 Innovation Design et Luxe, da Universidade Paris-Est Marne-la-Vallée): "Para começar, as Henry representam uma categoria social situada entre a classe média e as VVR (Very very rich/muito, muito ricas), principalmente as americanas na casa dos 30 anos – sobretudo os talentos tecnológicos de Silicon Valley –, cujos rendimentos anuais se encontram entre os 250 mil e os 500 mil dólares. Mas, hoje em dia, esta nova classe de consumidoras está essencialmente presente nos países emergentes." Dirigimo-nos, portanto, a territórios distantes para encontrar estes espécimenes afortunados na companhia de Franck Delpal, economista do Instituto Francês da Moda. "Historicamente, a trajetória do luxo era partilhada entre americanos e europeus", explica. "A partir da década de 1980, os japoneses impuseram-se. Depois, na década de 2000, surgiu um mosaico emergente com brasileiros e chineses. Agora, os asiáticos representam 51% da clientela do luxo, com 32% de chineses contra 23% de americanos e 19% de europeus." O cálculo é rápido de fazer: os primeiros tornaram-se os reis da corrida e são eles que, entre os 415 milhões de consumidores de luxo na indústria da moda, ditam os seus desejos aos imperadores da moda.

Extravagância cool
O gabinete de assessoria estratégica Bain & Company prevê que 80% dos novos consumidores do setor sejam chineses até 2020. Para compor o seu perfil, nada melhor do que dar um passeio pelo SKP Beijing, o centro comercial de luxo da capital chinesa. "Passamos por mulheres que em nada ficam a dever às parisienses, às nova-iorquinas ou às milanesas mais elegantes", afirma Delphine Vitry, cofundadora da MAD Network (um gabinete de assessoria sobre a experiência do cliente e o desenvolvimento das vendas para as marcas de luxo). "Estamos longe dos estereótipos. A China é o país com mais mulheres milionárias. Não são herdeiras, mas self-made-women, mulheres bem informadas, abertas para o mundo e adeptas do digital. Esta população consciente e exigente emergiu nos últimos vinte anos e está em permanente mudança."
Confiante, conectada, mais especializada do que as mulheres mais velhas, a cliente do luxo que antigamente adorava os logótipos prefere hoje o streetwear ou o estilo extravagante, cool e a raiar o absurdo da Gucci, por exemplo. Ela não hesita em trocar marcas estabelecidas por marcas mais confidenciais. Maud Barrionuevo, diretora de aquisições de 24 Sèvres, o website de moda feminina de topo de gama, lançado há um ano, pode testemunhar estas novas tentativas: "Temos uma grande proporção de clientes internacionais que apreciam o nosso ADN tipicamente francês. As nossas 220 marcas são seleccionadas segundo um espírito de mix and match bastante luxuoso. Nós privilegiamos a exclusividade, as colecções cápsula, as colaborações realizadas ao longo do ano porque as nossas clientes adoram ser surpreendidas e preferem peças de séries limitadas que marquem a diferença. É isso que agrada às francesas, evidentemente, mas também a mulheres de outras nacionalidades. Vamos inaugurar um serviço de entregas na China, em outubro, porque há imensa procura."

Compras online
A cliente chinesa, que tem recursos para fazer aquilo que lhe agrada e que faz compras em todo o mundo sem sair do lugar, também foi uma lufada de ar fresco no setor. "A explosão de consumidores dos países emergentes criou uma verdadeira rutura de idades", especifica Franck Delpal. "Quase menos 20 anos de idade, em média!" Os valores falam por si: na Europa, 55% dos consumidores de produtos de luxo têm, atualmente, mais de 40 anos. Na China, 65% têm menos de 40 anos (Fonte: Bain & Company, 2017). "Até 2025, 45% das despesas associadas ao luxo provirão da geração Y-Z", sublinha Joëlle de Montgolfier, diretora sénior do centro de estudos e investigação Bain & Company. Isso implica, evidentemente, novas práticas. "As francesas, muito conhecedoras da Moda, são também muito digitais… mas bem menos do que as chinesas!", diz Delphine Vitry, com um tom divertido. No império da Moda, a experiência online é fundamental – um fenómeno que vai seguramente espalhar-se muito depressa em França e noutros países. Não é por acaso que a 24 Sèvres cuida de todos os pequenos pormenores das encomendas que expede para todo o mundo: caixas identificadas com o nome da pessoa que encomendou, com um bonito papel de seda dobrado com cuidado e uma surpresa no interior…
Este rejuvenescimento significativo em função do meio de aquisição é igualmente visível na evolução da cliente do Bon Marché, a grande loja topo de gama da margem esquerda parisiense. "Há pouco mais de cinco anos, a nossa cliente francesa tinha entre 58 e 60 anos. Atualmente, ela tem precisamente 42 anos", explica Catherine Newey, diretora comercial da empresa. Neste templo do requinte, 60% das visitantes são francesas, muitas das quais parisienses, mas as asiáticas ocupam o segundo lugar do pódio. "São, sobretudo, mulheres na casa dos 30 anos e frequentemente ganharam as suas fortunas na área das novas tecnologias", acrescenta Catherine Newey. Elas conhecem muito bem as marcas e entram na nossa loja pela descoberta e pela experiência. No entanto, aquilo que lhes agrada particularmente é precisamente o facto de a nossa clientela ser maioritariamente local."

