Os diálogos de amor que importam em ‘O Amor é’
Inês Meneses, radialista de profissão e comunicadora de coração, e Júlio Machado Vaz, médico psiquiatra, são a dupla perfeita para falar do amor. Depois de o “pregarem” aos seus ouvintes, oferecem-no agora em forma de livro.

Lançado há uma semana, o livro O Amor É, de Júlio Machado Vaz e Inês Meneses, é a materialização de uma série de conversas de rádio inseridas no programa com o mesmo nome, no ar há 15 anos, na Antena 1. São diálogos que nada têm de lamechas e que em tudo fazem palpitar corações ouvintes. São episódios radiofónicos passados para o papel que recordam os temas que interessam e apaixonam os leitores, desde os amores adolescentes à nostalgia do romance, à obsessão pela infância e pela morte, à monogamia, às relações na era da Internet. Sem tabus. Com liberdade. Conversámos com os autores, em simultâneo.

Como nasceu a ideia deste programa, que é um sucesso há 15 anos na Antena 1?
Inês: Eu só cheguei há 10 (quase 11). Foi como se tivesse espreitado pela fechadura e percebido que queria estar ali.
Júlio: A ideia foi do Rui Pêgo, do Luís Marinho e do António Macedo, que me vieram desencaminhar ao Porto para fazer o programa. Levaram-me a um ótimo restaurante, pagaram-me o almoço e eu não tive coragem de recusar.

A Inês e o Júlio são uma espécie de mensageiros do amor, no programa, mas não o tornam nem lamechas nem inócuo, tornam-no pertinente e urgente. Como é que se consegue esse equilíbrio feliz?
Inês: Acho que nos complementamos e equilibramos sem pensar muito nisso. Talvez eu mais otimista, talvez o Júlio mais sensato. Temos vindo a apurar a fórmula sem ser premeditado (será que o amor o pode ser?).
Júlio: Não sei. Claro que tentamos! Na escolha dos temas, nas associações livres que permitem, no sublinhar do que nos parece mais importante, numa palavra, serviço público. Mas penso que o "condimento" fundamental é a cumplicidade que nos une e permite que seja percetível para os ouvintes o prazer com que fazemos o programa.

Ao longo dos anos, o programa tem sempre educado para o amor, quebrando tabus e trazendo à tona temas que tocam a todos. Será isso que leva as pessoas a escutar sobre o amor tão atentamente?
Inês: Acho sobretudo que as pessoas querem ouvir a espontaneidade. Querem perceber o que o Júlio pensa (e eu pergunto) porque criaram uma relação familiar e de intimidade connosco e sabem ao que vêm: terão sempre a nossa sinceridade. "We Are Family."
Júlio: Quinze anos são uma eternidade nos media. Além de se interessarem pelos temas ? por uns mais do que outros... ?, penso que as pessoas fazem deles trampolim para as suas próprias reflexões e conversas. Por outro lado, creio que muitas delas já nos consideram "gente lá de casa", como diria Bénard da Costa.

O amor e a música são duas esferas indissociáveis? Andam sempre lado a lado?
Inês: Sim, o amor é uma canção. A paixão, um refrão que se repete e nos eleva.
Júlio: Para mim, sem dúvida. Surpreender-me-ia que a Inês não dissesse o mesmo. Mas de modo algum se pode generalizar, para outros não será assim. Contudo, a música, com o seu estatuto de linguagem universal e capacidade de convocar a paleta dos afetos, está numa posição privilegiada, como a poesia. Basta ver como é frequente que determinadas músicas tenham um significado simbólico para ambos os protagonistas de uma relação.

Há algum dos programas que tenha ficado a pairar no pensamento de cada um de vós, ao longo dos anos? Se sim, qual?
Inês: São demasiados, mas todos aqueles em que o Júlio me leva (quase de mão dada) a percorrer o seu álbum de família e de memórias ficam guardados.
Júlio: Para mim, especial é sempre o próximo. Escolhido o tema, e com 45 minutos para saborear, continua a ser muito bom olhar a estante e decidir que autor citar, que poema dizer, por que caminhos me perder. Apenas para depois verificar ? às vezes... ? que o diálogo nos levou para os antípodas do que planeara. Pouco importa: cada fim de semana há um Magical Mistery Tour à minha espera. Infelizmente sem os Beatles...
Como surgiu a ideia de transformar O Amor É… em livro?
Inês: Culpa do Rui Couceiro (o editor). O Júlio resistiu e eu fui ao Porto com prazer.
Júlio: A ideia foi do Rui Couceiro, há alguns anos. Eu torci o nariz, nenhum livro faz justiça à gargalhada da Inês ou às minhas hesitações, tive medo que o O Amor é... "não estivesse lá". Mas o maroto é teimoso e eu estou a ficar velho... Por fim, o entusiasmo dele contagiou-me e decidi correr o risco. Agora não há regresso.
Por fim… é urgente, o amor?
Inês: Sempre. Socorro-me de um momento marcante do filme A Árvore da Vida, de Terrence Malick: "Se não amares, a vida passa num instante."
Júlio: O meu querido Eugénio [de Andrade] escreveu que sim. Mas também acrescentou que era urgente permanecer. Nunca partilhei o otimismo dos hippies dos anos 60, mas vejo com dificuldade mantermo-nos humanos sem amar, no sentido mais lato do termo. Sim, o amor é possível e urgente.
