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Dating em Lisboa. “O pior não seria terminar com o sobrinho, mas sim com a tia”

Foto: IMDB / Save the Date
12 de junho de 2024 às 12:42 Maria Pestana

"A tia disse-me que eras um bom partido, fiquei curioso". Demorou, mas o sobrinho Pedro acabou por dar sinal de vida. Depois de me juntar a um Clube de Leitura, e de conhecer umas senhoras mais velhas, restou a promessa de um encontro com o sobrinho, recém solteiro e bom rapaz. O facto de ter terminado uma relação recentemente não me demoveu. Quantas vezes negamos saídas com homens cujas relações terminaram, considerando que precisam de fazer o luto (tradução: enxugar as lágrimas numa série de peitos alheios), só para os vermos embarcar noutras com a mesma facilidade?  

"Bom partido" deu-me uma ligeira vontade de rir, não sei se me definiria como bom partido. Há quem goste de me adjetivar de "desempoeirada" ou "pespineta", o meu pai considera somente que sou "mal-educada". "Define bom partido", respondi. "A tia disse que haveria de gostar de ti porque a fazias recordar-se de si mesma quando era mais nova. E como a tia é aquela pessoa que irrita os adultos nos almoços de família com as suas ideias tresloucadas, mas que eu adoro, achei que poderia ter razão". Cá está a definição de mim própria que faltava: a tresloucada da família, a ovelha tresmalhada, a tia que caminha para solteirona ou que daqui a 20 anos será, provavelmente, divorciada, caminhando para o terceiro casamento com um tipo vários anos mais novo, ou que quer que seja que incomode muita gente, mas que deleita os sobrinhos e os introduz a temas relevantes.  

Ainda há dias, o meu sobrinho se interrogava de o porquê da sua pilinha estar constantemente a crescer de forma desconfortável e eu lhe explicara que era perfeitamente natural e que haveria de acontecer muitas vezes. "Não te apoquentes, pensa noutra coisa que isso passa ou, então, sei lá, faz o que te apetecer com ela". Saída da casa de banho, fechei a porta, e esbocei um sorriso, orgulhosa da minha intervenção pela defesa da exploração sexual saudável do pequenote que se tornava homem. O meu irmão perguntou o que se tinha passado. "Acabei de explicar ao teu filho o que era uma ereção", retorqui. "Oh, graças a Deus! Eu não saberia o que dizer".   

O sobrinho Pedro foi cortês. Quis levar-me ao Gambrinus e eu fiquei feliz por não nos sentarmos ao balcão - queria dizer que não saia com mais ninguém, não tinha razão para se livrar de mim caso fosse oportuno. Pedi o que me apeteceu. Tinha uns míseros 50 euros na conta até ao final do mês, mas com o decorrer do jantar fui percebendo que não tinha com que me preocupar. O Pedro era meio gabarolas. Não iria pedir-me para dividir a conta. Além do mais, o que seria eu sair do date e ir contar à tia que o Pedrinho me tinha feito dividir a conta. Bem-falante, discorreu muito sobre a tia, a sua influência, mas irritou-me um pouco o facto de que falava sem parar. Mal deixava espaço para que eu respondesse. Às tantas, elogiou-me os olhos. Supus que estivesse apenas nervoso.  

No segundo date, levou-me a almoçar ao Café de S. Bento, uma vez que comentei que nunca tivera provado o famoso bife. Continuou a falar pelos cotovelos, elogiou-me a escolha de indumentária e piscou várias vezes o olho aos empregados. E assim fomos saindo, conversando, trocando mensagens, num ritual de início de qualquer coisa que ainda não é bem uma relação, mas que poderá vir a ser, em que ambos tendem a mostrar o melhor de si, mas o sobrinho Pedro parecia querer mostrar-me apenas restaurantes de classe média-alta que resultavam como experiência, mas que impunham uma certa postura que me aborrecia. Para quem queria conhecer a cópia jovem da tia tresloucada, as saídas eram demasiado planeadas e ligeiramente exibicionistas. Eu fui alinhando, vestindo as minhas melhores roupas, maquilhando-me, comportando-me, usando os talhares de dentro para fora, colocando o guardanapo ao colo, rindo elegantemente das suas piadas. No fundo, e sem saber bem como, fui entrando no papel, mas com o decorrer do tempo foi-se tornando claro que não existe qualquer química entre nós. Não partilhávamos interesses além dos gastronómicos e eu não sou de me apaixonar pelo estômago. Numa noite, o sobrinho Pedro deixou-me em casa. Tínhamos bebido um Pinot Noir caríssimo, preparava-se para o ritual de despedida com um beijinho ao de leve nos lábios. "Não queres subir?", perguntei. "Quero, mas devo admitir, tenho pouca experiência e sou pouco dotado". Não sei se foi do álcool ou do cansaço, mas entendi que me dizia que era pouco dotado de experiência e achei que estava tudo bem. Subimos.  