O toque francês
Eh oui! As chinesas estão a avançar em matéria de milhões e de digitalização, mas ainda seguem os passos da icónica parisiense. E, tal como esta, desejam afastar-se do aspeto estatutário do luxo. "Todas as grandes Casas sonham em ter clientelas locais", afirma Stéphanie Laurent, diretora da loja parisiense de artigos em pele Moynat. "Estas clientes podem fazer um volume de compras inferior ao da maioria das turistas estrangeiras, mas é possível que visitem a loja com mais frequência e, sobretudo, transmitem uma elegância francesa que continua a ser ‘a’ referência." Será o toque francês o melhor embaixador do setor? "Tal como a francesa, a cliente asiática encaixa, cada vez menos, no postulado tradicional. Hoje em dia, ela é seduzida por um artigo de luxo inovador, com design e que reflita um espírito criativo", constata Joëlle de Montgolfier. Na Bon Marché, estas iniciadas estão igualmente em busca de uma oferta diferenciadora. As grandes marcas são, sem dúvida, incontornáveis, mas devem agora surpreender e desenvolver um discurso original.
Estes pontos de vista disruptivos seduziram igualmente as mais jovens, essa corte volátil que o mundo da moda tenta incessantemente atrair para as suas fileiras. Estas nativas digitais conversam bastante nas redes sociais e não hesitam em comprar online os produtos de que falam. "80% das nossas consumidoras são millennials ou Gen Z, sediadas principalmente na América do Norte e na Ásia", confirma Brigitte Chartrand, diretora de aquisições de moda feminina da Ssense, a elegante plataforma canadiana que propõe uma mistura de luxo, de streetwear e de marcas avant-garde. "Elas seguem as tendências desde tenra idade, mas apropriam-se delas com uma interpretação muito pessoal. Chegam, por exemplo, a pegar em peças que não são consideradas de luxo e que nem estão na moda e dão-lhes um toque de moda incrível. Apreciam o inesperado, a novidade e o sentido de humor e são, tipicamente, atraídas pelas assinaturas fortes de marcas emergentes como a Off-White, Marine Serre ou Gosha Rubchinskiy. Entre as marcas mais estabelecidas, preferem Prada, Maison Margiela e Burberry, mas sobretudo Balenciaga e Gucci." Duas Casas que, aproveitando o entusiasmo dos jovens asiáticos pelo luxo, souberam habilmente reposicionar-se para corresponder às expectativas. "Os consumidores na casa dos 30 anos representam habitualmente 30% da clientela de uma marca de luxo. Na Gucci passámos a 50% e na Balenciaga a 65%", afirmou François-Henri Pinault, CEO do Grupo Kering, ao jornal Le Monde, no passado mês de fevereiro. Uma cura de rejuvenescimento espetacular e inesperada, invejada pelas marcas de pronto-a-vestir de todo o mundo.

Os números do luxo
. O mercado dos bens pessoais de luxo atingiu, em 2017, o valor recorde de 262 milhões de euros.
. O número de clientes do luxo, a nível global, está estimado em 415 milhões. Serão entre 440 e 450 milhões, em 2025.

. Em 2017, os asiáticos representavam 51% da clientela (11% de japoneses e 32% de chineses), os americanos 23% e os europeus 19%.
. Na China, 65% dos clientes do luxo têm menos de 40 anos. Na Europa, 55% têm mais de 40 anos. . Em 2017, 30% das despesas associadas ao luxo provieram da geração Y-Z. Serão 45% em 2025.
. Sabe-se que 10% das compras de artigos de luxo fazem-se online, mas 42% preparam-se online e finalizam-se numa loja.

Jacquemus, o querido das novas fãs do luxo
Algumas lojas só querem as criações dele. E por uma boa razão: Simon Porte Jacquemus, de 28 anos, é o queridinho do momento. Sobretudo das francesas que adoram a sua moda luxuosa, mas ligeira, sensual e luminosa, e que apreciam a faceta acessível e charmosa deste belo rapaz sorridente. "As minhas clientes adoram Jacquemus", diz Carole Benazet, fundadora da concept store Département Féminin, em Toulouse. "Ele conseguiu inseri-las no seu universo publicando na sua conta de Instagram fotografias de raparigas bonitas na praia, mas também adoráveis fotografias suas com a avó assistindo ao Campeonato Mundial de Futebol. Ele criou uma moda espontânea e alegre, menos distante do que a dos seus predecessores e é isso que agrada às raparigas desta geração. É divertido ver que, agora, todas se querem casar com um vestido de Jacquemus!".
Exclusivo: Madame Figaro | Tradução: Erica Cunha e Alves

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