
A minha psicóloga disse-me uma vez que o homem que ousasse dar-me um ursinho de peluche no Dia dos Namorados seria um homem a aniquilar, porque embora consiga ser um doce de namorada, o meu mel é mais acre. Tenho o S. Valentim e as despedidas de solteira lado a lado na lista de antipatias pessoais. Caixas de chocolate em forma de coração e véus com falos são dois clichés que evito. Porém, tenho de confessar que, todos os anos, por esta altura, há algo dentro de mim que se remexe, que se inquieta. Não tenho orgulho em confessá-lo, mas invejo quem ignora o lado foleiro desta data em conjunto, enquanto eu o faço sozinha. Por isso, quando uma colega de trabalho me disse que conhecia uma pessoa, especialista em relacionamentos, que ia preparar um evento para solteiros revirei os olhos. Revirei tanto os olhos que o assunto deveria ter terminado ali, mas quando dei por mim respondia ao questionário enquanto ela me ditava as questões. "Se estivesses numa floresta sozinha, qual seria o animal que gostarias que te acompanhasse? E porquê?". Um cão, por razões óbvias. "Preferes viajar para fora ou no teu país?". Ambos. "Descreve a tua rotina". Casa, trabalho, cerveja, casa. Ida ocasional ao ginásio para manter o corpo em forma para os dates.
Respondi a cada uma das questões com algum sarcasmo e inteiramente desinteressada, mas depois de submetida a candidatura não consegui evitar não ficar expectante. Seriam escolhidos apenas 10 casais para um primeiro encontro às cegas e a minha competitividade fez soar alertas num cérebro traiçoeiro como o meu. Esperei e esperei, para duas semanas depois receber um e-mail a agradecer a minha participação, informando, no entanto, que não tinha sido possível fazer match do meu perfil com nenhum outro participante. "Vemo-nos numa outra ronda de encontros?". "O tanas é que vemos!". Liguei de imediato à minha colega. "Pois, ela disse-me. Havia outros candidatos que faziam mais sentido e sabes que os homens não alinham muito nestas coisas, então parece que não foi possível juntar-te com ninguém. Também isto não fazia muito o teu género e tu nem querias ir".

Tenho vários receios pessoais - alturas, espaços fechados, rejeição -, mas ser rejeitada por uma matchmaker foi uma novidade para mim. Nem sequer cheguei a ter o meu date. Fui excluída no processo de agrupamento de pessoas, com a desculpa de que existiam pares melhores, pares que faziam mais sentido. "Os seres que gostam de ursos de peluche e caixas de bombons em forma de coração", pensei. Senti-me rejeitada pelo tipo de pessoas que abomino. O nosso cérebro tem destas coisas matreiras, diz-nos que não queremos algo, mas quando não o podemos ter percebemos que o queríamos. Seja por que razão for. No meu caso, não suportava a ideia de ter sido excluída. A semente tinha sido plantada e agora não daria frutos. Tinha-me permitido criar algum tipo de expetativa, mesmo que não o tivesse confessado a ninguém. Amuei e avancei para o plano número dois, porque agora não conseguia simplesmente ignorar a data.
Marquei um jantar com vários amigos, por nenhuma razão em especial, exceto ser o dia que todos tínhamos disponível nas nossas agendas. Menti, não inteira, mas ligeiramente. Disse-lhes que cozinhava, porque seria impossível jantar fora. Quando chegou o dia, um estava com Gripe A, outra com gastroenterite, e o terceiro convidado estava disponível. Sem ter planeado, acabei por ter um date na noite de Dia dos Namorados, mas era com alguém que não queria de todo. Alguém que eu sabia que tinha uma crush por mim e ao qual eu nunca iria corresponder. Não existia química, interesses em comum, nem sequer o nosso sentido de humor tinha semelhanças. Acho sempre mau sinal quando faço mais piadas do que um homem. Sinto que não me cabe a mim ser a divertida, eu posso ser a bonita e a intelectual. Ele que seja o divertido e o inteligente ou, se me for permitido escolher, o divertido e o rico porque a vida está difícil e a sorte grande teima em não me bater à porta.
Fiz frango no forno, seguindo uma receita que encontrei na internet e que me esforcei demasiado para que corresse bem. Ele trouxe vinho, branco e tinto, na dúvida, veio preparado. Eu optei pelo branco, ele pelo tinto. Eu escolhi peito, ele escolheu perna. "Não fossemos amigos até dizia que éramos perfeitos um para o outro. Olha para isto, pelas pernas de frango nunca brigaríamos", e riu-se da própria piada. Eu achei um tanto ou quanto óbvia, mas anui. Meia garrafa depois achei-a mais bem metida. Da mesa de jantar passámos para o sofá. Eu continuei a beber. Ele também. Esgotado o tema de conversa, que também não era muito, ficou um silêncio confrangedor que interrompi afirmando que nos devíamos envolver. Convicta, disse-lhe: "Temos de fazê-lo. Jantámos sozinhos no Dia dos Namorados. Isto foi um sinal!". Ele pareceu um pouco desconfortável, mas avançou para me beijar. Foi um beijo estranho, meio adolescente, quando as bocas parecem ter dimensões distintas, as línguas não se encontram e algo navega à deriva naquele que deveria ser um momento de êxtase conjunto. Mas não, cada um rema para seu lado e no máximo somente os dentes se encontram. Terá sido, porventura, uma estranheza unilateral, uma falta de conexão que apenas eu senti, pois quando nos afastámos ele aparecia aturdido. "Não posso ter sexo contigo! Vou apaixonar-me e tu vais dar-me com os pés a seguir! És demasiado para mim e eu nem sequer sou bom, eu sei que sou mau na cama". As palavras saiam em catadupa, sem respirar, num desespero tal que me afastei. Pareciam demasiados argumentos para contrapor. E como pude apurar mais tarde, todos se revelariam verdade. Ele era realmente inapto na cama e eu dei-lhe, de facto, com os pés.

O mais curioso sobre mim é que não desisto. Abomino demonstrações exageradas de afeto em público, expressões de amor em forma de campanha de marketing, mas não resisto a uma boa história de amor. Não me comprem peluches, nem presentes dispendiosos. Não me ofereceram flores neste dia: antes em qualquer outro só porque passaram pelo mercado e os cravos estavam bonitos. Não procurem arrojar, mas usem palavras simples e escrevam-me cartas como Cyril Mowforth escreveu à esposa, Olga, durante a guerra: "Ainda temos um caminho difícil a percorrer neste mundo enlouquecido, mas não me interessa o quão longo e difícil o futuro possa ser, desde que estejamos juntos." Ou Machado de Assis escreveu a Carolina de Novais: "Tu pertences ao pequeno número de mulheres que ainda sabem amar, sentir, e pensar. Como te não amaria eu? Além disso tens para mim um dote que realça-os mais: sofreste. É minha ambição dizer à tua grande alma desanimada: «levanta-te, crê e ama: aqui está uma alma que te compreende e te ama também». E ter-me-ão.
