Rui Rocha: "A maternidade é um dos fatores que dispara a desigualdade salarial entre homens e mulheres nas empresas"

A Máxima perguntou aos oito líderes partidários 10 questões sobre direitos das mulheres, feminismo e igualdade. As respostas do líder da Iniciativa Liberal (IL).

Foto: DR
06 de março de 2024 às 12:18 Joana Moreira

Quando foi a primeira vez que percebeu que havia desigualdade entre homens e mulheres? Considera-se feminista? O que pensa da existência de um Dia Internacional da Mulher? A Máxima pediu aos candidatos que concorrem às eleições legislativas deste domingo que respondessem a um questionário sobre temas como a interrupção voluntária da gravidez, a eutanásia, ou a necessidade de um Ministério para a Igualdade.

Sem cronómetro ou a pressão do tempo, Inês Sousa-Real, Mariana Mortágua, Paulo Raimundo, Pedro Nuno Santos, Rui Rocha e Rui Tavares responderam, por escrito, às mesmas dez questões. Às portas das eleições legislativas, e em vésperas de celebrar o 8 de março, eis o que os líderes dos partidos com assento parlamentar têm a dizer — nas suas palavras.

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Todos os líderes de partidos com assento parlamentar foram convidados e todos aceitaram receber as perguntas da Máxima. André Ventura, do partido Chega, e Luís Montenegro, da Aliança Democrática, decidiram não responder.

Quando foi a primeira vez que percebeu que havia desigualdade entre homens e mulheres?

A maternidade é um dos factores que dispara a desigualdade salarial entre homens e mulheres nas empresas. Com a entrada no mercado de trabalho, apercebi-me não só dessas disparidades, mas também que o principal fator que explica as mesmas é o começo da maternidade.

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As mulheres continuam a receber menos do que os homens (menos 13,1%, segundo os dados mais recentes da Eurostat) e estão sub-representadas, na política e na economia, nos cargos de decisão e poder. Que proposta tem o partido para atenuar esta desigualdade?

A maternidade é um dos fatores que dispara a desigualdade salarial entre homens e mulheres nas empresas. Com a entrada no mercado de trabalho, apercebi-me não só dessas disparidades, mas também que o principal fator que explica as mesmas é o começo da maternidade. Deve apostar-se em políticas de apoio. A Iniciativa Liberal apoia a legislação existente em matéria de licenças de parentalidade igual para homens e mulheres, de modo a permitir aos casais conciliarem o início da vida familiar com o trabalho sem um ficar mais prejudicado no seu futuro profissional do que o outro. Acreditamos que com uma economia a crescer, será possível reforçar essa política de modo a alargar o período em que ambos os pais podem beneficiar da licença de parentalidade sem comprometer o seu futuro. A IL propõe a medida do cheque-creche de valor não inferior a €480 que permite aos casais a livre escolha entre creches sociais ou privadas de modo a encontrarem a solução mais adequada às suas circunstâncias familiares e profissionais. Propõe uma via verde de licenciamento de creches que permita aumentar a oferta de alternativas disponíveis aos pais e propõe alargar os direitos de parentalidade e acesso a creches a profissionais liberais e trabalhadores independentes, que atualmente não beneficiam deste tipo de políticas como os pais que trabalham por conta de outrem.

Em 2023 foram registados 30.323 crimes de violência doméstica, e 22 vítimas mortais (17 das quais mulheres), em Portugal. No ano passado, as autoridades receberam perto de três mil queixas relacionadas com o crime de violência no namoro. O que falta fazer?

É importante que as vítimas de violência doméstica tenham o acompanhamento correto a nível social e processual, tendo em conta a sua vulnerabilidade que não raras vezes resulta de quadros de dependência económica, emocional e pessoal. Importa garantir que, havendo Segurança Social e apoio judiciário, se atribui apenas um único mandatário para todos os processos em que a vítima esteja envolvida quando conexos com o crime de violência doméstica. Mas não basta uma resposta processual. Para uma resposta que se quer urgente e flexível tem de se envolver o poder local na rede de apoio à habitação para vítimas de violência doméstica, numa verdadeira articulação entre o poder local, o poder judicial e a sociedade civil nas suas associações de apoio à vítima. Se tal se revelar uma necessidade, entendemos que pode e deve existir um envolvimento do setor privado, além do social, na resposta a dar a estas vítimas. A nível penal importa continuar a lutar pela autonomização do crime de exposição de menores a situações de violência doméstica, rejeitada pela maioria absoluta do Partido Socialista, mas reconhecida por muitos como uma necessidade penal e social tendo em conta os impactos no desenvolvimento das crianças.

