"A masturbação feminina contraria a crença de que as mulheres são menos sexuais, que o seu prazer deve depender de um parceiro"
Em entrevista à Máxima, a sexóloga Melanie Eichhor explica que, em muitas culturas, "não é o ato em si que é problemático, mas a independência e a autodeterminação que ele representa".
Masturbação feminina desafia crenças sociais e promove autonomia, prazer e autoconhecimento
Foto: unsplash18 de junho de 2025 às 12:22 Maria Salgueiro
Há diferenças geracionais quando o tema é o prazer sexual feminino — "as gerações mais jovens, especialmente a Geração Z, tendem a ser muito mais abertas em relação à sexualidade, incluindo a masturbação", explica à Máxima a sexóloga Melanie Eichhorn. Mas uma coisa mantém-se: o ato continua a ser tabu para muitas mulheres, especialmente nas culturas onde a independência feminia é vista como uma ameaça ao status quo. A mudança vem chegando, sim, mas a passos lentos.
Com vasta experiência — e apaixonada pela profissão —, Melanie Eichhorn formou-se em Psicologia e Sexologia e trabalha atualmente na Satisfyer, possivelmente a marca mais famosa entre o público feminino quando o tema é a exploração do prazer sexual íntimo. É por lá que contribui para a sua missão, focada na educação sexual, defendendo o direito de cada pessoa de explorar a sua sexualidade livre de preconceitos e vergonha, incentivando a criatividade.
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Entre os
homens, a masturbação parece ser um tema natural. Ouvem-se inclusivamente histórias sobre
rapazes que se masturbam ao pé dos amigos durante a adolescência. Porque é que
entre as mulheres a realidade é tão diferente?
Durante
muito tempo, a sexualidade feminina foi estigmatizada e era invisível para a
sociedade. As mulheres eram vistas como seres passivos em relação ao desejo,
quando, na verdade, deviam ser reconhecidas como pessoas individuais com as
suas próprias vontades sexuais. Essa ideia ultrapassada ainda faz com que seja
difícil imaginar que as mulheres se masturbem ou que possam realmente desfrutar
do sexo.
No
entanto, a realidade é bem diferente. O desejo não tem género. As mulheres
podem ter uma libido tão forte como os homens e a masturbação é uma forma
completamente natural e saudável de explorar isso. O que realmente faz a
diferença não é a biologia, mas sim como a sociedade encara o tema: os rapazes
são muitas vezes incentivados – ou pelo menos é aceite – a explorarem os seus
corpos, enquanto as raparigas são frequentemente silenciadas ou levadas a
sentir vergonha disso.
A
masturbação feminina continua a ser tema tabu? Porquê?
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Infelizmente,
sim, apesar de isso estar a mudar gradualmente. A masturbação feminina desafia
normas sociais profundamente enraizadas sobre género, sexualidade e prazer.
Contraria a crença ultrapassada de que as mulheres são menos sexuais ou que o
seu prazer deve depender de um parceiro. Por isso, continua a ser um tabu em
muitas culturas: não é o ato em si que é problemático, mas a independência e a
autodeterminação que ele representa.
Os homens
masturbam-se mais do que as mulheres?
Esta é
uma pergunta difícil e a resposta não é tão simples como parece. Grande parte
do que sabemos sobre os hábitos de masturbação vem de pesquisas em que as
pessoas relatam os seus próprios comportamentos e essas respostas podem ser
influenciadas pelas expectativas sociais. Isto é, os homens podem exagerar nas
respostas porque acham que se espera que se masturbem com frequência. Já as
mulheres, por vergonha ou medo de julgamento, podem dizer que o fazem menos do
que realmente fazem.
Na
verdade, fatores como o stress, a saúde em geral, a forma como cada um vê a sua
sexualidade e o desejo desempenham um papel mais importante do que o género na
frequência com que alguém se masturba. Por isso, em vez de perguntar “quem o
faz mais”, deveríamos perguntar: como podemos fazer com que todos se sintam
igualmente confortáveis a explorar a sua sexualidade?
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Em entrevista, Melanie Eichhor aborda a masturbação feminina e quebra de tabus
Foto: DR
O que
dizem dados atuais sobre os hábitos de masturbação das mulheres?
Os
hábitos de masturbação das mulheres são muito mais diversificados e criativos
do que muitas pessoas imaginam e, ao contrário do que se vê frequentemente, a
penetração é raramente o foco.
