Núria Madruga: "Há sempre muitas opiniões sobre a maternidade, todos sabem tudo, falta mais empatia"

Núria Madruga, mãe dos gémeos Salvador e Sebastião, 11 anos, e também de Lourenço, 4, fala à Máxima sobre a sua experiência com a maternidade, da gravidez ao parto e à responsabilidade que sente como figura pública.

Foto: @nuriamadruga
06 de outubro de 2021 às 07:00 Rita Silva Avelar

Qual foi a sua reação quando soube que estava grávida de gémeos, quando engravidou do Sebastião e do Salvador? Quem foi a primeira pessoa a quem contou e quais foram as reações mais inesperadas, recorda-se? 

Fiquei muito surpreendida porque nunca pensei ser possível ficar grávida de gémeos. Tanto que no momento em que a minha médica me diz que são dois, achei logo que ela estava a brincar. Como tinha ido sozinha à consulta, a primeira pessoa a quem contei que eram gémeos foi ao Vasco, que ficou uns segundos calado a olhar para mim a achar que eu também estava a brincar.

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Fizemos um vídeo para anunciar a gravidez aos familiares e sem dúvida que a reação mais engraçada foi a da minha mãe que começou ao saltinhos a gritar: "vou ser avó de gémeos, vou ser avó de gémeos!"

Quais foram os momentos mais desafiantes das duas vezes que esteve grávida? Os "contras" pesaram mais que os "prós"? 

Os momentos mais desafiantes foram mesmo na gravidez dos gémeos, sabia que podiam nascer um bocadinho mais cedo, mas não estava preparada para ser tão cedo. Foi uma gravidez com alguns sobressaltos, às 16 semanas fiquei internada e fui para casa com recomendação de repouso absoluto durante um mês, devido a um descolamento. Às 28 semanas quando achei que estava tudo no bom caminho, foi quando tivemos o alerta que o bebé Sebastião estava com uma grande restrição de crescimento. Uma semana depois tiveram de nascer.

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Na gravidez do Lourenço foi mais o receio de voltar a ter um parto prematuro, mas com a continuação da gravidez fui ficando mais tranquila.

Quando os gémeos nasceram quais foram os seus primeiros pensamentos? ? Sobretudo porque estiveram 51 dias na neonatologia. 

O dia do nascimento foi de muitas emoções. Quando fomos à consulta para se perceber como estaria o Sebastião, estava convencida de que ainda iam aguentar mais tempo na barriga, por isso quando a médica disse: "É hoje!" passou-me tudo pela cabeça. Mas, naquele momento a força positiva que a minha médica nos passou foi tão importante, naquele momento acreditei que ia correr bem. Depois do parto tivemos o impacto da real situação, uma das médicas que acompanhou o parto disse-nos que as coisas estavam complicadas, principalmente com o Sebastião. Obviamente que a partir daí o medo instalou-se e aqueles 51 dias na neonatologia foram sempre vividos com muita apreensão.

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Lembra-se de quais foram(são) as recomendações mais "enervantes" dos amigos e da família?

Tal como nós, a maioria da família e amigos não tinha noção do que eram bebés prematuros. E na altura ficámos na nossa bolha e acabámos por filtrar alguma informação porque só queríamos pensamentos positivos. Muitas histórias chegaram até nós e isso também nos dava força, saber de muitos casos que tinham corrido bem.

A verdade é que estavam todos também muito assustados, quando se fala em dois bebés de 1.280g e 780g sabe-se que a situação não está fácil, por isso acho que houve um cuidado de todos nessas recomendações, até porque nada dependia de nós, apenas dos cuidados de todos os profissionais da neonatologia e da força de viver deles.

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Mas há uma frase que nos marcou muito e ainda hoje a pratico para muitas situações da minha vida, dentro da neonatologia diziam-nos muito: "Um dia de cada vez."

De que maneira experienciou e vivenciou os partos? 

Foram os dois de cesariana com sensações completamente diferentes. No primeiro era tudo novo para mim, tive todas as emoções possíveis e marcou-me muito o facto de não poder ter os meus filhos comigo. Estar num quarto sem bebés depois de um parto é muito duro.

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No parto do Lourenço estava tranquila, consegui viver tudo o que não vivi no parto dos gémeos. Só na altura percebi que tinham ficado muitas coisas por resolver, que guardamos só para nós mas que a vida se encarrega sempre de pôr tudo no lugar certo.