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O combate à violência doméstica começa pela prevenção da prática deste crime. A violência doméstica começa com problemas de saúde mental e de formas de automedicação através do consumo de substâncias, designadamente o álcool, que agravam o problema. No programa eleitoral às Eleições Legislativas de 10 de março, e que a Iniciativa Liberal quer implementar na próxima legislatura, existem várias propostas para combater a violência doméstica e proteger as suas vítimas, como revisitar a Lei da Saúde Mental, criando meios efetivos de acesso a cuidados de saúde mental, em especial nos Cuidados de Saúde Primários. Portugal é um dos países com maior incidência e prevalência de patologias do foro da saúde mental – em especial de perturbações emocionais como ansiedade e depressão – afetando mais de um em cada cinco portugueses e fazendo do nosso país o segundo maior consumidor de antidepressivos per capita da OCDE. Nas áreas da educação para a saúde, deverá ser promovido o desenvolvimento de programas de formação em áreas de atuação chave para a sinalização, referenciação e comunicação na área da Saúde Mental (comunicação social e jornalismo, recursos humanos e educação) com vista a capacitar profissionais de áreas que não a saúde a detetar precocemente sinais de alarme, assim como reforçar a formação básica em saúde mental no ensino escolar. Sempre que possível, deve ser apoiada a criação de programas de reintegração social e laboral de pessoas que recuperam de situações de dependência e do impacto que possam ter provocado nas suas vidas e nas de outros.

Na última legislatura, a Iniciativa Liberal fez aprovar na Assembleia da República, em dezembro de 2022, uma proposta que permite às vítimas de violência doméstica não serem obrigadas a confrontar-se desnecessariamente com os seus agressores no processo de divórcio. Uma das fases do divórcio sem consentimento do outro cônjuge ("divórcio litigioso") é a chamada "tentativa de conciliação", em que os cônjuges e o juiz se reúnem para tentar que o casamento se mantenha. Por não fazer sentido que esta fase seja obrigatória nos casos em que uma vítima de violência doméstica se pretende divorciar do seu agressor, a Iniciativa Liberal propôs que as vítimas possam pedir a dispensa da tentativa de conciliação, evitando um confronto com o seu agressor. A proposta mereceu os pareceres favoráveis da APAV, da Ordem dos Advogados e do Conselho Superior do Ministério Público.

A interrupção voluntária da gravidez até às 10 semanas deve ser permitida?

O enquadramento legal atual é adequado e para manter.

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As escolas devem permitir o acesso dos alunos a casas de banho tendo em consideração o seu direito à autodeterminação de género?

Todas as crianças devem ser respeitadas. As escolas devem ter liberdade e responsabilidade para que, em conjunto com a comunidade escolar, possam encontrar uma solução que garanta que todas as crianças se sintam incluídas e respeitadas. 

O próximo Governo deve promover a realização de um referendo à morte medicamente assistida (eutanásia)?

Não se referendam direitos fundamentais – matéria nuclear em direito constitucional e que está intrinsecamente ligada à manutenção do Estado de Direito. Devemos confiar na democracia representativa nestas matérias e nas opções dos deputados legitimamente eleitos pelos portugueses com condições para avaliar em detalhe a complexidade deste tipo de questões.

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O Ministério para a Igualdade foi um departamento do Governo efémero, entre 1999 e 2000. Atualmente existe uma Secretaria de Estado da Igualdade e Migrações. Faria sentido a existência de um Ministério?

A melhor forma de combater a desigualdade é tendo uma sociedade que permite e gera amplas oportunidades para qualquer pessoa, independentemente das suas circunstâncias específicas, se realizar. Ora isso faz-se primeiro com um Estado capaz e suficiente, que não pesa excessivamente na economia e sociedade civil. É por isso desejável que haja um número reduzido de ministérios, e que as preocupações com mais oportunidades para todos estejam presentes nas políticas de todo governo – especialmente no ministério da economia e da justiça.

Faz sentido haver um Dia Internacional da Mulher?

Os dias simbólicos podem ser úteis como forma de consciencialização da sociedade para certas questões. São uma de muitas formas de focar a atenção em desafios que diferentes partes da sociedade enfrentam e, no caso dos dias internacionais, permitem uma reflexão sobre esses desafios comparando a realidade de diferentes países.

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Considera-se feminista?

Enquanto liberal defendo a igualdade entre mulheres e homens perante a lei, com os mesmos direitos e deveres, numa sociedade aberta e tolerante com amplas oportunidades para cada um se realizar sem ver os seus objetivos comprometidos por características que não escolheram ter. 

Qual a mulher que mais admira? Porquê?

A minha mulher, Adélia. Sobretudo a forma como encara a vida, os desafios e as adversidades.

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