O
clitóris é a principal fonte de prazer sexual para a maioria das mulheres. É
por isso que muitas preferem a estimulação externa do clitóris, seja com as
mãos ou com brinquedos sexuais. Curiosamente, muitas mulheres também relatam
esfregar-se em almofadas, cobertores ou outras superfícies macias para atingir
o orgasmo, especialmente quando estão sozinhas. Este ato, apesar de ser comum,
é frequentemente associado à vergonha, porque desafia as visões tradicionais (e
limitadas) de como a sexualidade feminina “deveria” ser. Mas a verdade é que
não existe uma forma “certa” de sentir prazer.
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Em que
idades este hábito é mais prevalente nas mulheres?
A
masturbação pode começar numa idade muito jovem, normalmente até mesmo antes de
as crianças saberem descrever o que estão a sentir. Na infância, este
comportamento não é sexual como nos adultos, mas sim uma forma natural de
exploração do corpo. É algo reconfortante, instintivo e não tem um objetivo
específico.
O que
tipicamente pensamos ser masturbação (explorar o corpo para obtermos prazer
sexual) geralmente começa na puberdade. É nesta fase que ocorrem as mudanças
hormonais, a curiosidade sobre a sexualidade aumenta e as pessoas começam a
experimentar. Para muitas mulheres jovens, este processo ainda é muito
influenciado pela vergonha ou pelo medo de serem “apanhadas”.
Muitas
vezes, só na adolescência ou início da vida adulta é que as mulheres conseguem
abraçar plenamente a sua sexualidade, desaprender tabus e desfrutar da
masturbação como uma prática saudável.
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Há
diferenças geracionais?
Com
certeza. As gerações mais jovens, especialmente a Geração Z, tendem a ser muito
mais abertas em relação à sexualidade, incluindo a masturbação. Para muitos
deles, é completamente normal falar sobre o prazer a solo, experimentar
brinquedos sexuais e até mesmo masturbar-se com um parceiro.
Isso não
significa que as gerações mais velhas não se masturbem, é claro que o fazem,
mas em muitas situações, essas pessoas cresceram em ambientes onde esses temas
eram tabus. Como resultado, podem ainda praticar estes atos sozinhos e em
privado e raramente falam sobre isso, mesmo com os seus parceiros. Felizmente,
isso está a mudar, à medida que cada vez mais pessoas, independentemente da
idade, usufruem do seu direito de sentir prazer sem terem nenhuma vergonha.
Que
importância tem a masturbação feminina na compreensão do próprio corpo?
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A
masturbação pode ter um papel fundamental na consciência corporal e no
autoconhecimento. Através do toque, as mulheres podem aprender o que lhes dá
prazer, como a excitação se vai desenvolvendo e quais as zonas do corpo que são
mais sensíveis à estimulação.
Além
disso, a masturbação também ajuda as mulheres a perceberem como a sua libido
muda ao longo do ciclo menstrual ou em diferentes fases da vida. Pode até
contribuir para uma maior consciência genital, o que é essencial para detetar
precocemente problemas de saúde, como alterações na pele ou saliências fora do
normal.
Resumidamente,
a masturbação não é apenas sobre prazer, é também uma parte importante do
processo de conhecer e cuidar do próprio corpo.
Qual
diria que é o principal benefício da masturbação feminina?
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A
masturbação feminina é uma expressão de autonomia e amor-próprio. Permite às
mulheres conectarem-se com o seu corpo, explorarem os seus desejos e afirmarem
a sua sexualidade sem depender de mais ninguém. Os benefícios vão muito além do
prazer físico: ajuda a reduzir o stress, melhora o humor, facilita o sono,
aumenta a confiança e pode até aliviar as dores menstruais. Além disso, a
masturbação é também uma maneira poderosa de normalizar a ideia de que a
sexualidade pertence à mulher.
De que
formas a masturbação feminina pode melhorar relações românticas com os
parceiros?
Um dos
maiores benefícios é que retira pressão do parceiro. Quando cada pessoa sabe
como satisfazer as suas próprias necessidades sexuais, o sexo deixa de ser uma
obrigação ou expectativa e passa a ser algo partilhado e prazeroso.
A
masturbação também promove uma melhor comunicação: ao conhecer melhor o próprio
corpo e perceber o que proporciona prazer, torna-se mais fácil expressar esses
desejos ao parceiro, contribuindo para experiências sexuais mais satisfatórias
e baseadas no respeito mútuo.
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Além
disso, partilhar fantasias ou práticas de masturbação pode, na verdade,
aproximar o casal, desde que haja abertura e consentimento de ambas as partes
É verdade que a masturbação ajuda a
dormir melhor?