Servi-me de um Martini e perguntei se queria. Não era adepto, dei-lhe uma cerveja – na minha casa não há Pinots. Sentados no sofá, cada um com a sua bebida nas mãos, o constrangimento aumentou. Pousei o copo, olhei-o nos olhos. Puxou-me para si e beijou-me com vontade, mas alguma falta de perícia. A elegância de quem pousa o guardanapo ao colo, faltou na hora de me pousar a mim. Deixei que me colocasse as mãos na cintura e guiasse em movimentos suaves até si, enquanto lhe despenteava o cabelo. A dança durou alguns minutos, até que, depois de estremecer, me disse que precisava de ir ao quarto de banho. "Dás-me licença?". Dei. Estranhei, pois nem senti que estivesse excitado. Por experiência própria, antevi um problema. Mais uma vez, o destino aprontava, não havendo jeito de me dar um homem sem uma peripécia. Voltámos a sair no dia seguinte, e no dia seguinte, o sobrinho Pedro chegou até à minha cama e eu pude perceber, de facto, qual era a problemática.  

O sobrinho Pedro tinha um micro pénis e a sua falta de experiência fazia com que sofresse de ejaculação precoce, uma vez que não conseguia controlar o excitamento. A sexualidade não se resume à penetração, qualquer homem que se desenrasque com a língua sabe disso. Mas caramba, o que fazer com um micro pénis quando se gosta tanto da sensação de um pénis a entrar suavemente na vulva, quando se gosta tanto de saborear uma glande rosada, de sentir que se toma o controlo de um homem com um movimento tão simples da ponta da língua sobre o seu órgão? Fiz o melhor que consegui, mas o sobrinho Pedro nem o curso de pornografia para lésbicas tinha feito. Cunilingus não era algo que apreciasse, queria porque queria demonstrar a sua masculinidade através de um pénis que não podia suportar tal brasão. 

Cheguei a questionar-me como tivera ele feito em relações anteriores. Disse-me que sempre teve namoradas que quiseram manter-se virgens até ao casamento, exceto uma. Não me admirei, eu própria sentia que estava melhor apenas com os almoços e jantares em locais de alto gabarito, fosse a conversa minimamente interessante, mas não era. Urgia terminar com o sobrinho Pedro, ser honesta, dizer-lhe "meu amigo, gosto dos jantares finos, mas nem assim tanto e preciso de uma pila que me foda como deve ser; se é para estar com um homem preciso que me acrescente ou, neste caso, que me preencha e falar sobre menus não é preenchimento que chegue". Mas como fazê-lo sem levantar questões com a tia? Com o sobrinho eu podia bem, mas e a tia? O que dizer a uma tia que tratou do arranjinho, que entusiasmada me enviava mensagens a saber como tudo corria, e que se preparava para uma longa noite de conversa sobre os galanteios do sobrinho depois do próximo Clube de Leitura?  

Fomos jantar mais uma vez, mas cansada de ilusões sai do trabalho, bebi um copo com colegas e encontrei-me com ele já no local. O sobrinho Pedro procedeu como sempre, cumprimentando todos os empregados, pedindo os pratos mais caros, exibindo o relógio suíço, mas não me exibindo a mim. "Podias ter vestido outra coisa. Não tiveste tempo? Vens meio desarranjada hoje, querida, nem parece teu", comentou. Irritou-me o comentário passivo-agressivo, irritou-me que me tratasse como um acessório que senta à mesa. Não era pela minha real companhia que esperava, não me esperava para falarmos sobre os nossos dias, partilharmos uma conversa cúmplice, mas sim pela minha imagem enquanto símbolo de pujança, de conquista. Eram os meus olhos verdes com sombra dourada, os lábios tingidos de Chanel Rouge, as feições de atriz de cinema italiano que o encantavam. A ideia de que estaria a ser conivente com este tipo de atitude não me deixou permanecer. Agradeci o convite, levantei-me e fui-me embora. Não lhe dei qualquer explicação. Apenas cumprimentei os empregados e sai, deixando-o sozinho à mesa.  

Alguns dias depois tive Clube de Leitura. Cheguei cedo, como habitualmente. Contava encontrar-me com a sua tia. Chegou entusiasmada. "Conte-me tudo!", pediu. "Conto, mas depois de bebermos um copo", respondi. Insistiu. "Diga lá, o que foi? Não correu bem? Mas ainda saíram durante algumas semanas!". "O seu sobrinho tem um pénis minúsculo, mas comporta-se como se fosse um shower. Não consigo suportar um homem com uma pila pequena que se comporta como se fosse o maior galo da capoeira, desculpe! Não me odeie, mas é um exibicionista do pior!", respondi de um rasgo, quase sem fôlego."Oh, minha querida, não precisa de dizer mais nada. Pénis minúsculo? Como é que poderia imaginar? Nunca lhe troquei uma fralda sequer! Exibicionista, bom, de facto tomei-o por bem-dotado. Desculpe-me eu!", foi respondendo entre gargalhadas constrangidas. Eu limpei o suor imaginário da testa e ri-me também. De facto, a solidariedade feminina é o que nos resta e suporta, seja em que idade for.  Nunca mais falámos sobre arranjinhos e a nossa amizade perdurou.   

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