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Como é ser mãe de três meninos? 

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É maravilhoso. Eu adoro ser mãe de rapazes. Claro que não tenho como experiência ser mãe de meninas, se tivesse acho que diria o mesmo. :) Mas gosto muito da praticidade dos rapazes, da ligação que têm com as mães, de serem tão protetores, menos complicados. Adoro-os! E sempre disse quando estava grávida do Lourenço que gostava que fosse mais um rapaz.

Quais são os maiores desafios da maternidade, numa sociedade que exige tanto das mulheres?

É tentar seguir o nosso coração e fazer o melhor para a nossa família e não para tentar provar alguma coisa aos outros. A sociedade sempre foi muito exigente com as mulheres, principalmente quando somos mães. Mas sinto que temos conseguido provar que podemos ser mães, profissionais e ainda cuidar de nós. As mulheres são uma força da natureza, sinto é que muitas vezes nos sobrecarregamos demasiado e não conseguimos parar. Cuidar da nossa saude mental é fundamental.

É importante ter momentos só para si? De que forma é que consegue fazê-lo? 

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Não tenho tido, confesso. O último ano foi complicado para todos, principalmente para os pais. Teletrabalho, telescola, isolados da restante família e amigos... Sinto que agora estamos todos a tentar recuperar deste último ano. Não nos podemos esquecer que o tempo para cada um de nós é importante e imprescindível.

O que é que continua a ser tabu na maternidade, no ser–se mãe? 

Sinto que há ainda muitos assuntos que são tabu, mas o mais grave será a depressão pós-parto.

É sem dúvida um momento maravilhoso na vida da mãe, dos pais, mas são muitas emoções envolvidas e muitas vezes não é fácil gerir o cansaço, a privação de sono, a gestão familiar. E como a nós mães é exigido tanta coisa, sei que há muitas pessoas que não assumem que não estão bem porque sabem que muito provavelmente os outros vão desvalorizar.

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Felizmente não passei pela depressão, mas com o Lourenço passei por um momento muito doloroso na amamentação. Eu queria muito amamentar o Lourenço porque não tive essa experiência com os gémeos, mas acabou por ser um processo difícil nos primeiros dois meses. Duas mastites, muita dor, foi uma guerra comigo própria e na maioria das vezes disfarçava porque sempre que falava disto relativizavam o que eu estava a sentir ou simplesmente sugeriam que eu parasse de amamentar.

No geral há sempre muitas opiniões sobre a maternidade, todos sabem tudo, falta mais empatia em muitas situações.

É importante, por ser atriz e figura pública, normalizar a conversa sobre estes temas?

É importante, mas sinto que muitas vezes, pelo facto de sermos figuras públicas, esta informação é facilmente descontextualizada e criticada no mundo das redes sociais e internet. Tenho pena, porque sei que há muitas pessoas que precisam de saber que não estão sozinhas. Ninguém é perfeito, a maternidade é o maior desafio de todos, por isso em vez de criticarmos alguém, devíamos sempre ter uma palavra de conforto que pode fazer toda a diferença.

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Quão importante é envolver-se em iniciativas sociais? Como é o caso da Chicco, para dar a conhecer a importância, neste caso, da neonatologia?

Desde o primeiro momento que eu percebi que tinha de se falar mais sobre a prematuridade em Portugal. Como disse inicialmente, naqueles 51 dias ajudou-me muito saber de casos que tinham corrido bem. Dá-nos uma esperança gigante e já não nos sentimos sozinhos. Ainda hoje, já passaram 10 anos, recebo mensagens de muitas mães grávidas de gémeos e estão a passar por uma situação idêntica, ou têm os filhos na Neonatologia e dizem-me que estão cheias de esperança porque acompanharam o nosso caso. Por isso mesmo, sou muito feliz por poder fazer parte da iniciativa da Chicco, que acompanho há 10 anos. Sei a diferença enorme que têm feito nas Unidades Neonatais de vários hospitais e como é tão importante para os bebés e para os pais. A Neonatologia passa a ser a nossa casa e a incubadora a casa do nosso bebé, "Um dia de cada vez", naqueles que serão os dias mais marcantes na vida de um prematuro.

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