Sim! Os
orgasmos estimulam naturalmente a libertação de hormonas associadas ao
bem-estar, como a oxitocina e a prolactina. Estas substâncias ajudam a relaxar
o corpo, reduzem o stress e promovem uma sensação de tranquilidade. Tudo isso
são fatores que podem ajudar a dormir melhor.
Também se diz que é um analgésico que
pode ajudar a aliviar dores? Porquê?
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Sem
dúvida. Durante a excitação e o momento do orgasmo, o corpo liberta endorfinas,
analgésicos naturais produzidos pelo próprio organismo. Estas substâncias podem
ajudar a aliviar dores de cabeça, cólicas menstruais e até desconfortos ou
tensões generalizadas.
Alguns
estudos sugerem que os efeitos não são apenas imediatos, mas podem ter
benefícios ao longo do tempo quando a masturbação é integrada numa rotina
regular de autocuidado.
Que benefícios pode ter para a saúde
mental?
A
masturbação pode ser uma ferramenta poderosa para o bem-estar mental, uma vez
que aumenta a autoconfiança, promove o relaxamento e ajuda a desenvolver uma
relação mais positiva com o próprio corpo.
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Pode
também reduzir sentimentos de vergonha, sobretudo para as mulheres que
cresceram em ambientes cuja visão da sexualidade era negativa. Explorar o
próprio corpo, nos seus próprios termos, é um ato de afirmação pessoal e,
muitas vezes, de cura. Em períodos de maior stress, pode também ser uma forma
rápida e segura de regular as emoções e recuperar o equilíbrio.
Como reagem os homens à masturbação
feminina?
As
reações variam bastante. Alguns homens sentem-se ameaçados, pois veem a
masturbação feminina como concorrência. Outros tendem a hipersexualizá-la,
olhando para ela apenas através da lente da fantasia masculina.
A verdade
é que a masturbação feminina não é uma ameaça nem um espetáculo. Não substitui
a intimidade com um parceiro, nem é feita para excitar outra pessoa. É uma
expressão profundamente pessoal e natural de prazer próprio e merece ser
respeitada como tal.
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Há formas certas e erradas de o fazer?
Não há
uma “forma errada” de se masturbar, desde que o que se faz proporcione prazer e
não cause qualquer dano físico. Alguns métodos são mais falados ou socialmente
aceites, mas isso não os torna “melhores”.
O mais
importante é que faça sentido para o corpo de cada pessoa. Seja através de
estimulação externa, penetração ou até toques sensuais em zonas não genitais. O
prazer é algo pessoal e cada um define-o à sua maneira.
Que dica daria a alguém que quer começar
a explorar o próprio corpo desta forma mas que pode sentir vergonha ou pudor?
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Começa
por criar um ambiente seguro e privado, onde não serás interrompida ou ouvida,
pois o facto de sentires-te segura irá ajudar a tua mente a relaxar. Podes
também fazer algo que te conecte com o teu corpo como, por exemplo: tomar um
banho quente, utilizar óleo corporal ou dançar ao som da tua música favorita.
Depois,
começa por tocar no teu corpo, nomeadamente nos braços, peito ou parte interna
das coxas, com delicadeza e curiosidade. Se sentires vergonha ou desconforto,
não te julgues. Lembra-te que cresceste numa sociedade que muitas vezes
silencia ou constrange o prazer feminino. Sê gentil contigo e explora mais se
realmente quiseres e não porque é uma “obrigação”.
Se ajudar, podes fazer uma lista de práticas que
te despertam curiosidade – desde as menos intimidantes (como acariciar os
seios) até às mais intensas (como brincadeiras anais ou estimulação interna).
Avança lentamente e vê como te sentes ao longo do processo. Esta é a tua
jornada, desfruta dela nos teus próprios termos.
O erro que todos cometemos antes de um despertar madrugador tem um motivo. A resposta pode estar num hábito que parece lógico – mas que está a arruinar o nosso sono.
A dispareunia, ou dor durante o sexo ou contactos íntimos, atinge as mulheres em qualquer idade. Numa fase mais tardia da vida, pode estar relacionado com a menopausa, mas há inúmeras mulheres com 20 anos e menos que se queixam deste problema.
A corrida conquistou as ruas, os parques e as redes sociais. Mas será que quem nunca correu pode começar a fazê-lo aos 40, ou mesmo depois? Conversámos com um especialista para percebermos se correr pode ser exatamente aquilo de que o seu corpo (e mente) precisam nesta fase da vida.