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Dependência de Xanax. "Neste momento assumo-me viciada em comprimidos para dormir"

Carla Barão, de 29 anos, reflete sobre como ficou dependente de comprimidos para conseguir descansar, há oito anos, e assume que não tenciona procurar uma solução alternativa. Um testemunho real e honesto, para ler à luz da noção de que a doença do século é a ansiedade.

Foto: Anna Shvets / Pexels
07 de setembro de 2022 Rita Silva Avelar

A ansiedade revela-se de muitas formas. Uma delas é através da incapacidade de descansar. A somar a isso, estamos perante uma geração com severas dificuldades em adormecer, e com dependência maior de comprimidos para o fazer, garantem os psiquiatras e os números de vendas destes fármacos. Carla Barão, 29 anos, conta que tudo começou apenas com uma insónia. "Comecei a tomar comprimidos no momento em que comecei a deixar de conseguir dormir. De um momento para o outro deixei de conseguir dormir. Tinha Xanax [o fármaco Alprazolam] em casa e pensei: vou tomar. E na verdade tomei um, não fez absolutamente nada, passei para dois, não aconteceu nada, ao terceiro apaguei e não me lembro de nada do que se passou, mas percebi que fazia efeito. Faz 8 anos que isso aconteceu. Percebi que tinha energia para dar e vender, e que não podia fazer aquilo. Porque é que o fiz? Apenas porque não conseguia dormir", começa por contar.

Sobre os efeitos, recorda que a única sensação foi a de sono. "Não me deu paz, não me deu tranquilidade, não me deu calma, era como se tivesse dopada, com sono, e na verdade só tomei por essa razão. Não tomei para me sentir calma, há oito anos, hoje em dia tomo porque também tenho a agravante da ansiedade."

O tempo passou, e mais tarde voltou a recorrer aos comprimidos, confirma, até perceber que as insónias eram cada vez mais frequentes sempre que não os tomava. "Percebi que estava dependente dos comprimidos passados três anos. Hoje em dia sou realista e afirmo que não consigo dormir sem os tomar. As quantidades que tomo, hoje, são exageradas, eu sei que sim. Não tenho vergonha de os dizer que os tomo, e vou continuar a tomar, não vou prescindir deles. Neste momento, assumo-me viciada em comprimidos para dormir, não vou negar, nem mentir", refere.

O aumento da carga diária deu-se, "como expliquei, porque um comprimido não fez efeito. Três deixaram de fazer efeito e precisei de tomar mais. Neste momento tomo 4 a 5 comprimidos para dormir, e durmo as minhas sete e oito horas diárias. Não me sinto drogada nem maluca por tomar comprimidos. Simplesmente, durmo as minhas horas. Acordo, trabalho e não me faz efeito durante o dia", conta.

Carla não sentiu efeitos negativos, mas continua ser uma pessoa ansiosa. "Estes comprimidos não me tiram a ansiedade, quem me dera, nunca aconteceu. Perda de memória já aconteceu após a toma. Quem disser que comprimidos anulam a sensação de ansiedade, não está a dizer a verdade."

Sobre se pensa em procurar soluções naturais ou terapia, confessa que se afeiçou à ideia de descansar profundamente com recurso a fármacos. "Nunca encontrei nenhuma estratégia para controlar essa dependência. Primeiro por que não quis, depois porque sinto bem-estar. Quem ler isto pode achar ridículo, mas é verdade. Tenho momentos de paz que preciso de manter. Eu tenho muita energia e penso demasiado, por isso continuo a achar que preciso de tomar os meus comprimidos para dormir, que precisam de receita médica. Um dia mais tarde, quem sabe."

*O Alprazolam não é um medicamento para dormir. Trata-se de uma benzodiazepina que estimula a ação do ácido gama-aminobutírico, reduzindo a ansiedade moderada e ansiedade associada a depressão. Se sentir ansiedade ou distúrbios de sono deve consultar um psiquiatra ou um especialista em sono.

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